sábado, 28 de abril de 2018

Isabeli Fontana / Natasha Poly / Vogue China




Isabeli Fontana / Natasha Poly
Vogue China March 2012
Photos by Inez Van Lamsweerde & Vinoodh Matadin
Fashion Editor:  Nicoletta Santoro
Hair:  Duffy
Makeup:  Aaron de Mey






segunda-feira, 23 de abril de 2018

Maya Angelou / Uma vida completa


Maya Angelou


Maya Angelou, uma vida completa

Reconhecida como grande poetisa norte-americana e figura influente da cultura afroamericana, lutou pelos direitos civis e pela igualdade depois de superar um trauma na infância


Alberto López
4 de abril de 2018

Quando uma pessoa pode contar que, ao longo da vida, foi poetisa, atriz, cantora, bailarina, escritora, cozinheira, jornalista, condutora de bondes e até prostituta… só resta concluir que teve uma vida completa. Se a isso acrescentamos que escreveu sete autobiografias, teve uma indicação para o prêmio Pulitzer, três para o Grammy e mais de meia centena de títulos honoríficos, podemos fazer uma ideia de quem foi e o que representou Maya Angelou, mais conhecida como a doutora Angelou, apesar de nunca ter tido um título universitário, por sua influência na cultura afroamericana nas últimas décadas.
E tudo o que conseguiu, incluindo transformar-se em defensora dos direitos civis e da igualdade, foi a partir da superação pessoal: depois de um abuso sexual na infância, sofreu um mutismo patológico que durou quase cinco anos.
Maya, apelido derivado de “My” (meu) ou “Mya sister” (minha irmã), que ganhou do seu irmão mais velho, foi uma respeitada porta-voz das pessoas de raça negrae das mulheres e produziu obras consideradas uma defesa da cultura negra. Não era isenta de polêmica – sempre houve tentativas de censurar seus livros nas livrarias norte-americanas –, mas seus trabalhos são recorrentes nas escolas e universidades do mundo todo. As obras mais importantes de Angelou foram rotuladas como autobiografias de ficção, muitos críticos, no entanto, as qualificam como uma tentativa de desafiar a estrutura comum das autobiografias, criticando, mudando e expandindo o gênero, já que seus livros focam em assuntos como o racismo, a identidade, a família e as viagens.
Marguerite Annie Johnson, seu nome verdadeiro, nasceu em St. Louis, Missouri, em 4 de abril de 1928. Foi a segunda filha de um porteiro e nutricionista da marinha e de uma enfermeira. Quando Angelou tinha três anos e seu irmão quatro, a separação de seus pais fez os dois irmãos viajarem sozinhos de trem para o Arkansas, onde morariam com a avó paterna, Annie Henderson, que era uma exceção nas duras condições econômicas dos afroamericanos na época porque prosperara financeiramente durante a Grande Depressão e a Segunda Guerra Mundial graças a uma loja de artigos de primeira necessidade.
A avó, com sua força e independência, foi um grande modelo e uma fonte de inspiração para Maya. A menina logo perceberia o que significava ser negra em uma sociedade racista. “Era horrível ser negra e não ter controle sobre minha vida”, escreveu em sua primeira autobiografia, Eu Sei Porque o Pássaro Canta na Gaiola. Naquele período de sua infância, sentiu a ausência da mãe dolorosamente.
Maya Angelou
Maya Angelou posa com sua obra
Quatro anos depois, seu pai, sem prévio aviso, mandou os dois irmãos de volta para a mãe em St. Louis. Aos tinha oito anos, Maya foi violentada pelo namorado de sua mãe. Contou para o irmão e este contou para o resto da família. O homem foi julgado e declarado culpado, mas só foi condenado a um dia de prisão. Quatro dias depois de sair da cadeia foi assassinado, provavelmente pelos tios de Angelou, e Maya permaneceu muda durante quase cinco anos acreditando que “minha voz o havia matado; eu matei aquele homem porque disse seu nome. E depois pensei que nunca mais voltaria a falar, porque minha voz poderia matar qualquer um...”
Foi durante esse período de silêncio que Maya Angelou desenvolveu a memória extraordinária, o amor pelos livros e pela literatura e a grande habilidade de observar e escutar o mundo que a rodeava. De volta à casa da avó, uma professora e amiga da família, a senhora Flowers, a ajudou a recuperar a fala e lhe apresentou Charles Dickens, William Shakespeare, Edgar Allan Poe, Douglas Johnson e James Weldon Johnson, escritores que, ao lado de artistas feministas de raça negra como Frances Harper, Anne Spencer e Jessie Fauset, teriam influência em sua vida e em sua carreira.
Aos 14 anos, Maya Angelou e seu irmão voltam a morar com a mãe, desta vez em Oakland, Califórnia, e começa uma vida rica em experiências e aventuras. Durante a Segunda Guerra Mundial, Angelou cursou a Escola de Trabalho Social da Califórnia e, antes de se formar, trabalhou como condutora de bondes e foi a primeira mulher negra a ter esse trabalho em São Francisco. Três semanas depois de terminar a escola, aos 17 anos, deu à luz seu filho e se viu obrigada a aceitar numerosos trabalhos para sustentá-lo, entre eles trabalhar como prostituta ou administrar um bordel.
Em 1950 Maya se casou com Tosh Angelos, um músico grego amador, mas o casamento durou poucos anos. A carreira de Angelou se voltou para o palco depois que ela estudou dança e teatro. Fez uma turnê por 22 países da Europa cantando a ópera ‘Porgy and Bess’ e atuou em várias peças dentro e fora da Broadway, entre elas ‘Cabaret for Freedom’, que escreveu com Godfrey Cambridge. Em Paris conheceu o esquivo James Baldwin, figura emblemática da literatura negra e que também marcaria sua vida na defesa dos direitos civis dos negros.
Ganhou a confiança de Martin Luther King e trabalhou com o ativista sul-africano Vusumzi Make, o que lhe permitiu acompanhar de perto o processo da independência dos estados africanos. Viveu no Cairo e em Acra, onde foi editora do jornal ‘The Arab Observer’, escreveu artigos para o ‘The Ghanaian Times’ e apareceu na programação da Ghana Broadcasting Corporation. Ali conversou com Malcolm X, conheceu Nelson Mandela e se adaptou tanto ao mundo acadêmico como aos meios de comunicação, experiências que utilizou depois de sua volta aos Estados Unidos.
Em meados dos anos 1960, Maya Angelou desenvolveu sua escrita e confirmou seu compromisso com o ativismo social e a promoção dos direitos civis. Incentivada por amigos como James Baldwin, Angelou começou a escrever sua primeira autobiografia, a aclamada ‘I Know Why Caged Bird Sings’ (Eu Sei Porque o Pássaro Canta na Gaiola), sobre seus primeiros anos de vida, que lhe valeu uma indicação para o National Book Award em 1974. Em 1979, Angelou a adaptou para um roteiro de televisão e produziu os volumes seguintes de sua autobiografia até 2002.
Desde o final da década de 1960, a talentosa Maya Angelou dedicou sua energia a uma ampla variedade de projetos. Foi nomeada pelos presidentes Ford e Carter para diferentes comissões culturais, escreveu com frequência para a televisão e o cinema, obteve uma indicação para o Emmy por seu papel em ‘Roots’ em 1977, continuou aparecendo nas telas, por exemplo na série ‘Raízes’ e até compôs canções para Roberta Flack. Em 1973 se casou de novo, desta vez com Paul du Feu, ex-marido de uma feminista australiana, e por isso foi criticada pelos radicais negros.
Em 1979 fez amizade com uma desconhecida apresentadora de Baltimore, Oprah Winfrey, que se tornou sua discípula por admirar sua capacidade de sobrevivência e sua habilidade de conquistar seu espaço em mundos até então reservados para os homens brancos. Anos mais tarde, Winfrey, já rainha da televisão norte-americana e criadora de seu próprio Clube do Livro, foi um grande apoio para Maya Angelou.
Em 1981, Angelou e du Feu se divorciaram. Ela voltou para o sul dos Estados Unidos porque sentia que precisava se reconciliar com seu passado. Apesar de não ter um título universitário, aceitou ser professora de Estudos Americanos na Universidade de Wake Forest, Carolina do Norte, onde foi um dos poucos docentes contratados em regime integral. A partir desse momento, Angelou se considerou “uma professora que escreve”.
Em 1993, Maya recitou ‘On the Pulse of Morning’ na cerimônia de posse de Bill Clinton, algo que não acontecia desde 1961, quando Robert Frost recitou na posse de John F. Kennedy. Isso lhe trouxe mais fama e também mais reconhecimento a seus trabalhos anteriores. A gravação do poema lhe rendeu um Grammy. Em junho de 1995, apresentou um segundo poema em público, intitulado ‘A Brave and Startling Truth’ (Uma Verdade Corajosa e Surpreendente), para comemorar o 50º aniversário da ONU.
Maya estreou como diretora de cinema com ‘Down in the Delta’ em 1998. Também escreveu vários livros infantis, ensaios, artigos e contos em várias publicações periódicas e, em 2006, apoiada em sua amizade com Oprah Winfrey, começou a apresentar um programa de rádio chamado ‘Oprah and Friends’. Anos antes havia dedicado à apresentadora sua coleção de ensaios Wouldn't Take Nothing for My Journey Now (Não Levaria Nada para Minha Viagem Agora).
Em 2000, Angelou recebeu do presidente Clinton a Medalha Nacional das Artes e, em 2002, a Hallmark apresentou a ‘Coleção de Mosaicos da Vida de Maya Angelou’, uma série de cartões de felicitação com seus versos, enquanto ela levava adiante seus planos de escrever um livro de receitas e dirigir outro longa-metragem, além de fazer palestras onde fosse requisitada.
No final de 2010, Angelou doou seus escritos pessoais e lembranças da carreira ao Centro Schomburg para a Pesquisa da Cultura Negra no Harlem. A doação consistiu em mais de 340 caixas nom notas escritas a mão em cadernos de folhas amareladas para sua primeira autobiografia, correspondência de fãs e correspondência pessoal e profissional.
Em 2013, aos 85 anos, Angelou publicou a sétima autobiografia, intitulada ‘Mom & Me & Mom’ (Mamãe & Eu & Mamãe), enfocada na relação com sua mãe.
Maya Angelou faleceu em 28 de maio de 2014. Tinha 86 anos e foi encontrada por sua enfermeira e cuidadora. Apesar do estado de saúde frágil, que a obrigara a cancelar aparições públicas, Angelou estava trabalhando em um novo livro, uma autobiografia sobre suas experiências com líderes nacionais e mundiais.
Durante o funeral na Universidade de Wake Forest, seu filho recordou que, apesar das constantes dores derivadas de sua carreira de bailarina e das crises respiratórias, Angelou escreveu quatro livros durante os últimos dez anos de vida.
As condolências pelo falecimento de Angelou chegaram de todos os setores e de todas as partes do mundo, desde artistas até líderes mundiais, incluindo Bill Clinton e Barack Obama. Na semana seguinte à morte de Angelou, sua primeira autobiografia, Eu Sei Porque o Pássaro Canta na Gaiola, ocupou o primeiro lugar na lista de mais vendidos da Amazon.

14 teorias dos fãs sobre a nova temporada de ‘La Casa de Papel’


14 teorias dos fãs sobre a nova temporada de ‘La Casa de Papel’

Este artigo tem ‘spoilers’. Um montão


23 ABR 2018

Os seguidores de La Casa de Papel receberam a notícia da nova temporada da série com alegria, o que não surpreende se levarmos em conta que se tornou a série de língua não inglesa mais assistida na história da Netflix. Mas também com desconfiança, pois a história concluía no último episódio e é difícil saber de onde sairão os novos episódios, que estrearão na Netflix em 2019.
Se estiverem sem ideias, os responsáveis pelos argumentos podem dar uma olhada no Twitter e no Facebook, onde muitos seguidores já compartilharam um bom punhado de teorias sobre o futuro da série. Expomos algumas delas, não sem antes avisar que há spoilers. Muitos.
Realmente, tem um montão de spoilers.
QUEM É O PERSONAGEM MASCARADO?
1. Berlim volta. Na imagem divulgada pela Netflixaparecem o Professor e quatro dos ladrões que sobreviveram ao golpe, sem incluir Helsinque (avisei que havia spoilers, agora não reclame). A dúvida é quem será o novo ladrão.
Uma das teorias mais apreciada pelos fãs é que se trata de Berlim. Quase todo mundo quer que Berlim tenha sobrevivido aos tiros do final da série (estava falando sério quando me referi aos spoilers).
De fato, e como publicou a Cadena Ser, tanto Pedro Alonso, que interpreta esse personagem, quanto Esther Acebo (Mônica) também estarão presentes na nova temporada, embora não apareçam nessa primeira foto. Claro, no caso de Alonso, “a plataforma e a produtora ainda tem de entrar em acordo em relação à forma, pois Berlim morreu (supostamente) durante o final da série”. Está vivo ou só aparecerá em alguns flashbacks?
Em sua conta no Instagram, Alonso publicou na Semana Santa uma foto com as seguintes palavras impressas: “Domingo de Ressurreição”.






2. E se a mascarada for Mônica? Ou seja, a refém que passa para o bando dos ladrões e pela qual Denver se apaixona (se você estiver lendo em diagonal, talvez tenha pulado todas as advertências anteriores sobre os muitos spoilers deste artigo). Muita gente acredita que a figura mascarada é um homem, mas não está muito claro.
3. É alguém novo. Embora a imagem mostre cinco personagens da temporada anterior, há quem sugira que nenhum dos protagonistas das duas primeiras temporadas aparecerá. O novo roubo talvez nem seja dirigido pelo Professor (Álvaro Morte), mas por alguém que segue seus passos e que poderia ser essa pessoa mascarada.
AS ORIGENS
4. Uma continuação. É o que querem muitos daqueles que comentam na página da série no Facebook, que apostariam em explicar como o Professor escolheu cada um dos ladrões e, sobretudo, sua infância com Berlim, talvez conectando mais adiante com o presente. Eles também querem saber mais sobre a origem do plano.
5. Better Call Berlim. Alguns sugerem uma continuação no esquema spinoffprotagonizada pelo próprio Berlim. É claro que esse personagem –assassino e estuprador– caiu muito bem para os seguidores da série.
OUTRAS LINHAS DE ARGUMENTO
6. Alguns só querem ver a vida de cada um depois do roubo. Isto é, transformar uma série policial em uma novela.
7. A inspetora passa para o lado escuro. Uma vez afastada da polícia e reunida com o Professor, a inspetora Raquel Murillo (Itziar Nuño) colaborará com o novo plano, seja ele qual for. Talvez se torne uma segunda Berlim, isto é, o braço direito do Professor.
8. E o grupo de sérvios que tirou Tóquio da cadeia? Como o Professor os conheceu? Eles voltarão para chantageá-lo e exigir um novo roubo em troca?
9. Algumas pessoas apostam em temporadas independentes, ao estilo de Fargo, talvez em cidades e países diferentes.
10. Não há um novo roubo. O que acontecerá, segundo alguns, é que a polícia vai capturar um dos ladrões e o resto do bando será obrigado a tirá-lo da cadeia. De fato, se Berlim continuar vivo, poderia ser ele.
11. Outra opção parecida: a polícia vai caçá-los um por um.
12. Outros pensam que mais do que roubo, haverá motivação política. Uma mensagem contra o governo e contra os bancos. Alguns falam de uma possível versão espanhola de V for Vendeta, com os cidadãos colocando máscaras de Dalíno meio do plano. Esperamos que essa hipotética cena seja mais bem-feita do que aquela dos palhaços no hospital.











OS REFÉNS
13. Ninguém gosta de Arturo: um dos comentaristas quer vê-lo “arruinado e atordoado”. Nós somos muito a favor de Arturo. Ele se equivoca em quase todas as decisões que toma, então é impossível não se identificar com ele.
14. E quanto ao dinheiro? Muitos comentaristas estão preocupadíssimos em saber se os reféns receberam o dinheiro prometido por terem colaborado com os ladrões.
QUE DIFERENÇA FAZ
Como observamos, muitos fãs da série receberam a notícia dos novos episódios com receio: por que prolongar uma série já fechada e com um final até feliz, exceto pelas mortes de Oslo, Berlim e Moscou (se você chegou até aqui, já sabia que havia spoilers)? E por que o Professor e os outros iriam querer se envolver nessa confusão? Não são milionários? Quem quer trabalhar sendo milionário? Deve ser pelas coisas que se pode fazer sendo rico. Aqui existem uns tantos caprichos, qualquer um deles melhor do que se levantar cedo para ir ao escritório ou planejar um assalto mais ou menos perfeito.





sexta-feira, 20 de abril de 2018

Veneza / Uma cidade que naufraga com seus turistas


Navio entrando em Veneza  GETTY


Veneza, uma cidade que naufraga com seus turistas

Cidade italiana está ameaçada de perder o título de patrimônio da humanidade por causa de cruzeiros


DANIEL VERDÚ
20 NOV 2017 - 15:51 COT

Veneza é um parque temático de luxo em que a pessoa paga, olha e fica calada. Esse é mais ou menos o resumo feito na semana passada por seu prefeito, Luigi Brugnaro, para justificar que um restaurante próximo da praça São Marcos cobrasse a uma família de três pessoas que não falava italiano 526,50 euros (2.010 reais). Os turistas, indignados porque lhes tinham trazido pratos que não haviam pedido, pagaram a conta e escreveram uma carta ao prefeito porque essas coisas “podem arruinar a reputação de Veneza”. Não queriam reembolso, disseram. Só lamentar o ocorrido. A resposta de Brugnaro em uma entrevista à Sky 24 foi ainda mais surpreendente: “A pessoa come e bebe, e depois diz não saber italiano. Se você vem à Itália, aprenda a língua, e até um pouco de veneziano. Comeram uma lagosta e nem sequer deixaram gorjeta”. Uma explicação, em suma, que fala de todo um modelo.
A superexploração turística de Veneza, a cidade do mundo mais afetada por este setor (55.000 habitantes para 24 milhões de visitantes por ano) se aprofundou com a chegada dos navios de cruzeiro. Este ano desembarcaram 2,5 milhões de passageiros e o encanto de sua laguna voltou a se transformar em um grotesco postal com barcos gigantes a poucos metros do Palácio Ducal. Por isso, o Governo aprovou, para entrar em vigor em janeiro de 2018, a redução gradual no tráfego dessas megaembarcações. Por ora, o acesso ficará aberto aos com menos de 55.000 toneladas; os que superem esse peso serão desviados à passagem de Malamocco e atracarão no porto de Marghera, em Mestre.
Isto será suficiente? A medida responde a uma das condições impostas pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) para evitar que Veneza fosse eliminada da lista de cidades patrimônio da humanidade. Um plano para que o frágil ecossistema urbano de 455 pontes que unem as 118 ilhas da cidade não fique à deriva. Mas o projeto anunciado pelo Ministério da Infraestrutura e Transportes italiano não convenceu as organizações, que recolheram 18.000 assinaturas em defesa da remoção completa dos navios de cruzeiro da Laguna e seu desvio para Trieste. No momento todos os dias continuam atracando até seis cruzeiros com 4.000 pessoas a bordo.
A verdade é que Veneza se converte rapidamente em um belo cenário cada vez mais vazio. Sua população se reduziu em dois terços desde meados do século passado, também pelos estragos causados pela aqua alta – as marés que inundam os pontos mais baixos da cidade. Hoje continua a cair a um ritmo de 1.000 pessoas por ano, enquanto no mesmo período chegam mais turistas que destroem o tecido comercial e residencial. Em 12 de julho, o chefe da polícia restringiu o número de participantes e barcos na festa do Redentore. Em seguida se falou em frear o fluxo em toda a cidade, colocando obstáculos ou cobrando entrada: a caixa de pandora definitiva para a picaretagem. Mas não seria estranho, levando-se em conta que os italianos têm que pagar para ter acesso à maioria das praias.



quarta-feira, 18 de abril de 2018

Veneza não esquece Casanova, seu libertino universal



Veneza não esquece Casanova, seu libertino universal

A cidade inaugura o primeiro museu do mundo dedicado ao escritor e aventureiro


ÁLEX VICENTE
Veneza 15 ABR 2018 - 17:12 COT

Quando Carlo Parodi se mudou para Veneza, há alguns anos, se pôs a seguir o rastro de seu herói da infância, Giacomo Casanova, que nasceu na cidade italiana em 1725. O empresário lombardo descobriu que havia um único local para recordar sua memória. E que não estava necessariamente à altura de tão lendário personagem: uma simples placa comemorativa instalada na rua Malipiero, discreta travessa ao lado do Grande Canal, onde Casanova nasceu e cresceu. Toda vez que passava por ali, descobria turistas amontoados em frente à inscrição, imortalizando o momento com uma selfie. “Pensei comigo que não era possível que essa fosse sua única marca em toda Veneza. Precisava fazer algo para resolver isso”, explica Parodi, que se dedica à importação de prosecco no Reino Unido.
Decidiu criar um museu, o primeiro dedicado ao escritor e aventureiro em todo o planeta, que abriu as portas semana passada, coincidindo com o 220º aniversário da morte de Casanova. Situado em um palacete dos anos 1400 no bairro de Cannaregio, o chamado Casanova Museum and Experience é mais experiência que museu.
Casanova é como um iceberg: só conhecemos uma parte minúscula dele
Parodi fez uma aposta diferente da de um museu tradicional. Para começar, sua coleção se limita a alguns livros e objetos. Que ninguém espere uma rigorosa orientação científica, ainda que os textos sejam abundantes e bem documentados. Mas seu perfil é sem dúvida lúdico. Ao cruzar a porta, o visitante coloca óculos de realidade virtual e com isso consegue transformar-se em Casanova e viver as mesmas andanças que o personagem protagonizou na cidade de onde teve de escapar três vezes, ao ver-se perseguido por seus costumes libertinos. “Não é um artista que pintou quadros que agora possamos contemplar. Na verdade, creio que é sua vida que é uma obra de arte”, afirma Parodi. “Por isso era conveniente encarnar o personagem e assim entender quem foi.” O designer Roberto Frasca, encarregado dos aspectos tecnológicos, completa: “Este é um museu da experiência, onde o visitante deve ser o protagonista e não um ser passivo que observa atrás de uma vitrine”.
Retrato de Casanova
Retrato de Casanova GETTY
Ao longo de seis salas, o museu explora todas as facetas de sua biografia. Diferentes hologramas e vídeos evocam sua vida e sua obra, entre vestidos de época e projeções de quadros do Canaletto, e até um quarto onde o visitante é testemunha de seus rituais de acasalamento. Apesar de tudo, a principal obsessão de Parodi foi a de destacar-se do mito do qual Casanova acabou sendo vítima. “Foi um grande sedutor, mas também um grande literato, músico, cientista, diplomata e agente secreto”, afirma o fundador do museu. “Casanova é como um iceberg: só conhecemos uma parte minúscula dele. Quis lhe devolver sua complexidade e ecletismo.” O novo museu recorda que conviveu com personagens como Rousseau, Voltaire e Mozart. Um aplicativo para celular completa a visita e permite percorrer vários pontos da cidade vinculados a Casanova, como o Sottoportego dei Do Mori ou o Caffé Florian, onde Casanova encontrava suas conquistas. “É uma ideia importante recuperar esse personagem histórico e voltar a situá-lo neste belo lugar. Se Casanova é um veneziano por excelência, é porque esta não é a cidade de quem nasce aqui, mas de quem decide retornar a ela”, explicou o prefeito de Veneza, Luigi Brugnaro, durante a inauguração.
Casanova morreu na Boêmia, onde trabalhou como bibliotecário depois de cair no esquecimento e na miséria
Este é o primeiro museu Casanova, mas não será o último. No fim de 2018, Parodi abrirá outro centro idêntico em Praga, recordando que o aventureiro faleceu na Boêmia, onde trabalhou como bibliotecário a serviço do conde de Waldstein, depois de cair no esquecimento e na miséria. Também está finalizando uma versão itinerante da exposição que passará por algumas das cidades onde viveu: São Petersburgo, Paris, Londres e “uma cidade espanhola”, ainda a ser determinada. Em seu tempo, Casanova passou por Madri, Barcelona, Valência e Zaragoza entre 1767 e 1768, depois de expulso de Paris por seus indecorosos costumes. Fugiu depois de ser perseguido pela Inquisição e expulso da capital catalã, onde passou seis semanas em sua Ciudadela. Mais de dois séculos depois de sua morte, Casanova voltará a percorrer a geografia europeia.

FASCÍNIO PERMANENTE

Desde que suas exaustivas memórias de 3.500 páginas, História de minha vida, foram reeditadas nos anos 1960, depois de terem sobrevivido a um bombardeio dos aliados em Leipzig, Casanova voltou a se tornar objeto de fascínio. No fim do percurso, o museu veneziano passa em revista os filmes que se inspiraram em sua vida, dirigidos por todo tipo de cineastas, de Federico Fellini a Albert Serra. Numerosas biografias tentaram decifrar a chave de sua existência. Uma delas, assinada pela psicanalista Lydia Flem nos anos noventa, considerou-o um personagem pré-feminista e abrangeu sua sexualidade fluida e suas experiências com homens e mulheres. Outra mais recente, publicada em 2016, por Laurence Bergreen, destaca as carências afetivas que teriam sido provocadas pelo abandono de sua mãe, atriz que o deixou a cargo de sua avó e nunca lhe deu o amor de que necessitava. A Biblioteca Nacional da França adquiriu o manuscrito de História de minha vida em 2010 por 7 milhões de euros (cerca de 21 milhões de reais) o que o transformou na peça mais cara de sua coleção.
EL PAÌS