domingo, 29 de julho de 2018

Jacques Prevert / Yves Montad / Les feuilles mortes


https://www.youtube.com/watch?v=Ur9XthDjkq0

Yves Montand

Les feuilles mortes



Jacques Prevert
Les feuilles mortes

Oh! je voudrais tant que tu te souviennes
Des jours heureux où nous étions amis.
En ce temps-là la vie était plus belle,
Et le soleil plus brûlant qu’aujourd’hui.
Les feuilles mortes se ramassent à la pelle.
Tu vois, je n’ai pas oublié…
Les feuilles mortes se ramassent à la pelle,
Les souvenirs et les regrets aussi

Et le vent du nord les emporte
Dans la nuit froide de l’oubli.
Tu vois, je n’ai pas oublié
La chanson que tu me chantais.

C’est une chanson qui nous ressemble.
Toi, tu m’aimais et je t’aimais
Et nous vivions tous deux ensemble,
Toi qui m’aimais, moi qui t’aimais.
Mais la vie sépare ceux qui s’aiment.
Tout doucement, sans faire de bruit
Et la mer efface sur le sable
Les pas des amants désunis.

Mais la vie sépare ceux qui s’aiment.
Tout doucement, sans faire de bruit
Et la mer efface sur le sable
Les pas des amants désunis.
Et la mer efface sur le sable
Les pas des amants désunis.

Les feuilles mortes se ramassent à la pelle,
Les souvenirs et les regrets aussi
Mais mon amour silencieux et fidèle
Sourit toujours et remercie la vie.
Je t’aimais tant, tu étais si jolie.
Comment veux-tu que je t’oublie ?
En ce temps-là, la vie était plus belle
Et le soleil plus brûlant qu’aujourd’hui.
Tu étais ma plus douce amie
Mais je n’ai que faire des regrets
Et la chanson que tu chantais,
Toujours, toujours je l’entendrai!


https://www.youtube.com/watch?v=vbMDLfIjbNE

Autumn Leaves

The falling leaves
Drift by my window
The falling leaves
Of red and gold

I see your lips
The summer kisses
The sunburned hands
I used to hold

Since you went away
The days grow long
And soon I'll hear
Old winter's song

But I miss you most of all
My darling
When autumn leaves
Start to fall

Since you went away
The days grow long
And soon I'll hear
Old winter's song

But I miss you most of all
My darling
When autumn leaves
Start to fall


sábado, 28 de julho de 2018

Cadáveres desaparecidos durante décadas sob geleiras suíças emergem com aquecimento global


Bota encontrada com os cadáveres do casal Dumoulin, em julho de 2017

Cadáveres desaparecidos durante décadas sob geleiras suíças emergem com aquecimento global

Um guia de montanha encontrou o corpo de um alpinista japonês no Monte Cervino em 14 de julho


EL PAÍS
Madri, 23 Jul 2018

Um guia do Monte Cervino, ou Matterhorn, nos Alpes suíços, encontrou em 14 de julho o corpo de um alpinista, identificado dias depois como um cidadão japonês de 67 anos. Embora ainda não se saiba quando ou em que circunstâncias o homem desapareceu, a descoberta não é nova: o derretimento das geleiras devido ao aquecimento global tem revelado ao longo da última década outros corpos na Suíça, submersos durante anos no gelo em uma região na qual, desde 1926, cerca de 280 pessoas desapareceram sem deixar vestígios, segundo um porta-voz da polícia suíça do cantão de Valais, onde a montanha está localizada.


Garrafa achada junto com os cadáveres do casal Dumoulin.
Garrafa achada junto com os cadáveres do casal Dumoulin. POLICÍA DE VALAIS


Há apenas um ano, um funcionário da empresa Glacier 3000, que administra os teleféricos do Monte Cervino, encontrou enquanto caminhava pela geleira Tsanfleuron os cadáveres congelados em perfeito estado do casal Marcelin e Francine Dumoulin, que estavam desaparecidos desde 15 agosto de 1942. Com os corpos, que usavam roupas datadas da Segunda Guerra Mundial, foram encontrados um relógio, uma mochila e um livro. "Passamos nossas vidas procurando por eles, sem parar", disse Marceline Udry-Dumoulin, a filha mais nova do casal, em entrevista ao jornal Le Matin. O casal teve cinco filhos e duas filhas.
Em 2014, perto do topo do Matterhorn, foram encontrados os restos mortais de Jonathan Conville, que nunca voltou da escalada iniciada na montanha, em 1979. Nesse mesmo ano, foi encontrado em uma geleira, no cantão de Berna, o corpo de um explorador checo desaparecido desde 1974.
Um ano depois, também no Monte Cervino, um grupo de alpinistas encontrou os corpos dos japoneses Michio Oikawa e Masayuki Kobayashi, desaparecidos em 18 de agosto de 1970. De acordo com informações da polícia suíça, os dois jovens japoneses, de 22 e 21 anos respectivamente, passaram a noite anterior em um abrigo com a intenção de escalar o lado norte da montanha, quando "foram surpreendidos por uma nevasca". Em 2016, foram achados os restos mortais de um alemão desaparecido desde 1963 na geleira de Morteratsch, no cantão dos Grisões (Graubünden).
Desde que os dados começaram a ser compilados, em 1880, a longitude e espessura das geleiras suíças não pararam de encolher, de acordo com a GLAMOS, uma rede formada por várias universidades suíças e financiada pelo Ministério do Meio Ambiente do país. De acordo com os registros, a geleira Tsanfleuron perdeu, desde 1884, uma longitude de 1.926 metros, e a geleira Morteratsch, 2.804 metros desde 1878. Em 2017, apenas uma geleira manteve seu tamanho, enquanto 80 encolheram.
Na geleira Aletsch, nos Alpes suíços, também no cantão de Valais, foram encontrados em 2012 os corpos dos irmãos Johann, Cletus e Fidelis Ebener, sobre os quais não havia notícias desde março de 1926, quando saíram para uma expedição na geleira. Dois alpinistas britânicos que caminhavam na área no verão europeu encontraram os restos humanos, botas e equipamentos de montanha, uma descoberta que esclareceu um desaparecimento ocorrido há quase 90 anos.

quarta-feira, 25 de julho de 2018

Futebol / O apagão de Neymar

Neymar, após a eliminação do Brasil contra a Bélgica. 


O apagão de Neymar

Depois de sair da Copa do Mundo pela porta dos fundos, o atacante fica fora dos 10 melhores da FIFA e vê ameaçado seu poder no PSG

ÓSCAR SANZ
24 JUL 2018 - 14:22 COT

Neymar deve estar caído em algum lugar, pois só assim se explica que as sempre jubilosas redes sociais não tenham se enchido de imagens do craque aproveitando suas férias, em alguma praia paradisíaca, acompanhado dos amigos que se autodenominam Os Toiss. Talvez refletindo sobre o fato de ter ficado fora da lista do prêmio The Best, da FIFA, que elege os melhores jogadores do mundo, ou ainda a respeito de seu futuro no futebol. Mas ele mesmo se encarregou de acabar com as dúvidas sobre esse último assunto: “Continuo no PSG. Fui para o clube por um desafio e nada mudou em minha cabeça. Todo mundo sabe do carinho que tenho pelo presidente, pelo país e pela torcida”. Sem dúvida. Parece mentira que existam pessoas que duvidem do carinho que Neymar têm pelas torcidas. Principalmente a do Barcelona. As palavras do jogador deveriam bastar para acalmar a angústia dos fãs do Real Madrid, a quem a possível chegada de Neymar ao Bernabéu não é uma questão de gostar muito ou pouco. É uma questão de apreensão.

É curioso que clubes supostamente governados por sua torcida não levem em consideração o que a torcida quer ou não. Os portais de notícia se encheram nesses últimos dias de pesquisas sobre a (suposta) pretensão do Real Madrid, de Florentino Pérez melhor dizendo, de contratar Neymar. É verdade que essas pesquisas têm menos credibilidade científica do que qualquer crendice popular. Mas são tão unânimes que deixam entrever um repúdio maciço dos torcedores do Real à chegada do brasileiro. Não por acaso, o clube emitiu duas notas oficiais, porque uma é pouco, negando qualquer interesse pelo jogador. Essa reação lembra a do presidente Pérez quando a imprensa anunciou a contratação de Beckham pelo Real Madrid: “Never, never, never”, que traduzida à linguagem do mandatário significa dizer que pode muito bem acontecer.
Mas dizíamos que Neymar é muito feliz em Paris e no PSG. E, portanto, continuará ali. O problema é que sua condição de dono da equipe está sob suspeita. A culpa é de um garoto de 19 anos que sai da Copa, além de campeão, como símbolo de todo um país, a França, que aplaude suas virtudes futebolísticas e suas circunstâncias pessoais, descendente de imigrantes e nascido em uma das cidades mais marginais da periferia de Paris. É Kylian Mbappé, o menino que chegou ao PSG para prestar reverência ao imperador Neymar, “é como um irmão mais velho para mim”, chegou a declarar, mas de repente decidiu voar sozinho. E seus voos sobre os gramados russos ajudaram a França a vencer a Copa e tornar realidade o sonho de milhares de garotos franceses das periferias do país.
Neymar e o Brasil, enquanto isso, saíram da Copa pela porta dos fundos,eliminados nas quartas de final por uma formidável Bélgica liderada por um não menos formidável Hazard. Neymar tinha a ambição de que o campeonato dos campeonatos o colocasse no patamar em que ele ainda não está: o de Messi e Cristiano Ronaldo. Na Copa, deixou dois gols, algumas boas jogadas (qualidade tem de sobra) e um compêndio completo de quedas, seja pelas entradas dos rivais, seja por seu apego ao desmoronamento.
O dano que o Mundial fez a Neymar é enorme. Sua ambição de ganhar a Bola de Ouro ficou novamente morta e enterrada. Agora a lista de candidatos é liderada por Modric e Griezmann. E sua pretensão, para não dizer exigência, de ser o Rei Sol do PSG balança diante da vulcânica irrupção de Mbappé. O Real Madrid teria sido uma boa forma de escapar desses tempos nebulosos, em que a pessoa não tem vontade sequer de oferecer ao mundo as imagens de suas férias. E Florentino Pérez queria, ao contrário da torcida merengue. Mas voltou atrás pelo fato de que existem ligações que até o presidente do Real Madrid retorna. As do emir do Catar, por exemplo.

quinta-feira, 19 de julho de 2018

Nina Simone / Feeling Good

Nina Simone
T.A.


Nina Simone
FEELING GOOD

É uma canção escrita por músicos ingleses Anthony Newley and Leslie Bricusse.

Nina Simone regravou a canção em 1965 para o álbum "I Put a Spell on You."

A versão dela acabou se tornando a mais conhecida e também a que teve a maior quantidade de covers.

Entre os artistas que regravaram a versão de Nina estão a banda inglesa Muse, o cantor britânico Ronan Parke, a americana Eels, e os cantores Michael Bublé e George Michael, entre outros.




https://www.youtube.com/watch?v=Ff-0pHwyQ1g



Feeling Good
by Anthony Newley and Leslie Bricusse

Birds flying high you know how I feel
Sun in the sky you know how I feel
Breeze driftin' on by you know how I feel

It's a new dawn
It's a new day
It's a new life
For me
And I'm feeling good

Fish in the sea you know how I feel
River running free you know how I feel
Blossom on the tree you know how I feel

Dragonfly out in the sun you know
What I mean, don't you know
Butterflies all havin' fun you know what I mean
Sleep in peace when day is done
That's what I mean

And this old world is a new world
And a bold world
For me

Stars when you shine you know how I feel
Scent of the pine you know how I feel
Oh freedom is mine
And I know how I feel



https://www.youtube.com/watch?v=oRMICrdFRqw
FEELING GOOD

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Pássaros voando alto, você sabe como me sinto

Sol no céu,você sabe como me sinto
Brisa passando,você sabe como me sinto

(refrão)x2
É um novo amanhecer
É um novo dia
É uma nova vida
Pra mim
E estou me sentindo bem

Peixe no mar, você sabe como me sinto
Rio correndo livre, você sabe como me sinto
Florescer na árvore,você sabe como me sinto

(refrão)

Libélula ao Sol,você sabe o que eu quero dizer, não sabe?
Borboletas se divertindo, você sabe o que eu quero dizer
Adormecer em paz ao fim do dia
Isso que eu quero dizer!

E este velho mundo é um novo mundo
E um corajoso mundo
Pra mim

Estrelas quando brilham, você sabe como me sinto
Aroma do pinheiro, você sabe como me sinto
Oh a liberdade é minha
E eu sei como me sinto





domingo, 15 de julho de 2018

Mbappé iguala Pelé, mas não quer ser Peter Pan






Mbappé iguala Pelé, mas não quer ser Peter Pan

Jovem estrela francesa chegou a final em meio a comentários que recomendavam a paciência que sua juventude precisa, mas ele se rebelou contra isso. Não gosta que falem e o julguem por seus 19 anos



LADISLAO J. MOÑINO
Moscou 15 JUL 2018 - 14:23 COT



Com somente 17 anos, para ser um dos integrantes da seleção brasileira que jogou a Copa de 1958, Edson Arantes do Nascimento, o Pelé, precisou antes passar por um teste exigente. O treinador Vicente Feola elaborou primeiro uma lista de 220 jogadores que foi reduzida a 33 e por fim aos 22 que foram à Suécia. “A maior parte deles estava nas mesmas condições para a prática do futebol. Depois, comecei a eliminá-los. As causas não foram técnicas e sim físicas e de atitude. Ficaram no Brasil os contrários à disciplina, os violentos e os que se achavam prima donnas”, contou anos mais tarde o já falecido Feola.

As decisões do treinador brasileiro foram influenciadas pelo chamado Relatório Carvalhaes, com exceção dos casos de Mané Garrincha e Pelé. Se no veredito do primeiro, o psicólogo e sociólogo, chamado João, se referia a uma “inteligência abaixo da média”, no de Pelé afirmava categoricamente: “Com 17 anos, possui um perfil evidentemente infantil. Não tem o espírito necessário para lutar. É muito jovem para aguentar pancadas e agressões e responder a elas de maneira adequada. Não tem o senso de responsabilidade necessário e o espírito de equipe. Sua convocação não é aconselhável”.
A tentativa de Pelé de abandonar a concentração antes da viagem à Suécia por não suportar a dor em um de seus joelhos, atingido com violência por Ari, zagueiro do Corinthians, durante um amistoso, fez com que Carvalhaes voltasse a querer tirar Pelé da seleção: “É um menino, não para de chorar, não podemos levá-lo à Copa do Mundo”. Feola, pela segunda vez, desautorizou o psicólogo. Com seu empenho em manter Pelé, o técnico evitou que fosse cortada a até agora irrupção individual mais impactante de um jogador em uma Copa.

Guardando as devidas proporções, aos 19 anos Kylian Mbappé relembrou nas oitavas de final contra a Argentina (4 a 3) o espetacular surgimento daquele jovem brasileiro de 17 anos que na Suécia estranhava o fato de que nas outras seleções não jogassem negros.
Desde sua exibição diante do olhar perdido de Messi, Mbappé ficou devendo uma atuação semelhante. Contra o Uruguai, é lembrado mais pelo espetáculo circense aos moldes de Neymar, incluindo uma solada em Cebolla Rodríguez, do que por realizar uma dessas arrancadas que ilustram a passada mais elegante e demolidora do momento. Contra a Bélgica, detalhes como um passe para Giroud dentro da área de calcanhar foram grandiosos, mas sua atuação foi irregular. Mas, na final contra a Croácia, embora não tenha brilhado como na ocasião diante dos argentinos, Mbappé fez história ao igualar Pelé como o segundo jogador a marcar em uma final de Copa com menos de 20 anos. Além disso, ganhou o prêmio de revelação do Mundial, que pode impulsioná-lo à Bola de Ouro, ultrapassando Messi, Cristiano Ronaldo, Neymar e até mesmo Griezmann e Modric, eleito o craque do torneio.

Para Mbappé, a final chegou em meio à preocupação na equipe de como ele pode ter digerido a grande partida que fez contra a Argentina e sua posterior queda de rendimento. O assunto encheu a concentração e os debates esportivos na França de comentários protetores que recomendavam a paciência que sua juventude precisa. Mbappé se rebelou contra isso. Não aceita a “síndrome de Peter Pan”, resumida no medo de se tornar adulto e enfrentar os problemas da maturidade.
“Mbappé não gosta que falem de sua idade... Para irritá-lo, às vezes dizem que tem 15 anos”, contou Samuel Umtiti na última quinta-feira. “Ele é maduro, podemos falar de tudo com ele, tem a cabeça no lugar. Ele sabe onde e como quer ir. Está realizando algo inacreditável, mas se mantém da mesma forma”, afirmou o zagueiro do Barcelona.
“Kylian”, diz Deschamps, “é tratado por mim da mesma forma que todos os jogadores, é parte dos 23 e vive a mesma situação, ainda que evidentemente por minha experiência sei que é importante ser mais indulgente com os jovens”. “Sua experiência não é muito grande, porém Kylian é inteligente, sabe ouvir, sabe o que quer, às vezes podemos ter pequenas discussões, mas é igual ao que ocorre com os outros, quando lhes digo algo não necessariamente positivo para corrigir”, afirma Deschamps. Ao que parece, o garoto quer ser julgado pelo técnico, por seus colegas e pela imprensa como mais um integrante da equipe titular sem levar em conta sua idade. Não quer que sua juventude seja uma desculpa para justificar seus momentos ruins e para ser exaltado se seu rendimento for bom.
Parte da imprensa francesa explica essa atitude na ambição de Mbappé por chegar o quanto antes ao topo do futebol mundial e na fé que ele mesmo possui em suas qualidades. Isso o leva a querer assumir um protagonismo central nas partidas que hoje recai mais na capacidade de Griezmann em administrar os tempos do jogo e os espaços do que sobre suas devastadoras arrancadas. Ao marcar na final da Copa, Mbappé cravou seu nome em uma seleta galeria de craques precoces. É o segundo mais jovem a alcançar o feito, atrás apenas de Pelé, a quem o garoto nascido na periferia parisiense sonha superar no futuro promissor que tem pela frente.




sábado, 14 de julho de 2018

Vargas Llosa / A ‘espanholita’ e o Príncipe Gurdjieff




A ‘espanholita’ e o Príncipe Gurdjieff

A odisseia de Patricia Aguilar no Peru me causa tristeza e admiração. E se fosse feliz com sua deplorável vida? Respeitar sua vontade seria então o justo


Mario Vargas Llosa
14 Jul 2018

“Espanholita” não por machismo falocrático nem pela paixão dos peruanos pelos diminutivos, mas por carinho, por parecer tão frágil, magrinha e vulnerável, lá no distrito de San Martín de Pangoa, em plena selva amazônica, onde os mosquitos devem tê-la comido viva, com sua bebezinha de um mês nos braços e esses olhões de moça valente, que descobriu a verdade e sabe que este mundo vai desaparecer, mas que ela se salvará com a ajuda do Príncipe Gurdjieff e será a mãe de uma nova humanidade.
Imagino perfeitamente sua história. Patricia Aguilar, de 16 anos, está ali em sua terra natal, Elche (Alicante), sofrendo pela morte de um tio muito querido, navegando na Internet. E de repente aparecem na tela as palavras salvadoras, vindas do outro lado do mundo, o Peru. Primeiro, elas a intrigaram, depois a seduziram e, por fim, a convenceram. Este mundo iria acabar por causa da insensatez e crueldades dos humanos, mas alguns poucos se salvariam, graças ao Príncipe Gurdjieff e sua sabedoria para transpor as aparências e chegar à verdade crua e dura. Com ele sobreviveriam aqueles que escutassem sua mensagem. Que importância tinha para ela que aqueles textos estivessem repletos de erros de ortografia se comunicavam algo que chegava ao seu coração e lhe transmitia uma força desconhecida? Às escondidas de seus pais, Patricia manteve longas conversas com o guru peruano, que a instruía nas verdades gnosiológicas, astrais e esotéricas que possui e dava instruções que a jovem convertida seguia ao pé da letra.



Ao completar dezoito anos e, portanto, maior de idade, disse aos pais que iria jantar na casa de um amigo. Na verdade, desapareceu, levando seis mil euros da família. Aterrissou em Lima, onde conheceu seu mestre, mentor e, desde então, amante. O Príncipe Gurdjieff tinha uma mulher legítima e pelo menos mais duas amantes. E filhos com todas elas. Vivia em um bairro periférico pobríssimo, mas a espanholita estava preparada para todos os sacrifícios. Ficou grávida e, como as outras mulheres do harém do qual agora fazia parte, se tornou vendedora ambulante para alimentar e vestir seu Príncipe e guru. Segundo a vizinhança, da moradia em que ele vivia com seu serralho e parvulário emergiam ruídos violentos, pancadas.
Aqui aparece o herói da história, segundo os jornalistas: Alberto Aguilar Berna, comerciante que fornecia o fermento a todas a padarias de Elche, homem modesto, trabalhador e inatingível pelo desânimo. Começou a mover céus e terra para encontrar a filha desaparecida. Denunciou seu sumiço à polícia de Alicante, mobilizou a opinião pública, conseguiu recursos e, quando soube que Patricia estava no distante Peru, partiu para esse remoto confim. Ali apresentou outra denúncia à polícia local. Ao mesmo tempo, fez investigações e chegou a descobrir o bairro em que vivia o Príncipe Gurdjieff: encheu-o de cartazes oferecendo dez mil soles de recompensa a quem lhe revelasse o paradeiro da moça.



Jovem resgatada nega ter sido sequestrada e diz estar contente com a filhinha dela e do xamã

Nessa altura, o bruxo, xamã e vigarista já havia fugido para Junín, várias centenas de quilômetros a leste de Lima, e se refugiara em um povoadinho amazônico, Alto Celendín, onde Patricia e as demais mulheres trabalhavam como garçonetes em um restaurante para lhe dar de comer. Alberto Aguilar Berna chegou lá, com policiais peruanos aos quais teve de pagar a viagem, a comida e a hospedagem, dado o orçamento exíguo da Polícia Nacional. Por fim, deram com ela e essa é a fotografia espalhada pelo mundo: a espanholita em bombachas floridas, de anatomia filiforme, com sua bebezinha nos braços e um olhar fixo e sereno, de quem desafia o mundo porque sabe que a verdade é sua.
A polícia capturou também o Príncipe Gurdjieff, cujo nome verdadeiro é Félix Steven Manrique Gómez. Tem 35 anos e, além de bruxo, guru, sedutor e fabulador, promete a suas sequazes femininas reduzir os seus quadris, se eles forem muito largos, aumentar os seios, se forem pequenos, e afinar o nariz. É dotado de uma vaidade espantosa. Assim que o capturaram pediu um cabeleireiro-barbeiro que lhe cortasse o cabelo e lhe fizesse a barba, para aparecer melhor nas fotografias da imprensa. É técnico eletricista, expulso de uma seita chamada Gnosis por conduta imprópria e, usando nomes e pseudônimos diferentes no Facebook e no YouTube, vinha anunciando fazia tempo o irremediável fim do mundo e sua recriação, graças a ele ser o escolhido.
Até agora tudo tem a aparência de uma história bastante comum, neste mundo de obscurantistas mais ou menos embusteiros e mocinhas crédulas. No entanto, em vez de um final feliz, os problemas de Alberto Aguilar Serna e sua esposa só estão começando. Porque sua filha Patricia, que está sendo “desprogramada” pelos psicólogos da polícia peruana, nega, pelo visto, que tenha sido sequestrada, afirma que está muito feliz com seu destino, com a filhinha que lhe fez o Príncipe Gurdjieff, e se nega a ser “salva”. Não nos esqueçamos que é maior de idade e que, a não ser que esteja irremediavelmente louca, pode fazer com sua vida o que bem quiser. É verdade que, como está vivendo ilegalmente no Peru, poderia ser expulsa para a Espanha, onde, disse sua simpática mãe, esperam “ela e a filhinha com os braços abertos”.



Sem vendedores de disparates e suas vítimas sendo “desprogramadas”, o mundo se despovoaria

Tenho tão pouca simpatia pelo Príncipe Gurdjieff como pelo Gurdjieff verdadeiro, aquele que, segundo Jean-François Revel, era um “verme bêbado” que, na Paris dos anos quarenta, seduzia com suas lorotas espiritualistas senhoras milionárias e intelectuais progressistas (incluindo ele, por um tempo) a fim de que lhe pagassem as bebedeiras. Mas se fossem meter na prisão todos os vendedores de disparates religiosos e nos dedicássemos a “desprogramar” quem acredita no que eles contam, o mundo, temo, ficaria despovoado. E, algo pior, a liberdade desapareceria.
No entanto, embora todos os livros esotéricos me produzam bocejos de crocodilo, sinto grande carinho pela filiforme Patricia, e sua odisseia me causa uma tristeza mesclada de certa admiração. Era feliz, levando a deplorável existência que levava ao lado do Príncipe, servindo-o, como as outras infelizes que também acreditavam nas idiotices com erros de ortografia que ele lhes dizia? Aqueles que a “desprogramam” lhe abrirão o caminho da normalidade? E se a convertem em uma moça bem alimentada, bem vestida, mas sem rumo, infeliz, convencida de que, como pessoa normal, perdeu sua alma e razão de viver?
Não digo que aconteça, mas pode acontecer, e nesse caso, o que é o mais justo? Acho que é deixá-la fazer aquilo em que acredita, o que a faça sentir-se melhor, respeitar o destino que ela escolher para a pequenina que engendrou nos braços daquele Príncipe de araque. A “normalidade” também pode ser temível quando é imposta pela força e consiste em aniquilar a liberdade dos outros, os diferentes, em relação aos quais acreditamos ser normais.