segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Rubem Fonseca e a inocência literária perdida

Rubem Fonseca
Rubem Fonseca 
e a inocência literária perdida
BIOGRAFIA

Julio Daio Borges 

Sexta-feira, 16/5/2003


"Vila-Matas, o espanhol, fala na síndrome de Bartleby, um sintoma mórbido de inspiração melvilliana que paralisa os escritores, fazendo-os renunciar à literatura. Eu não me incomodaria de sofrer dessa doença que acomete tantos dos meus colegas, fazendo-os desistir de escrever." 

(Rubem Fonseca, Diário de um fescenino [Companhia das Letras, 2003, pág. 148])



Ele nos ensinou a escrever. Rubem Fonseca, falando de banheiros deMcDonald's e denunciando "A arte de andar pelas ruas do Rio de Janeiro", emRomance negro e outras histórias (1992), mostrou que era possível. A crítica preferiu a violência descabida de Feliz Ano Novo (1975) e de O cobrador (1979), mas nós preferimos a contemporaneidade do doente que ouvia Tim Maia, e do sujeito que mastigava mulheres e contrafilés, em O buraco na parede (1995). Também da moça que tomava banho, e era observada do outro lado; do protagonista que distinguia a programação, a partir da chiadeira da tevê. Da festa que prosseguia mesmo com um convidado morto na sala, em A Confraria dos Espadas (1998). Do corcundinha que conquistava moças suculentas apenas com poemas, em Secreções, excreções e desatinos (2001). Do outro que se apaixonava por braços, em Pequenas criaturas (2002), feito Quincas Borba. E agora do Rufus, em Diário de um fescenino (2003)... mas, afinal - o que houve com ele

Rubem Fonseca perdeu a mão. E não é lugar-comum: perdeu a mão mesmo. Rufus, para quem não percebeu, é quase uma corruptela de "Rufo", as iniciais de "Rubem Fonseca" (que coincidentemente abrem o e-mail do escritor). Rufo, ou "Rufus", está novamente cercado por suas mulheres, como também estavam Gustavo Flávio, em Bufo & Spallanzani (1986), Paul Morel, em O caso Morel (1973), e Mandrake, em uma porção de outros contos. Rufus desta vez comete um diário, mas sem metade do charme de seus antecessores. Suas frases são as obviedades tolas de um iniciante; suas situações, de um primarismo estarrecedor. Praticamente não acontece nada de novo: suas peripécias (sexuais etc.) provocam o tédio e a complacência do leitor. O truque das citações igualmente não funciona. (Até elas estão fracas demais.) E a desculpa do livro ser um passatempo para um projeto maior, o Bildungsroman(romance de formação), também não colou. Ficamos presos à pusilanimidade de Rufus, ou "Rufo", em quase 250 páginas (!).

Mas, afinal, o que houve? Piorou ele ou melhoramos nós? [O que algumas doses de Dostoiévski e Kafka não fazem para derribar nossos heróis literários...] Rubem Fonseca esteve, desde sempre, em seu tempo e lugar. Adotou o estilo moderno: da frase curta; da narrativa cinematográfica; da linguagem impudica. Adotou também a temática urbana: violentamente descivilizada, rompendo com o tecido social em explosão enaltecedora do "eu". Como tantos outros em seu século, o XX. E deu lições aos escrevinhadores tupiniquins: com seu fraseado límpido; com um coloquialismo de bom gosto; com a sofisticação mínima que se espera da literatura. Rubem Fonseca, no Brasil, foi um dos maiores contistas dos 1900s, que teve Guimarães Rosa e Machado de Assis. É preciso muito culhão para falar mal de Rufo. Mas todo mundo fala, ninguém liga... Tem sido ele o alvo preferencial dos críticos já há alguns anos (acusam-no de ter se repetido). A diferença é que, depois de certa idade - e, principalmente, depois de certas leituras -, chegamos à conclusão de que "eles" podem ter razão. 

O que há de tão fascinante no autor de A grande arte (1979) e o que o aprisiona numa incurável adolescência literária desde que se lançou (com Os prisioneiros, em 1963)? Nós tínhamos vinte e poucos anos quando descobrimos o "Zé Rubem", ou o "Rubem", ou o "Rufo", ou seja-lá-quem-for. Ao contrário daqueles escritores cheios de teias-de-aranha do século XIX (das aulas de literatura), elefalava do nosso tempo, usando palavras que não precisavam de notas de rodapé, e numa sintaxe que não era muito diferente da nossa. Rubem Fonseca, aquele sujeito nascido em 1925, finalmente nos compreendia e nos retratava, à sua maneira desempoeirada e brincalhona. E não havia outro igual. Os demais perdiam-se em crônicas. Em formas vetustas, em assuntos vetustos. Para uma audiência indelevelmente vetusta. Não era mesmo para nós: toda aquela "literatura adulta". (Apenas "má literatura", como viríamos a confirmar depois.) E os clássicos? Bem, os clássicos estavam fora de alcance... O que havia era o Rubem. Só o Rubem. Mas ele não estava em lugar nenhum. Ele não estava nos jornais; ele não estava na televisão. Ele estava na estante. Silencioso. [Continua...] 

Acontece que a modernidade passou e chegou a hora de virar a página. A pós-modernidade também não serve mais (aliás, em literatura, nunca serviu para nada). E Rubem Fonseca, o nosso porta-voz, o nosso pai-de-todos, o nosso segundo sol, erode na dança irreversível dos séculos. Basta do infantilismo umbigocêntrico da primeira pessoa do singular. Basta das conquistas descartáveis do macho branco adulto (falido). Basta de subversão pré-fabricada para o típico cidadão médio americano. Basta da escatologia de fazer corar velhas e crianças. Basta das loucas aventuras de uma vida vazia (justificada pelo cinismo). Basta de desagregação, de desconstrução, de dessacralização. Basta de ciência, basta de arte, basta de filosofia (onde elas não existem). Basta de diários, basta de confissões, basta de auto-retratos. Basta de relativizar, de justificar, de ouvir. Basta do vale-tudo. Basta da falta de sentido. Basta de "tudo é permitido". Basta. 

Cacos de uma vidraça
Uma coisa agora se justifica. Uma, não: várias. Primeira delas: nunca deu para entender como Rubem Fonseca servia de inspiração para roqueiros e "marinheiros de primeira viagem" (escritores ex nihilo). Agora, dá para entender: porque sua literatura, de superfície, sempre esteve acessível a eles. Porque era simples, e seguro (seguríssimo), citar Rubem Fonseca. Principalmente Agosto(1990), minissérie de TV e best-seller do autor (não que isso justifique...). Segunda coisa: nunca deu para entender a colaboração de Rubem Fonseca em verdadeiras "bombas" literárias, como os grossos volumes de Jô Soares e o embuste ensaístico de Caetano Veloso (Verdade Tropical [1997]). Agora, dá [ainda que a explicação - suponha... - possa ofender o próprio Rufo]. Terceira e última coisa: como um Rubem Fonseca gerou uma linhagem de gosto duvidoso, que parte mais visivelmente de Patrícia Melo, atravessa a "geração 90" e desemboca em Fernanda Young (Os Normais)? (Já foi dada a resposta.) 

Making of do Diário
Reza a lenda que o editor, Luiz Schwarz, e sua galinha dos ovos de ouro, Rufo, teriam se encontrado em algum lugar remoto do Rio. O escritor, irreconhecível porque eternamente avesso às câmeras, teria passado incógnito e anotado o fato. Numa comunicação precaríssima, Schwarz apresentaria a Fonseca The Dying Animal (2001), a mais recente novela de Philip Roth. Sem captar a mensagem, o autor de Lúcia McCartney (1967) sugeriria a tradução da obra. O editor refugaria, e proporia então um arranjo mais interessante: por que não lançar uma coleção em que o sexo se introduziria ruidosamente na narrativa, desestruturando planos e desbaratando esquemas (à la Complexo de Portnoy[1969], do mesmo Roth)? Rufo toparia. Dois anos depois, a encomenda estaria pronta. 

[Nathan] Zuckerman
"Estou tomando Viagra, Nathan. Está aí o tal 'fogo que arde sem se ver'. Devo toda essa turbulência e felicidade ao Viagra. Sem Viagra nada disso estaria acontecendo. Sem Viagra eu teria uma visão do mundo apropriada à minha idade, e objetivos totalmente diferentes. Sem Viagra eu teria a dignidade de um senhor idoso, livre do desejo, bem-comportado. Eu não estaria fazendo uma coisa sem sentido. Não estaria fazendo uma coisa indigna, imprudente, impensada e potencialmente desastrosa pra todas as partes envolvidas. Sem Viagra eu poderia continuar, nos meus últimos anos de vida, a desenvolver a visão ampla e impessoal de um homem aposentado, honrado, cheio de experiência e saber, que há muitos anos abriu mão dos prazeres sensuais da vida. Eu poderia continuar a tirar conclusões filosóficas profundas e exercer uma influência moral positiva sobre os jovens, em vez de embarcar no perpétuo estado de emergência que é a paixão sexual. Graças ao Viagra, passei a compreender as transformações amorosas de Zeus. Era esse o nome que deviam ter dado ao Viagra: Zeus.

(Philip Roth, A marca humana, Companhia das Letras, 2002, págs. 48-49) 

"Tenho amigos comprometidos com determinada mulher que gostariam de ter uma aventura apaixonante com uma segunda, por comodismo sublimam esse impulso comprando uma gravata nova, um carro ou viajando com a patroa no fim de semana. Esses caras envelhecem mal e perdem a vida antes mesmo de morrerem frustrados, refugiados nos seus mecanismos de compensação. Os japoneses têm um provérbio: o sujeito começa a envelhecer quando não quer mais aprender. Meu provérbio é que o sujeito começa a envelhecer quando não quer mais amar, quando perde o entusiasmo pela comunhão sexual, não tem mais coragem de enfrentar a incandescência, os refinamentos eróticos e também as desilusões, aflições e logística exasperante da aventura amorosa. É preciso, como afirma o Don Juan do Molière, manter um olhar atento para os méritos de todas as mulheres, render homenagem a cada uma e pagar a cada uma o tributo a que nos obriga a natureza.

(Rubem Fonseca, Diário de um fescenino [Companhia das Letras, 2003, págs. 129-130]) 

Disclaimer
"Os personagens e as situações desta obra são reais apenas no universo da ficção; não se referem a pessoas e fatos concretos, e sobre eles não emitem opinião."

(Rubem Fonseca, Diário de um fescenino [Companhia das Letras, 2003, pág. 254])


DIGESTIVO CULTURAL




domingo, 30 de agosto de 2015

Rubem Fonseca / Violento, erótico e, sobretudo, solitário


RUBEM FONSECA: 
VIOLENTO, ERÓTICO E, SOBRETUDO, SOLITÁRIO
BIOGRAFIA

Fernanda Cardoso

Rubem Fonseca inaugurou uma nova corrente na literatura brasileira contemporânea que ficou conhecida, em 1975 através de Alfredo Bosi, como brutalista. Em seus contos e romances utiliza-se de uma maneira de narrar na qual destacam-se personagens que são ao mesmo tempo narradores. Várias das suas histórias (em especial, os romances) são apresentadas sob a estrutura de uma narrativa policial com fortes elementos de oralidade. O fato de ter atuado como advogado, aprendido medicina legal, bem como ter sido comissário de polícia, nos anos 50 no subúrbio do Rio de Janeiro teria contribuído para o escritor compor histórias do submundo dentro dessa linguagem direta. Muito provavelmente devido a isso, vários dos personagens principais em sua obra são (ou foram) delegados, inspetores, detetives particulares, advogados criminalistas, ou, ainda, escritores.

Além do tom nitidamente policialesco, em que há geralmente um crime ou um mistério a ser desvendado, sua obra pode ser vista como uma paródia do gênero policial tradicional, visto que os crimes atuam apenas como um disfarce de suas críticas a uma sociedade opressora do indivíduo. No gênero policial  tradicional o mistério funciona como uma casca que encerra um caroço; ali a “morte não é nada. O assassinato não é nada. O que transtorna é a selvageria do crime, porque ela parece inexplicável” (BOILEAU e NARCEJAC, 1991: 11). A Rubem Fonseca – mais do que simplesmente deslindar o ato criminoso – interessa registrar o cotidiano terrível das grandes cidades e, simultaneamente, por a nu os dramas humanos desencadeados pelas ações transgressoras da ordem.

Persistem, apesar disso, algumas semelhanças entre literaturas como a de Sir Arthur Conan Doyle (criador de Sherlock Holmes), que se insere nos parâmetros tradicionais do gênero, e a de Rubem Fonseca. Em ambos os autores, o enigma inicial fica por conta de um crime brutal (geralmente um homicídio) que gera toda uma atmosfera de mistério e tensão no romance e fará com que o leitor não desgrude os olhos de suas páginas antes do desenlace. Ainda podemos notar semelhança na maneira como se iniciam as investigações, isto é, o primeiro passo seja do investigador genial (Sherlock Holmes) ou do investigador comum (Mandrake, Guedes, Mattos, etc.), que será a visita ao local do crime em busca dos primeiros indícios que nortearão o processo investigativo. Além disso, encontramos outros exemplos quase irrelevantes do ponto de vista da comparação que estamos estabelecendo, mas que sugerem alguma semelhança, como a relação entre Mandrake e Wexler, em A grande arte (1983), e Sherlock e Watson como companheiros para solucionar crimes.

As diferenças, porém, são mais fascinantes. Enquanto no gênero policial tradicional temos, segundo Pierre Boileau e Tomas Narcejac (1991), um investigador portador da graça metafísica e guiado pelo pensamento positivista, em Rubem Fonseca há um investigador simples, que, ao mesmo tempo, não é como a “máquina de pensar” de Poe ou Doyle e nem como “intuição demolidora” de Hammet ou Chandler (Boileau e Narcejac, 1991), escritores da literatura conhecida como noir. Num mundo sujo e infame, onde a moral e a ética foram dissolvidas, onde o vilão e o mocinho desaparecem, estas personagens erguem um protesto quase solitário (senão romântico) contra esta realidade que, apesar de tudo – ao contrário do romance policial tradicional – continuará suja e infame, seja o criminoso eliminado ou não. Os tempos são outros e os leitores que se aventuram por alguns dos romances policiais contemporâneos em busca de detetives com cara de herói, correm sério risco de abandonar o livro antes do final.

Rubem Fonseca é pródigo em deixar as coisas para o leitor completar. Ao escrever, o autor deve supor um interlocutor inteligente, culto, atento. Com uma inesgotável amplitude de experiências e observações, tornou-se capaz de escrever com a mesma verossimilhança sobre halterofilistas e executivos, marginais e financistas, delegados de polícia e assassinos profissionais, garotas de programa e pobres diabos que vagam sem destino pelas ruas do Rio de Janeiro. Tem, pois, como matéria-prima os dois extremos da nação: os que vivem à margem do sistema e os que constituem o núcleo privilegiado do mesmo.

O que mais choca nos romances e contos de Rubem Fonseca é o amoralismo dos bandidos. Em nenhum momento eles são atormentados por qualquer remorso ou culpa. São perversos e frios, venham dos estratos superiores ou das camadas populares. As cidades parecem vazias de inquietação ética, a não ser por alguns indivíduos que, em meio ao horror, agem movidos por um sentimento qualquer de justiça. A relação entre “mocinho” e “bandido” está presente em suas obras, contudo não nos é possível identificar exatamente quem é um e quem é o outro, pois há uma grande transitividade entre ambos fazendo com que, por exemplo, Wexler suponha que o criminoso em A grande arte seja, até mesmo o próprio Mandrake: “Pode ter sido qualquer pessoa. Pode ter sido você, Mandrake.” (Fonseca, 1983: 296).

Não obstante as mais variadas combinações de “mocinho” & “bandido” nas personagens de Rubem Fonseca, vemos n’O caso Morel (1973) o ex-delegado e escritor Vilela & Morel; o criminalista Mandrake & Lima Prado/ Ajax ou Carmilo Fuentes, em A grande arte (1983); o detetive Guedes & Eugênio Delamare, em Bufo & Spallanzani (1985); o comissário Mattos & “O Anjo Negro” ou Fortunato, em Agosto (1990); e, para completarmos as obras aqui analisadas,  Mandrake & Gustavo Flávio, em E do meio do mundo prostituto só amores guardei ao meu charuto (1997). Estes investigadores, inabaláveis na sua força motriz, trazem com certeza o espírito da literatura noir, desenvolvida e aperfeiçoada pelos escritores Hammet e Chandler, apesar de nem sempre se utilizarem dos mesmos meios para a solução dos crimes.

Um dos temas dominantes na obra de Rubem Fonseca é a violência que percorre as ruas brasileiras, numa espécie de guerra civil não declarada. Certas passagens de contos ou narrativas longas, como é o caso do romance A grande arte (1983) apresentam uma brutalidade tão meticulosamente narrada que se tornam leitura quase insuportável para os espíritos delicados. Esse romance tem um enredo complexo: o enigma inicial se dá através de um assassino frio que desenha, com uma faca, uma letra “P” no rosto de cada vítima.  Mas esse não é o único crime que o leitor deverá descobrir em parceria com Mandrake e Wexler. Muitos outros assassinatos, sem nenhum “P” desenhado no rosto das vítimas, começam a acontecer. No entanto, nessa obra, a chave central dos enigmas é o esclarecimento do que está por detrás do conglomerado Aquiles, misto de banco, financeira, entreposto de contrabando, agência de corrupção, etc.

Algo intrigante em suas obras é condição existencial de suas personagens, sempre dominadas por uma atmosfera de violência latente. Mas, de onde virá a inspiração para a composição das misérias humanas das personagens de romances e contos de Rubem Fonseca, já que a condição humana e a violência neles formam um retrato que, a princípio, só foi proposto para a sociedade brasileira pelo próprio autor? Sua obra contém o retrato de uma violência diferenciada das obras literárias escritas, até então, no Brasil. O autor revela os primórdios de uma violência que se pulveriza em nossa sociedade nos dias de hoje, devido ao aumento das contradições sociais, sobretudo nos grandes centros urbanos do Brasil, a partir da década de 70.

Isso não nos pode induzir a ver o autor como um mero retratista da violência urbana que assola o país. Sua obra apresenta maiores sutilezas, temas mais complexos e ricos, como a solidão dos indivíduos nas grandes metrópoles. A maioria de seus protagonistas vive opressa, aturdida pela sensação de isolamento e de vácuo na alma – reside nesse ponto uma outra forma de violência, a violência do indivíduo contra si, contra os outros por sua condição e de outros contra esse indivíduo solitário. A abundância de possibilidades eróticas oferecidas pelas cidades dá a suas personagens a obsessão sexual como única alternativa ao vazio da existência, como se na satisfação física do desejo residisse a última certeza de que ainda se está vivo. Essa sensação de isolamento está muito presente em todas as suas obras como, por exemplo, os romances Agosto (1990) e E do meio do mundo prostituto só amores guardei ao meu charuto (1997).

Agosto (1990), obra que, apesar de fictícia, tem sua origem na história do Brasil, apresenta vários crimes que acontecem ao mesmo tempo e cujo clímax fica por conta do suicídio de Getúlio Vargas, que interfere muito na vida do comissário Mattos. Mattos é uma dessas personagens que tem no individualismo a marca de sua condição existencial. Podemos sugerir aqui a presença do próprio autor – executivo da empresa Light durante a década de 60, homem de ação e ativista político –, que participou ativamente do movimento que culminou no golpe de 64, mostrando, tal qual a personagem Mattos, sua crença em certos valores capitalistas como o individualismo que se realiza através da liberdade.

E do meio do mundo prostituto só amores guardei ao meu charuto (1997) é, entre os estudados, seu romance mais atual. Nessa obra, Rubem Fonseca apresenta o escritor Gustavo Flávio que já fora sua personagem emBufo & Spallanzani (1985), e também o criminalista Mandrake d’A grande arte (1983). Gustavo Flávio é, dessa vez, relacionado com outro crime e, talvez por seu “curriculum” (em Bufo & Spallanzani esteve relacionado com a morte de Delfina Delamare), seja o principal suspeito até mesmo para sua nova companheira. Mandrake é quem irá trabalhar no caso e tentar desvendar o crime. Assim como Mattos (Agosto, 1990), a condição existencial que marca a vida de Gustavo Flávio é o individualismo. Ele se sente isolado, porém quer sentir-se isolado, e por não gostar que ninguém mexa em suas coisas, faz com que acreditem estar escondendo algo.

Uma outra forma de violência que está presente nas obras de Rubem Fonseca, é a violência do autor contra o leitor. Através da análise das relações entre violência e linguagem, podemos sentir a hostilidade no contato com o leitor. Esta hostilidade se traduz pela violência discursiva, tanto através de expedientes formais (estilo seco e entrecortado, frases curtas), como através dos recursos de conteúdo, nas situações-limite em que envolve as personagens. Supondo que a linguagem em geral tem escondido o que justamente importa revelar, Rubem Fonseca propõe o inverso: da “matéria bruta” concernente à realidade para a sua representação na narrativa, uma série de desmistificações se faz necessárias, e na base delas está, sobretudo, a desmistificação da linguagem. A linguagem violenta tem uma função definida frente ao seu leitor: a de presentificar a violência de modo a que ele não tenha mais condições de questioná-la. Entretanto, somos acostumados a abrandar, através de mecanismos vários (como o silêncio, por exemplo), o efeito do que tem que ser dito pelo modo de o dizer, ficamos surpresos diante de uma linguagem tão avessa a atenuações.
Além das várias formas de violência e da solidão dos indivíduos nas grandes metrópoles, há um outro tema a ser abordado por quem se pretende a estudar as obras de Rubem Fonseca: o erotismo. Aqui vemos também a ironia e a pornografia utilizadas pelo autor para compor suas obras e suas críticas a uma sociedade que oprime, isola e maltrata seus indivíduos, especialmente – pela biografia desse autor – na cidade do Rio de Janeiro.

Os temas apontados como próprios de Rubem Fonseca apontam para o embate dos valores humanos que coexistem na grande cidade, onde a uma mitologia urbana imposta socialmente surge em contrapartida a convergência de cenas avassaladoras de sexo e violência. A perspectiva extremista indicia a desmistificação, o desmascaramento dos mitos sob os quais o homem urbano tenta sobreviver, e revela sobretudo que a tensão entre o real e o ideal se dá, no limite, através do pequeno liame que separa a vida da morte. (Maretti, 1986: 22)

Se pudermos considerar, com Georges Bataille, que o erotismo “é a aprovação da vida até na própria morte” (Bataille, 1980: 13), então esse encanto pela morte, revelado sobretudo na passagem da atitude normal à do desejo, é a manifestação culminante da nostalgia da continuidade do ser, ao colocar repentinamente em questão a vida descontínua (do trabalho e da razão). Então a “aprovação da vida na própria morte” configura-se como um desafio, por indiferença, à própria morte. Por acreditar que o erotismo está na base da condição humana é que Rubem Fonseca o tematiza em sua literatura e o abraça em todas as suas manifestações.

Podemos notar manifestações claras do poder do erotismo em Rubem Fonseca n’O caso Morel (1973), em que Paul Morel (artista de vanguarda, famoso e excêntrico), acusado pelo assassinato de Joana, conta a história de sua vida a Vilela (ex-delegado e, atualmente, escritor) por meio de personagens fictícias. Enquanto Morel busca em Vilela conselhos para o livro que pretende escrever, Vilela mira-se em Morel enxergando em seu caso os contornos de seu próprio destino. Por meio dessa história recheada de erotismo, hedonismo, pornografia, arte e morte, o delegado Matos espera descobrir o verdadeiro culpado de um crime bárbaro do qual Morel é o principal suspeito.

Outro romance que traz a erotização de suas personagens como afirmação da vida é Bufo & Spallanzani (1985). Rubem Fonseca mostra sua intenção desde a escolha do título da obra: Spallanzani foi um cientista italiano que estudou o instinto de preservação da espécie entre os sapos, mais especificamente no Bufo; seus estudos comprovaram que, mesmo com as duas patas de trás carbonizadas, o macho não abandonava a fêmea com a qual estava copulando. Além do título, o início do primeiro capítulo de seu romance (“Foutre ton encrier”), apresenta uma carta de Gustavo Flávio a uma de suas namoradas, Minolta: “Você fez de mim um sátiro (e um glutão), por isso gostaria de permanecer agarrado às suas costas, como Bufo, e, como ele, poderia ter minha perna carbonizada sem perder essa obsessão” (Fonseca, 1985: 07). Essa obsessão sexual que a própria personagem deixa clara desde o princípio permeará toda a obra.

Apesar de ter participado ativamente do golpe de 64, Rubem Fonseca foi censurado posteriormente, em 1975, com o livro de contos Feliz Ano Novo por motivos que ainda permanecem obscuros. Mas ele não desistiu de suas críticas e suas obras alcançaram e continuam alcançando cada vez mais leitores. Dessa forma, numa atitude – apontada por François Warin – semelhante à de Nietzsche, Artaud e Bataille, Rubem Fonseca também objetiva a desmistificação, no sentido de “reabrir a arte à vida, enraizá-la no corpo, desublimar a cultura, denunciando os julgamentos demasiado virtuosos que a justificam” (Warin, 1974: 03). E sem qualquer abrandamento.

BIBLIOGRAFIA

BARROS, D. L. P., de e FIORIN, J. L. (orgs). Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo: Ática, 1994.
BATAILLE, Georges. O erotismo (O proibido e a transgressão). Lisboa: Moraes, 1980 (trad. de João Bernard da Costa).
BOILEAU, Pierre e NARCEJAC, Thomas. O romance policial.  São Paulo: Ática, 1991.
FONSECA, Rubem. Agosto.  São Paulo: Companhia das Letras, 1990.
_____________. A grande arte. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1984.
_____________. Bufo & Spallanzani. São Paulo: Companhia das Letras, 1991.
_____________. E do meio do mundo prostituto só amores guardei ao meu charuto. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.
_____________. O caso Morel. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
HUTCHEON, L. Uma teoria da paródia. Lisboa/Rio: Edições 70, 1985.
MARETTI, Maria Lídia Lichtscheidl. A lógica do mundo marginal na obra de Rubem Fonseca – Dissertação de Mestrado (sob a orientação do Prof. Dr. Jesus Antonio Durigan). Campinas: Unicamp, 1986.
TODOROV, Tzvetan. “A verossimilhança que não se pode evitar”. IN: Literatura e Semiologia – novas perspectivas em comunicação: seleção de ensaios da Revista Communications. Petrópolis: Ed. Vozes, 1972, pp. 89-94.
______________. “Tipologia do romance policial”. IN: ____________. As estruturas narrativas. São Paulo: Perspectiva, 1969 (Debates, 14), p. 93-104.
WARRIN, François. “Georges Bataille e a maldição da literatura”. O Estado de S. Paulo. São Paulo, Supl. Literário nº 892, ano XVIII, 01/setembro/1974, p. 03.





Com quase 90, Rubem Fonseca escreve diariamente




Rubem Fonseca

Com quase 90, Rubem Fonseca escreve diariamente e puxa ferro na academia



Poucas coisas se parecem menos com uma reclusão do que a propalada reclusão de Rubem Fonseca.
Nos arredores da praça Antero de Quental, perto da praia do Leblon, onde fica o prédio dele, muitos já trocaram palavras com o "fofo", "doce", "gentil", "tranquilo", "tranquilíssimo" Rubem, escritor que renovou o conto brasileiro na segunda metade do século 20.

De quem construiu obra tão forte, não se esperaria livro tão frágil
Tímido ao ser abordado em público, Dalton Trevisan afirma não ser quem é

A fama decorre da decisão de não conversar com jornalistas sobre sua obra, algo que não faz há meio século –ao menos não estando informado de que eles eram jornalistas.
Conhecido por aceitar convites para eventos no exterior na mesma proporção em que os recusa no Brasil, porém, o autor de "Feliz Ano Novo" (1975) e "A Grande Arte" (1983) perdeu um bocado da aura de mistério nos últimos anos, quando vídeos desses festivais começaram a pipocar no YouTube.
Toni D´Agostinho
Rubem Fonseca
Rubem Fonseca
Prestes a fazer 90 anos, na segunda (11), ainda morando sozinho, o mineiro radicado no Rio desde a infância reduziu o ritmo de suas caminhadas pelo Leblon, mas escreve todos os dias e puxa ferro três vezes por semana numa pequena academia, à qual chega antes das 7h da manhã.
A redução dos passeios no calçadão –de pedras portuguesas propícias a acidentes– decorreu de uma artrose num dos joelhos, diagnosticada há quatro anos.
O problema o levou a incluir uma bengala ao visual, há décadas composto por um boné cobrindo a careca (Rubem raspa os fios das laterais, o que lhe dá um aspecto mais jovem), óculos de sol, camiseta, calça comprida e tênis.
O apoio serve mais de precaução. Na última segunda (4), quando Rubem saía da academia carregando um "Lance!" com a chamada para a vitória, no dia anterior, do seu "Vascão" –costuma mandar e-mails a amigos com "saudações vascaínas"–, a bengala quase não tocava o chão. Não parecia fazer falta ao autor, de ombros fortes e passos lentos.
Em 2013, ele travou uma espécie de amizade com o Metrô do Rio, que vem fazendo obras para uma estação na Antero de Quental. Naquele ano, o Consórcio Linha 4 divulgou dois vídeos, um deles de quando Rubem apadrinhou um ipê da praça e o outro quando deu nome a uma sala de leitura para operários da obra.
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Neste último, enérgico e agitando os braços, como um showman, diz que "ler nos torna melhores, permite que a gente entenda melhor o outro e a nós mesmos".
Em 2012, já haviam circulado vídeos como o do Correntes d'Escrita, evento em Portugal: "Basta ser louco [para ser escritor]? Hm. Tem que ser alfabetizado". E um gravado em Lima, onde foi homenageado: "Vamos, minha gente, estão com medo de mim? Yo soy um homem peligroso", diz, no mais perfeito portunhol, instigando o público a fazer perguntas, daquelas que ele sempre argumentou que sua obra responde.
Mas isso fora do Brasil (ou dentro do canteiro de obras da Antero de Quental), onde o assédio é menor. Por aqui, já recusou três vezes a Flip, inclusive neste ano, e pensou por uma semana antes de declinar o convite para ser um dos escritores representantes do Brasil na Feira de Frankfurt 2013.

A explicação dele, segundo a filha Bia Corrêa do Lago, 59, editora, é que um escritor não pode ser muito conhecido. "Se aparecer demais, perco minha matéria prima, poder observar", costuma dizer ele, de acordo com Bia, irmã do fotógrafo Zeca Fonseca, 57 e do cineasta José Henrique Fonseca, 50.
É no exterior que sua obra vem sendo mais reconhecida na última década. O autor, por exemplo, é adorado no México, num raro culto a um brasileiro em países hispânicos, por escritores como Antonio Ortuño e Rafael Pérez Gay –este, editor de sua obra pela Cal y Arena, escreveu que Rubem Fonseca é "um contista de raça, na escala de Maupassant e Chekov, Updike ou Capote".
No Brasil, há mais de uma década resenhistas dizem que Rubem Fonseca se repete, se perdeu. Não foi diferente com o recente "Histórias Curtas", resenhado para a Folha por Luis Augusto Fischer, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, que avaliou os contos como "todos fracos, vários muito ruins, um ou outro de dar dó".

Escritores que acompanham a obra de Rubem, no entanto, discordam. O contista Sérgio Sant'Anna, um dos vários impulsionados à carreira literária por Rubem, diz acreditar que a aparente displicência dos contos de "Histórias Curtas" é intencional. "Há no livro uma certa nonchalance que me agrada muito, como se o autor não estivesse nem aí", diz.
O escritor português Francisco José Viegas vê "alguma injustiça" na cobrança por um Rubem "sempre genial". "Dizem que os livros novos não são tão bons. Ok, que não sejam, mas é o Rubem, o homem que escreveu 'Feliz Ano Novo' e 'A Grande Arte'. Não é possível manter sempre aquele nível tão elevado. Para um escritor ser absolutamente genial é preciso estar sempre no fio da navalha, e alguns livros vão chegar lá, outros não."
"Qualquer escritor que lide com a literatura policial ou urbana de alguma maneira a partir dos anos 1970 deve algo a ele", diz Marçal Aquino, que de admirador se transformou em amigo. "'Feliz Ano Novo' é desgraçadamente atual, coloca o dedo num nervo exposto. É profético."
Profético é um termo recorrente para definir aqueles primeiros livros de Rubem –para Deonísio da Silva, considerado pelo próprio escritor seu mais profundo conhecedor, a palavra mais no sentido de "proferir", "dizer o que ninguém diz".
Deonísio é um dos amigos mais próximos e duradouros do escritor. Em 1974, estudante de letras em Ijuí (RS), ele escreveu um texto sobre "O Caso Morel" (1973), então enviado por seu professor ao editor de Rubem. Dias depois, o rapaz recebeu uma carta do escritor, elogiando o texto e convidando-o a aparecer no Rio para uma conversa. Deonísio levou a sério. Encarou quase um dia de estrada, no ônibus, para deparar no Rio com um engravatado –Rubem era executivo da Light, empresa onde trabalhou de 1958 a 1979.
Reconhecido por ter estimulado, inclusive com leituras prévias, a carreira de autores tão variados como Sérgio Sant'Anna, Marçal Aquino, Patrícia Melo e Jô Soares, Rubem não mostra seus textos a ninguém antes de enviar à editora. Mas, segundo Maria Jeronimo, que o edita na Nova Fronteira, é um escritor fácil de lidar.
"É impressionante trabalhar com ele. É muito organizado, um escritor do trabalho mesmo, intenso", ela diz sobre Rubem, que vem se dedicando cada vez mais aos poemas –alguns deles figuraram no recente "Amálgama". Entre os próximos lançamentos, há uma graphic novel de "O Seminarista", com roteiro do próprio Rubem e ilustrações de Rodrigo Rosa, prevista para o inicio do ano que vem.
"LAW & ORDER"
Rubem Fonseca se coloca cada vez mais em seus livros. Para além das referências mais óbvias de "José" (2011), que leva seu primeiro nome e descreve os anos de juventude de um narrador suspeitamente parecido com o autor, há outras que só pessoas mais próximas pescam –como o ódio a papais noéis que ele compartilha com o narrador de "O Seminarista".
Zé Rubem, como preferem os amigos, não dá entrevista, mas colabora. Repassa à editora e à filha respostas a dúvidas da reportagem –embora elas só se ofereçam para checar com ele temas amenos, como de que séries gosta ("Law & Order" é a preferida; de "Game of Thrones", apesar das tentativas do neto Paulo Pilha, ele não quis nem saber).
Chega a sugerir fontes para a reportagem, como o amigo Deonísio da Silva, autor de "O Caso Rubem Fonseca", e Arnaldo Jabor, que filmará o conto "O Livro dos Panegíricos".
Em relação a temas delicados, os amigos desconversam, como se soasse o alerta Rubem Fonseca de indiscrição. Nesta leva está sua saída da Companhia das Letras, em 2009. Em 2010, a Folha revelou que o rompimento decorreu da recusa da editora em publicar "Gonzos e Parafusos", romance de Paula Parisot, amiga e pupila indicada por Rubem.
Foi apenas a gota d'água. Naquela ocasião, a situação já não era das melhores. Rubem vinha se sentindo desprestigiado pela editora que pela qual ao longo de 20 anos vendera 830 mil exemplares e que fizera de seus primeiros lançamentos grandes eventos. Chegara a pedir um adiantamento alto, recusado. Estava magoado.
Um mês após o rompimento, disputado por sete editoras, fechou com a Agir por mais de R$ 1 milhão (depois sua obra passou para a Nova Fronteira, do mesmo grupo Ediouro).
O tema mais delicado de todos –as especulações em torno de sua atuação, nos anos 1960, no Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais, órgão ligado à ditadura– foi um dos raros que levaram Rubem a decidir se manifestar. Em artigo na Folha em 1994, disse nunca ter sido "favorável à ruptura da ordem constitucional em nosso país".
Viúvo desde 1997, quando sua mulher, Thea Maud, morreu com uma doença degenerativa, Rubem tem "muitas amigas", como informa todo mundo que o conhece. "Não bebo, não fumo, mas fodo", disse a amigos poucos anos atrás, já avançado na casa dos 80.
O grande amigo, João Ubaldo Ribeiro, morreu no ano passado. Outros, como Zuenir Ventura e Marçal Aquino, dizem vê-lo com menos frequência do que gostariam. Com a enorme família –os três filhos lhe deram oito netos–, costuma almoçar nos finais de semana. No próximo, em comemoração dos 90 anos do patriarca, a família toda viajará a Secretário, na região Serrana do Rio, onde José Henrique tem um sítio.
Os Prisioneiros
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Rubem Fonseca diz não ler nada do que se escreve a seu respeito –e amigos afirmam que ele não se abala com críticas, embora deixem escapar que já ficou cabreiro com uma ou outra reportagem–, mas mantém pastas com recortes de tudo o que foi dito sobre ele e seus livros desde a estreia na literatura, com "Os Prisioneiros" (1963).
Esse material foi emprestado ao amigo Sérgio Augusto, que organizou as reedições da obra do escritor pela Agir/Nova Fronteira. Segundo Bia, quem organiza são assistentes –e Rubem nem conhece o conteúdo.
Procurado por e-mail, telefone e bilhete na portaria de seu prédio, o escritor não deu retorno. Dentre as perguntas que sua obra nem amigos ajudam a responder, estava a de se pretende publicar um livro só de poemas e como foi a conversa que teve com Dalton Trevisan quando, reza a lenda, se encontraram em Curitiba, no início dos anos 1970 –esta Dalton também poderia responder, mas parece até mais improvável.
ISTO É RUBEM
1925
José Rubem Fonseca nasce em 11 de maio em Juiz de Fora (MG), filho de portugueses; a família se muda para o Rio quando ele completa 8 anos
1937
Começa a trabalhar aos 12, como entregador numa oficina de artigos de couro
1949
Forma-se na Faculdade Nacional de Direito, no Rio
1952
Entra para a polícia do Rio como comissário, passando a cumprir funções administrativas em 1954. Estuda administração e comunicação nos EUA
1958
Começa a trabalhar na Light, atuando como executivo até a estatização da empresa em 1979, quando é demitido
1962
É recrutado para integrar o Ipes (Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais), organismo apontado como responsável pela base ideológica do golpe de 64. Segundo o historiador uruguaio René Armand Dreifuss, seu trabalho era supervisionar a unificação dos materiais de divulgação do instituto
1963
Estreia na literatura com os contos de "Os Prisioneiros". Dá uma rara entrevista ao "Diário de Notícias", na qual diz que "o conto está mais próximo da concisão dramática do teatro que da fluência narrativa do romance" e lista referências como Kafka e Guimarães Rosa
1965
Lança "A Coleira do Cão", seu segundo livro de contos
1967
Lança "Lucia McCartney", que dois anos depois venceria o primeiro lugar do 2º Concurso Nacional de Contos do Paraná
1973
Lança seu primeiro romance, "O Caso Morel". É, segundo o especialista Deonísio da Silva –amigo de décadas de Rubem e considerado pelo autor o maior conhecedor de sua obra, "a referência solar" da obra do escritor
1976
Publicado um ano antes, "Feliz Ano Novo" é proibido por "exteriorizar matéria contrária à moral e aos bons costumes". O autor entra com ação contra a União, vencendo apenas em 1989, com a liberação do livro
1983
Lança "A Grande Arte", depois adaptado ao cinema
1990
Lança "Agosto", que originou série de TV
1994
Escreve na Folha sobre especulações envolvendo sua relação com a ditadura. "Não era, como homem de empresa, nem sou agora, como escritor, favorável à ruptura da ordem constitucional em nosso país através de revoluções ou golpes de Estado, militares ou civis"
1997
Morre de doença degenerativa, aos 68, Théa Mauad Komel, mulher de Rubem, com quem ele teve os filhos Maria Beatriz, José Henrique e José Antônio
2003
Vence os prêmios Juan Rulfo e Camões. Ajuda a escrever o roteiro de "O Homem do Ano", baseado no romance "O Matador", de Patrícia Melo
2009
Deixa a Companhia das Letras e tem sua obra disputada por várias editoras; fecha com a Agir, do grupo Ediouro
2012
A imagem de recluso é atenuada com a aparição, no YouTube, de eventos nos quais participou no exterior, além de uma fala sobre leitura a funcionários do Metrô do Rio, em 2013

FOLHA DE S. PAULO


sábado, 29 de agosto de 2015

Rubem Fonseca / Sobre a arte de escrever as ruas do Rio de Janeiro

Rubem Fonseca
Por Abraham Solís


RUBEM FONSECA

Sobre a arte de escrever 

as ruas do Rio de Janeiro

Por LUÍS NAVES
02 julho 2011
Considerado um dos mais importantes escritores da língua portuguesa, José Rubem Fonseca, de 86 anos, é filho de transmontanos e autor de uma obra inovadora e brutal.

Um dos enigmas da literatura é o facto de o brasileiro José Rubem Fonseca ainda não ter ganho o Prémio Nobel. Filho de transmontanos que emigraram para o Brasil, o escritor nasceu em Juiz de Fora, Minas Gerais, em 1925 (tem 86 anos). Não dá entrevistas e evita ser fotografado. Os seus amigos tratam-no por Zé Rubem e dizem que é óptimo conversador e pessoa modesta e divertida.
Fonseca escreveu alguns dos textos mais importantes da literatura em língua portuguesa dos últimos 40 anos, em contos, novela curta, romance. Muito original em relação ao que se faz em língua portuguesa, mas também num planeta totalmente diferente em relação aos seus confrades latino-americanos, o autor brasileiro é um daqueles raros escritores que ninguém consegue classificar com facilidade.
Em 1975, um livro seu foi proibido, por conter um conto quase insuportável, Feliz Ano Novo, em que Rubem Fonseca levava aos limites a sua experiência com a linguagem, descrevendo uma realidade distorcida pela banalização da violência. A censura considerou que o livro continha "matéria contrária à moral e bons costumes". Na realidade, era um retrato da sociedade brasileira sem contemplações; brutal e desumano, negro e alucinado. Tudo escrito com a frieza de um relatório policial.
Este último aspecto não surge por acaso. Rubem Fonseca terminou a licenciatura em Direito e ingressou na polícia, onde trabalhou entre 1952 e 1958. Chegou a estar na rua, mas acabou a carreira num gabinete, com passagem de formação nos EUA. Esta experiência é a matéria-prima central da sua obra.
Antes de se dedicar à literatura (começou a escrever quase com 40 anos) o luso-brasileiro trabalhou na empresa de electricidade do Rio de Janeiro, mas os seus primeiros livros de contos despertaram a atenção da crítica. Este era um autor diferente, com uma nova abordagem técnica e expressiva.


sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Game of Thrones / George R. R. Martin não assinará sexta temporada

Emilia Clarke & George R.R. Martin


Game of Thrones

George R. R. Martin 

não assinará sexta temporada

Autor das Crônicas de Gelo e Fogo, George R. R. Martin confirmou que não escreverá pra sexta temporada de Game of Thrones. 

Por Eduardo Pereira
31 de março de 2015


George-RR-Martin-1930704

Decisão foi tomada pra que George possa se concentrar em terminar o novo livro da série, “Os Ventos do Inverno”.

O renomado escritor britânico e criador da série Crônicas de Gelo e Fogo, George R. R. Martin confirmou que não trabalhará no roteiro da série da HBO, derivada de seus livros, “Game of Thrones“, em sua sexta temporada. Em seu próprio blog, o autor explicou que tomou a decisão para poder focar em terminar o próximo livro da série, intitulado “Os Ventos do Inverno”, aguardado desde 2011.
“Depois de sofre com isso por um mês, ou mais, decidi não escrever o roteiro de um episódio para a sexta temporada de ‘Game of Thrones'”, disse ele. “Escrever um roteiro me exige três semanas, no mínimo, e ainda mais quando não é uma adaptação direta dos romances. E, honestamente, me custaria mais do que isso, já que nunca fui bom em mudar as engrenagens de uma mídia para outra e de volta novamente.”
Resumindo, George ainda frisou: “escrever um roteiro pra sexta temporada me custaria um mês de trabalho em ‘Ventos’, e, talvez, até seis semanas, e eu não posso arcar com isso.”
Mas os fãs podem ficar tranquilos, até o próprio bom-velhinho confia no taco dos roteiristas do programa: “Com David BenioffDB Weiss e Bryan Cogman no serviço, os trabalhos de roteirização pra sexta temporada estarão em boas mãos. Minhas energias estarão melhor devotadas a “Ventos”.
Essa será a segunda vez que George R. R. Martin não escreve para uma temporada da série. A primeira aconteceu, justamente, na quinta temporada — e por motivos similares. A sexta temporada estreia no dia 12 de Abril, na HBO.



quarta-feira, 26 de agosto de 2015

terça-feira, 25 de agosto de 2015