terça-feira, 1 de julho de 2025
sábado, 28 de junho de 2025
Adeus, Garoto
Sinopse
Adeus, Garoto acompanha o final do verão de um jovem de 17 anos chamado Attilio. O garoto mora em um bairro operário de Nápoles e herda os problemas e o legado criminoso de seu pai. Navegando as condutas ilegais do submundo do crime da cidade, Attilio precisa lidar com uma dívida substancial deixada pelo pai que agora está preso. É assim que o jovem recebe a missão de proteger uma prostituta ucraniana chamada Anastasia, que está tentando trazer sua família para a Itália em segurança. Enquanto a amizade dos dois floresce, tornando-se uma paixão, ambos precisam tomar decisões drásticas para escapar das circunstâncias perigosas que o cercam. Quando o pai de Attilio é libertado da prisão, porém, e precisa rapidamente saldar a enorme dívida acumulada, uma escolha difícil se apresenta para o adolescente: se deixar levar pelo amor pela garota ou acatar à lealdade ao pai.
ADOROCINEMA
domingo, 22 de junho de 2025
Dina Sanichar / Mowgli, o menino-lobo
Dina Sanichar / Mowgli, o menino-lobo
Em 1872, nas selvas da Índia, caçadores encontraram uma cena intrigante: dentro de uma caverna, uma figura humana se movia entre lobos, correndo de quatro, com agilidade selvagem. Não era um animal — era uma criança.
Tinha cerca de seis anos. O corpo coberto de sujeira, unhas como garras e olhos desconfiados, como os de um lobo à espreita. Criado na selva desde muito pequeno, estava distante da linguagem, do afeto humano e das regras da sociedade.
Recebeu o nome de Dina Sanichar e foi levado a um orfanato em Sikandra, perto de Agra. Missionários tentaram reinseri-lo na sociedade. Com o tempo, Dina aprendeu a andar ereto e vestir roupas, mas nunca falou. Recusava talheres e preferia carne crua. Seu silêncio não era apenas mudez — era o reflexo de uma infância sem palavras.
Morreu em 1895, de tuberculose. Alguns acreditam que sua história tenha inspirado Rudyard Kipling a criar Mowgli, o menino-lobo.
Mas a história de Dina Sanichar não foi conto — foi realidade. Sem panteras falantes ou ursos sábios, havia apenas uma criança perdida entre lobos, que jamais conseguiu voltar.
Vítor Soares / Facebook
sábado, 21 de junho de 2025
sexta-feira, 20 de junho de 2025
Gordon Lish / O grande sedutor
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Gordon LISH |
Gordon Lish
O grande sedutor
O escritor norte-americano Gordon Lish é uma figura singular no meio literário. Lembrado — e muitas vezes venerado — pelos nomes que editou ou publicou em sua revista, a Genesis west — que tem no currículo boa parte da geração beat, como Neal Cassady, Jack Keroauc e Allen Ginsberg — e por sua parceria com Raymond Carver, um grande amigo seu, Lish é um brilhante contador de histórias.
Escrever sobre comer fezes, acreditar que Dean Moriarty realmente existiu e colocar em xeque o talento de Philip Roth, Paul Auster e David Foster Wallace, para citar só três exemplos, é coisa de alguém que, no mínimo, tem culhão. No final das contas, tudo isso só aumenta a mitologia que o cerca.
O autor de 82 anos, que desembarca agora no Brasil com o primeiro volume de seus contos Coleção de ficções 1, é uma grande incógnita. Em uma entrevista para a revista Paris Review, em 2005, declarou: “eu não sou escritor. Nunca me imaginei como escritor”. Menos avesso que J. D. Salinger ou Thomas Pynchon, Lish sempre se mostrou reticente a assumir o papel de protagonista, de fazedor de sua própria obra e enveredou pelos caminhos do ghostwriting.
Preâmbulo, texto que abre a coletânea, já dá a pista do que esperar: não é bem um prefácio, mas também não é exatamente um conto. É um texto em estado puro, vagando entre o limite tênue do desabafo, da explicação e, claro da literatura — uma literatura de sobrevivência e autoconsciência.
A recusa, que é bem diferente da renúncia, parece ser a melhor definição de sua prosa. Se Kafka devasta a burocracia em seus livros, Lish, como bom herdeiro do escrivão de Melville, prefere criar situações para serem colocadas de lado por seus personagens. Tudo que sei e Como escrever um poema são antíteses do que propõem: no primeiro conto o narrador esconde o jogo, manipula o leitor; no outro, dispara: “Talvez eu não goste de poetas — ou de pessoas”. Não é preciso explicar muito.
Lish não é um homem de receitas, não existe nada pronto em seus contos, é como se o leitor e autor levitassem até encontrar o zênite e, lá do alto, fossem arremessados. Se Gordon Lish fosse um deus, seria por certo um demiurgo, capaz de arrasar toda a humanidade em busca de um pouco de diversão.
Citado sempre como um autor controverso, Gordon Lish nunca se esquivou de levar sua literatura até as últimas consequências. Para Jerome — com amor e beijos é, ao mesmo tempo, uma paródia de Para Esmé — com amor e sordidez, de Salinger, e uma homenagem ao autor de Apanhador no campo centeio.
O conto, que receberia em 1984 o prêmio O. Henry Award, narra a tentativa frustrada do pai de se (re)aproximar do filho ermitão e é a sede de Lish pelo sublime e pelo etéreo, qualidade que diria jamais ter chegado perto. Ironicamente, cada linha carrega uma busca por sua própria individualidade e alheamento ao que o cerca.
Citado sempre como um escritor controverso, Gordon Lish nunca se esquivou de levar sua literatura até as últimas consequências.
Coração e mente
Gordon Lish não se deixa levar pelas emoções. Os textos são escritos com o coração e revisados e editados com a mente, o que explica o retorno do autor aos relatos que fazem parte da coletânea. Pouco a pouco as “novas versões” se tornam mais acessíveis, palatáveis e diretas — Lish corta e recorta, extrai o que pesa, coloca de lado a gordura dos primeiros trabalhos e cria uma opção definitiva completa e bem aparada com suas mãos de tesouras.
Por isso, não espanta a mira certeira de Sou largo, Imaginação e Três, além de, obviamente, mostrar que o escritor é também um bom editor de si mesmo — talvez a melhor opção possível. “Se fosse capaz de criar coisas como [Don] DeLillo e [Comarc] McCarthy não creio que insistiria em corrigir tanto”, confessou ao El País por ocasião do lançamento do livro Epigraphy.
Sua destreza com a linguagem é cirúrgica, capaz de transformar situações simples, como no conto Medo: quatro exemplos, em um labirinto godardiano.
A revista The Believer definiu Lish como o Andy Kaufman literário, o que faz todo o sentido. Tateando um tom minimalista, o autor de Dear Mr. Capote coloca em um mesmo livro vidas em paralelo, histórias que se cruzam e que jamais vão se cruzar.
Em tudo o que já escreveu, de cartas a romances, Lish deixa claro, com todas as letras, que é um escritor/editor típico, aquele que não sabe fazer outra coisa a não ser manusear palavras e precisa delas para manter-se vivo e alimentado.
Laços de família
Enquanto há quem o “culpe” pelo estilo de Carver, acusando Lish de ter formatado os célebres Fique quieta, por favor, Iniciantes e Do que estamos falando quando falamos de amor a seu bel-prazer, tem quem o defenda argumentando que não fazia mais que o seu (sujo) trabalho de editor. Anos mais tarde, Tess Gallagher, viúva de Raymond, também seria apontada como profanadora dos textos do marido. (Mas aí já é polêmica para outro texto.)
Seu filho, Atticus Lish, que terá seu primeiro livro editado em solo tupiniquim em breve pela Rádio Londres, não parece tão confiante da influência do pai sobre si. Questões familiares, por sinal, não são querelas tão fáceis de dissolver no universo do contista. Peste entre tias e Para Rupert — sem promessas são desenhos de relações pouco lisonjeiras.
Coleção de ficções 1, pontapé de uma série de quatro livros, revela um homem em fúria, mas com um único desejo em mente: a sedução. Para Lish, a escrita deve obrigatoriamente seduzir leitor, levá-lo pela mão até a cama. E, no caso, a sedução do e pelo texto só cabe porque “tudo ao nosso redor ou dentro de nós é narrativa” e “a narrativa é o limite de si mesma”.
A literatura de Lish é um mergulho mar adentro, uma impressionante experiência de confronto entre o poder da representação da realidade. Quase cego de um olho, o autor de Extravaganza ainda enxerga melhor e com mais profundidade que muitos de nós — e consegue, com extrema proeza, dissecar tudo a uma distância segura.
quinta-feira, 19 de junho de 2025
Juan Manuel Roca / Ous cinco enterros de Pessoa
Juan Manuel Roca
OUS CINCO ENTERROS DE PESSOA
Poucas veces sucede
que ao morrer um poeta
sejan necessários cinco caixöes.
Como poucas vezes sucede
que un poeta seja morada
para que nele vivam,
para que trabalhem 'a sua vontade
e durmam quando quiserem,
sem pagar renda,
sem amenacas do senhorio.
outros 4 poetas.
As enterro de Pessoa
foram com sigilo,
tal como viveram.
Nunca protestaram
contra a estreiteza da una moradia,
esse peculiar viver dento da gabardina.
¿Mas nao desejariam mais espaco
agora, na rigidez das formas?
Näo se viu Pessoa em tertulia
com os seus 4 fantasmas cardinais.
Nao se viu em grupo
a caminho da tabacaria,
partilhando viuvezes.
Pessoa e os seus compadres,
e essa forma
de nao se deixarem ver nos espelhos.
terça-feira, 17 de junho de 2025
Frederick Forsyth / Sam perdâo
Sem Perdão
Frederick Forsyth
Editora Record
242 páginas
domingo, 15 de junho de 2025
Frederick Forsyth / Contos
Sem perdão
No Comebacks
É um livro contendo 10 contos, quais sejam: Sem Perdão, Não Há Cobras Na Irlanda, O Imperador, Há Certos Dias..., Dinheiro Sob Ameaça, Usado Como Prova, Privilégio, Dever, Um Homem Cuidadoso e O Trapaceiro.Murmúrio do vento, ou O Veterano
Coleção cosistente em cinco contos "The Veteran" (O veterano), "The Art of the Matter" (A essência da arte), "The Miracle" (O milagre), "The Citizen" (O cidadão), e "Whispering Wind" (Murmúrio do vento)
sábado, 14 de junho de 2025
Frederick Forsyth (1938-2025)
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Frederick Forsyth |
FREDERICK FORSYTH
(1938 - 2025)
Frederick Forsyth (Ashford, 25 de agosto de 1938 – 9 de junho de 2025) foi um escritor inglês.
Educado na Tondridge School, e depois na Universidade de Granada, na Espanha, aos 19 anos, começou a servir a RAF (Royal Air Force) como um dos mais jovens pilotos, tendo servido até 1958. Depois começou a trabalhar no Eastern Daily Press como repórter. Em 1961, se tornou correspondente da Reuters em Paris. Trabalhou também na Alemanha Oriental e na Tchecoslováquia, países onde obteve muitas informações que seriam, posteriormente, publicadas em seus livros. Retornando a Londres em 1965, trabalhou como repórter de rádio e televisão na BBC, o que lhe proporcionou a oportunidade de conhecer a fundo os grandes dramas da política internacional. Essa experiência no jornalismo o ensinou a ser minucioso e preocupado com as verdades históricas. Como correspondente diplomático assistente, cobriu o lado biafrense da guerra entre a Nigéria e Biafra de julho a setembro de 1967, e isto forneceu a ele conhecimento de política internacional, especialmente sobre o mundo dos soldados mercenários. Foi este trabalho e a pesquisa relacionada que interessaram a ele como verdade histórica. Em 1968, deixou a BBC para retornar para Biafra e cobriu a guerra, primeiro como freelance e depois para o Daily Express e para a revista Time.
Em 1970, após nove anos de intensa carreira jornalística, Forsyth teve a ideia de escrever um livro onde poria à prova os métodos de investigação de sua atividade como repórter. Escolheu um tema romanesco e de certo modo misterioso: as tentativas da extrema direita francesa de assassinar o General Charles De Gaulle, presenciadas por Forsyth em 1962 em Paris. Nasceria assim o primeiro de sua longa lista de sucessos: O Dia do Chacal.
A lista de thrillers que escreveu após o grande sucesso deste livro o tornou um best-seller internacionalmente reconhecido. Especializou-se em romances envolvendo espionagem e política internacional. Com O Fantasma de Manhattan, flertou com romances de suspense, mas o resultado foi decepcionante para seus antigos leitores. Estão entre seus grandes livros os romances A Alternativa do Diabo, Dossiê Odessa e O Quarto Protocolo,
Frederick Forsyth falava francês, alemão e español fluentes, e viajou por toda a Europa, Oriente Médio e África, e estas experiências podem ser vistas na autenticidade dos seus livros.
Forsyth morreu no dia 9 de junho de 2025, aos 86 anos
sexta-feira, 6 de junho de 2025
Edmund White (1940-2025)
Edmund White (1940-2025)
A agência AFP noticiou a morte de Edmund White, considerado expoente da literatura LGBTQIAP+, aos 85 anos. Via Folha de São Paulo:
O romancista americano Edmund White, figura destacada da literatura LGBTQIA+, morreu aos 85 anos, conforme anunciou seu agente literário nesta quarta-feira.
“Tristemente, posso confirmar que Ed morreu ontem à noite em sua casa em Nova York por causas naturais”, disse seu agente Bill Clegg à AFP.
Nascido em 13 de janeiro de 1940, White escreveu dezenas de romances, vários contos, artigos e ensaios, com a homossexualidade como seu tema central.
Foi aclamado por seu primeiro romance, “Forgetting Elena”, publicado em 1973, e em seguida escreveu o muito explícito “The Joy of Gay Sex”, uma espécie de “Kama Sutra” ilustrado que se tornou uma referência LGBTQIA+ globalmente.
Entre suas outras obras se destacam “A Boy’s Own Story” e múltiplos livros de memórias, como o recente “The Loves of My Life” e “City Boy – Minha Vida em Nova York”, editado em 2012 pela Benvirá.
Entre seus outros livros já publicados no Brasil, estão os romances “O Homem Casado” e “O Lindo Quarto Está Vazio”, além do relato “O Flâneur: Um Passeio Pelos Paradoxos de Paris”.
Escreveu sobre a homossexualidade desde a década de 1950, quando ser gay era considerado uma doença mental, até a liberação sexual após as manifestações de Stonewall em 1969, que testemunhou diretamente.
Depois vieram os anos da Aids, que afetaram toda uma geração. O próprio White seria recebeu diagnóstico de HIV positivo em 1985 e conviveu com a condição durante quatro décadas.
O autor viveu em Paris durante quase 15 anos, entre os anos 1980 e 1990, escreveu também biografias sobre os escritores Jean Genet, Marcel Proust e Arthur Rimbaud.
Seus sucessos literários lhe abriram as portas de universidades prestigiosas, onde ministrou aulas de escrita e literatura, também centrado na homossexualidade. Estava casado com o também escritor Michael Carroll desde 2013.
“Esta é uma notícia muito triste. Não havia ninguém como Edmund White!”, escreveu a autora Joyce Carol Oates na rede social X. “Uma surpreendente versatilidade de estilo, uma temática audaciosa e inovadora, um humor negro, um amigo de tantos durante décadas.”
O romancista francês Édouard Louis também prestou homenagem a White no Instagram. “Um amigo incrível”, disse. “Leal, generoso, bonito, carinhoso. Sempre apoiou e encorajou os jovens escritores como ninguém.”
quarta-feira, 23 de abril de 2025
domingo, 9 de março de 2025
Mário de Andrade
Mário de Andrade
Em 1923, Mário de Andrade foi passar o Carnaval no Rio de Janeiro. A intenção inicial era visitar Manuel Bandeira, mas Mário se encantou com o Carnaval do Rio e acabou não indo a Petrópolis, onde o poeta vivia.
Para se justificar, ele escreveu uma carta ao amigo:
"Meu Manuel… Carnaval!… Perdi o trem, perdi a vergonha, perdi a energia… Perdi tudo. Menos minha faculdade de gozar, de delirar… Fui ordinaríssimo. Além do mais: uma aventura curiosíssima. Desculpa contar-te toda esta pornografia. Mas… que delícia, Manuel, o Carnaval do Rio! Que delícia, principalmente, meu Carnaval! […] Meu cérebro acanhado, brumoso de paulista, por mais que se iluminasse em desvarios, em prodigalidades de sons, luzes, cores, perfumes, pândegas, alegria, que sei lá!, nunca seria capaz de imaginar um Carnaval carioca, antes de vê-lo. Foi o que se deu. Imaginei-o paulistamente. […] Admirei repentinamente o legítimo carnavalesco, o carnavalesco carioca, o que é só carnavalesco, pula e canta e dança quatro dias sem parar. Vi que era um puro! Isso me entonteceu e me extasiou. O carnavalesco legítimo, Manuel, é um puro. Nem lascivo, nem sensual. Nada disso. Canta e dança. Segui um deles uma hora talvez. Um samba num café. Entrei. Outra hora se gastou. Manuel, sem comprar um lança-perfume, uma rodela de confete, um rolo se serpentina, diverti-me 4 noites inteiras e o que dos dias me sobrou do sono merecido. E aí está porque não fui visitar-te. Estou perdoado."
MORAES, M. A.(org.). Correspondência Mário de Andrade & Manuel Bandeira. São Paulo: EDUSP, 2002, pp.84-85.
Mário de Andrade, fotografado por Adamastor Pinto, pai do escritor Lenine Pinto, na casa de Câmara Cascudo, em Natal, em 1929.
segunda-feira, 24 de fevereiro de 2025
Picasso / Buñuel
Picasso & Buñuel
Um aniversariante de 22 de fevereiro: o espanhol Luis Buñuel (1900-1983), um dos grandes do cinema – na foto, em visita no sul da França ao amigo de longa data e também espanhol Pablo Picasso em 1955, durante as filmagens do documentário "Le Mystère Picasso", de Henri-Georges Clouzot.
***
Veja também
Semióticas – Picasso na fotografia
https://semioticas1.blogspot.com/2024/01/picasso-na-fotografia.html
O blog Semióticas está on-line em:
https://semioticas1.blogspot.com/
Bluesky / Semióticas
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quarta-feira, 19 de fevereiro de 2025
Casa de citas / Truman Capote e Marilyn Monroe
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Marilyn Monroe y Truman Capote |
TRUMAN CAPOTE
E MARILYN MONROE
Truman Capote nunca foi um grande dançarino. Mas naquela noite, ele bem que tentou. Girou desajeitadamente pelo salão, guiando Marilyn Monroe em uma valsa que tinha menos de coreografia e mais de súplica. Ele queria convencê-la a interpretar Holly Golightly na adaptação cinematográfica de seu livro Breakfast at Tiffany’s, conhecido no Brasil como Bonequinha de Luxo.
E, de fato, Marilyn era perfeita para o papel. Havia nela a doçura ingênua e o brilho sedutor que faziam Holly parecer ao mesmo tempo uma miragem e uma mulher de verdade. Mas havia também a melancolia — aquela sombra sutil nos olhos de quem sabe que a beleza e o desejo têm prazo de validade.
Capote via tudo isso. Ele entendia Holly porque entendia Marilyn. Mas nem sempre o que está na tela da mente de um escritor se traduz no roteiro da vida real.
A coach da atriz, no papel de oráculo, decretou: "Não aceite. O personagem não pega bem."
E assim, Marilyn recusou.
O papel foi para Audrey Hepburn, que o vestiu como um vestido Givenchy: com elegância e um toque de intocabilidade. Ela transformou Holly em algo tão etéreo que o mundo não conseguiu mais enxergá-la de outra forma.
Mas e Marilyn? O que teria sido de sua carreira se tivesse aceitado? Teria finalmente conquistado o reconhecimento da Academia, que nunca lhe concedeu nem mesmo uma indicação ao Oscar? Teria mostrado ao mundo que era muito mais do que um rosto bonito, um corpo escultural e uma voz infantilizada? Ou teria se perdido ainda mais em um papel que, ironicamente, espelhava sua própria fragilidade?
Nunca saberemos.
No fim, a vida é feita dessas danças interrompidas, dessas portas que se fecham sem saber sequer se deveríamos ter entrado. Capote dançou, quase capotou, mas não convenceu. Marilyn sorriu, mas recusou. Audrey abraçou e se deu bem. E o mundo seguiu sem nunca descobrir como teria sido essa história em um tom de batom
Facebook / A Toca do Lobo
terça-feira, 18 de fevereiro de 2025
Por que gostei tanto de Emilia Pérez

Por que gostei tanto de Emilia Pérez, por Isabel Lustosa
Em mais uma atualização do dia, publicamos um comentário de Isabel Lustosa, da Universidade Nova de Lisboa, sobre o recém-lançado filme Emilia Pérez, dirigido pelo cineasta francês Jacques Audiard. O filme, que tem gerado polêmica na atual temporada de premiações do cinema, se propõe a abordar temas como representação cultural, identidade de gênero e violência relacionada ao narcotráfico no México. A despeito das controvérsias, Lustosa defende que Emilia Pérez, por se tratar de um musical e uma obra de ficção, possui uma característica alegórica inerente, contribuindo de forma muito feliz para tornar a inverossimilhança da história aceitável e descortinar temas sensíveis aos mexicanos.
Boa leitura!
Por que gostei tanto de Emilia Pérez
Por Isabel Lustosa
Universidade Nova de Lisboa)
Eu não ia ver o filme. Mas o convite de Ângela Porto para encontrá-la no recém-inaugurado Cinema José Wilker, em Laranjeiras, me convenceu. Fui para encontrar a amiga e conhecer o lugar. As críticas e a sinopse do filme não me animavam. Afinal, a história de um traficante poderoso e crudelíssimo – daqueles que usam os restos de suas vítimas para alimentar seus cães –, que resolve virar mulher, era algo tão bizarro que ultrapassava o racionalmente aceitável. Houve quem dissesse que o filme, por ser feito por um francês, não apresentava o verdadeiro México. Havia lido também sobre o fato de se tratar de um musical que misturava todos os ingredientes acima com a terrível história do desaparecimento, em 2014, de 43 jovens estudantes cujos restos mortais nunca foram encontrados. Os críticos acharam um desrespeito. A isto somou-se o fato de terem vindo à tona declarações da atriz que faz a protagonista, a mulher trans Karla Sofía Gascón, em que teria feito comentários contra muçulmanos e negros nas redes sociais.
Começando por esse ponto. Costuma-se dar exagerada importância ao que dizem os atores. Tenho grande respeito por essa nobre e difícil profissão, em geral, tão mal remunerada. Alguém que escolhe ser ator se joga em um futuro de incertezas que, se não pertencer a uma família de posses, pode fazer com que termine sua existência em condições bem precárias. Só uma grande vocação ou uma paixão muito intensa podem motivar essa escolha. E, no entanto, graças a esses heroicos aventureiros, temos uma vida cultural riquíssima que serve de alento à humanidade, especialmente em momentos desalentadores como o que vivemos.
Pela natureza da profissão, acredito que não se pode cobrar que os atores correspondam, na vida real, à imagem idealizada que, a partir dos grandes personagens que interpretaram, criamos deles. O ator tem que ter versatilidade, capacidade de interpretar o melhor dos mocinhos e o pior dos vilões sem se apegar ao personagem. Uma vez li uma entrevista de Marcello Mastroianni em que ele recomendava: não confie em ator. Talvez o conselho fosse direcionado às mulheres, mas vindo de alguém com tanto prestígio na profissão, parecia um diagnóstico do que a profissão podia fazer com a personalidade de seus escolhidos.
Por isso, costumo relevar o que alguns atores famosos disseram ou fizeram em relação à política recente. Claro que esse desconto não vale para pessoas que se tornaram propagandistas ativos da extrema direita ou de suas bandeiras. Não vou nomear duas atrizes globais que tanto confundiram suas imagens com o bolsonarismo e que, com isto, contaminaram para sempre tudo que fazem com essa opção política. Mas cancelar a grande Nathalia Timberg – cujo nome guardei desde a infância quando a vi em uma novela com o misterioso título de “A ré misteriosa” (eu não sabia o que era “ré”) –, jamais me passou pela cabeça. E, em 2013, ela se prestou – gosto de acreditar que por insistência de seus patrões – a aparecer com outras atrizes, todas vestidas de preto na campanha intensiva contra o PT que culminou no impeachment de Dilma Rousseff.
Feito esse parêntese, volto ao filme Emilia Pérez.
Gostei de tudo que vi. As atrizes são maravilhosas; os números musicais são bem inseridos e econômicos; as canções e as danças são ótimas; a história envolve e prende o espectador do começo ao fim. Estive poucas vezes no México, mas o que vi me pareceu muito com o que conheci lá. O fato de ser um musical contribui de forma muito feliz para tornar a inverossimilhança da história algo bastante palatável. Serve de alerta: trata-se de uma obra de ficção. Trata-se de uma alegoria. E faz com que a transformação do homem corpulento, de pele áspera, de voz grave e roufenha, na bela, charmosa e feminina, mas algo corpulenta, Emilia Pérez, seja aceitável.
Nos diálogos com a advogada e, depois, com o médico que fará as cirurgias, em que Manitas – apelido do criminoso – explicita as razões pelas quais quer virar mulher, está a essência do filme. O monstruoso assassino trazia desde sempre, dentro de si, uma mulher. Não somente uma mulher fisicamente bela e desejável, mas também alguém com características de personalidade opostas às do homem que ele era: a vontade de agradar, a capacidade de perdoar e o desejo de corrigir injustiças.
O amor pelos filhos, no entanto, amor de pai que sempre existira e que não é estranho à atividade criminosa – veja-se a família do Poderoso Chefão, por exemplo – faz com que ponha em risco todo o projeto. Esse amor correspondido é o tema da cena e da canção mais bonita do filme. O momento em que Emilia Pérez nina um dos meninos para que ele durma e ele diz que gosta do cheiro dela, porque esse cheiro lembra o do pai, vai evocando coisas da natureza ou dos hábitos que ambos partilharam no passado.
Também resulta feliz o número musical magnífico de Zoe Saldaña – que interpreta a advogada – na festa para arrecadar fundos para o projeto de busca e identificação dos restos mortais das tantas vítimas do tráfico, inclusive os 43 estudantes mencionados acima. A contradição de reunir autoridades e a elite endinheirada mexicana que, direta ou indiretamente, estava associada às injustiças que se procurava corrigir, é típica. Realidade que Emilia Pérez explicita para a advogada Rita Castro como algo que não tem muito jeito. Como aqui entre nós, por exemplo.
Não concordo com as críticas que consideraram uma profanação misturar a história de uma mulher trans com esse tema tão sofrido para os mexicanos. Acho até que é uma forma de preconceito. Como se a mulher trans fosse uma ebookaberração pior que o traficante e que não fosse digna de figurar em um drama em que, depois de morta, se transforma em uma santa popular. Assim como em outros casos que nos chegam pelos jornais de forma cada vez mais indiferente, pelo tanto que se repetem, sempre ouvimos falar sobre os 43 estudantes sem conseguir dedicar mais tempo a refletir sobre isso. Emilia Pérez, com todas as suas contradições, desenterra esses mortos e obriga o mundo a pensar sobre eles
sexta-feira, 14 de fevereiro de 2025
Karla Sofía Gascón /Cancelaciones buenas y malas

Karla Sofía Gascón: cancelaciones buenas y malas
El escarnio público está de moda incluso entre quienes se tienen por abiertos y progresistas

Bertrand Russell me da claves para entender el presente cuando dice que “el fanatismo es un camuflaje de la crueldad”. Es de crueles fanáticos pretender que cualquier persona con visibilidad pública sea moralmente inmaculada. No me hace falta que el fontanero piense como yo para que me arregle un grifo ni que alguien que se dedica a la interpretación tenga ideas “correctas”. Lo que más se desprende del caso Karla Sofía Gascón es el alcance descomunal que tiene la hipocresía en nuestros tiempos. El concepto de delito de opinión se parece a aquello tan extraño de “pecar de pensamiento” y socava la libertad de expresión de todos. La tolerancia a lo que no nos gusta forma parte de ese derecho, pero el escarnio público está de moda incluso por parte de quienes se tiene por abiertos y progresistas. ¡A los leones! Gritan para que se note que ellos están del lado de las víctimas, ellos son buenos. No caben matices ni la complejidad. Todos los promotores y partidarios de cancelaciones a diestro y siniestro será que están libres de todo pecado y por eso tiran no solo la primera piedra sino que arrojan todas las que pueden con una furia primitiva. Hay que aniquilar al impuro para que los dioses vuelvan a bendecirnos. Eso sí, les molesta que Karla Sofía Gascón diga que hay que expulsar a los moros, pero no parece que les escandalice ni la explotación laboral de las temporeras ni los encarcelamientos de inocentes sin juicio ni sentencia que habitan en los CIE. Es más importante el lenguaje.
Algunas voces han salido a pedir compasión por la trans defenestrada, les parece una exageración que se condene así a una persona por difundir ideas odiosas. Parece que hay cancelaciones buenas y cancelaciones malas y la empatía es discrecional, según si nos gusta más o menos la persona de quien se pide la muerte civil (o física, en algunos casos). Ninguno de estos partidarios del perdón y la comprensión dijeron ni media palabra cuando un monigote que representaba a Carmen Calvo apareció colgado de un árbol, cuando Lidia Falcón fue expulsada de Izquierda Unida, Amelia Valcárcel del Consejo de Estado. Nada expresaron cuando Marcela Lagarde vio interrumpida su charla en la universidad o cuando a Juana Gallego se le impidió dar clases en el máster de comunicación y género que ella misma había creado. Solo hubo silencio cuando a Silvia Carrasco se le impidió seguir con su curso de antropología. Y no me suena que nadie, salvo las feministas, protestara porque se pidiera quemar los libros de J.K. Rowling.