domingo, 31 de janeiro de 2016

Hollywood se vinga de sua jornalista mais temida



Hollywood se vinga de sua jornalista mais temida

Dois filmes retratam Hedda Hopper, a cronista de fofocas que podia acabar com a carreira de um ator


Irene Crespo
Nova York
24 JAN 2016 - 18:08 COT


Inspirada na atriz de cinema Ethel Barrymore, a estilosa Hedda Hopper comprou seu primeiro chapéu com um dos salários que recebeu quando começou a ajudar o pai no açougue da família. A atenção que atraiu com aquele chapéu “de ráfia verde e gerânios vermelhos” na missa de domingo de Altoona, na Pensilvânia, a fez se dar conta de duas coisas: adorava ser o centro das atenções e, por isso, “jamais voltaria a andar com a cabeça descoberta”.

sábado, 30 de janeiro de 2016

Dakota Johnson questiona preconceito etário em filmes de Hollywood




Dakota Johnson e Melanie Griffith/AFP
Dakota Johnson e Melanie Griffith/AFP

Dakota Johnson questiona 

preconceito etário 

em filmes de Hollywood

"Esta indústria é brutal", denuncia a atriz de 26 anos 

sobre a falta de trabalhos para sua mãe, Mellanie Griffith, 58 anos


Postado por Redação Donna
05-01-2016 às 11h08



– Por que minha mãe não está nos cinemas? Ela é uma atriz extraordinária!
Começa assim o desabafo da atriz Dakota Johnson, 26 anos, conhecida por seu papel em 50 Tons de Cinza, a respeito da carreira da mãe, Mellanie Griffith, 58 anos (na foto acima). 
Em entrevista à Vogue UK divulgada nesta terça-feira (5), a jovem denuncia o preconceito de Hollywood com artistas a partir de uma determinada idade.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

Ana Cristina César / Como rasurar a paisagem

Foto de Pascal Baetens

Ana Cristina César
COMO RASURAR A PAISAGEM

a fotografia
é um tempo morto
fictício retorno à simetria

secreto desejo do poema
censura impossível
do poeta



quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

Ana Cristina César / Ciúmes


La colilla
Bogotá, 2015
Foto de Triunfo Arciniegas
Ana Cristina César

CIÚMES


Ana Cristina César / Celos (De otros mundos)


Tenho ciúmes deste cigarro que você fuma
Tão distraidamente.




terça-feira, 26 de janeiro de 2016

Ana Cristina César / Primeira lição

Ana Cristina César


Ana Cristina César

Primeira lição

Os gêneros de poesia são: lírico, satírico, didático, épico, ligeiro.
O gênero lírico compreende o lirismo.
Lirismo é a tradução de um sentimento subjetivo, sincero e pessoal.
É a linguagem do coração, do amor.
O lirismo é assim denominado porque em outros tempos os versos sentimentais eram declamados ao som da lira.
O lirismo pode ser:
a) Elegíaco, quando trata de assuntos tristes, quase sempre a morte.
b) Bucólico, quando versa sobre assuntos campestres.
c) Erótico, quando versa sobre o amor.
O lirismo elegíaco compreende a elegia, a nênia, a endecha, o epitáfio e o epicédio.
Elegia é uma poesia que trata de assuntos tristes.
Nênia é uma poesia em homenagem a uma pessoa morta.
Era declamada junto à fogueira onde o cadáver era incinerado.
Endecha é uma poesia que revela as dores do coração.
Epitáfio é um pequeno verso gravado em pedras tumulares.
Epicédio é uma poesia onde o poeta relata a vida de uma pessoa morta.
olho muito tempo o corpo de um poema
até perder de vista o que não seja corpo
e sentir separado dentre os dentes
um filete de sangue
nas gengivas




Ana Cristina Cesar (1952 - 1983)  nasceu no Rio de Janeiro. Formada em Letras pela PUC-Rio, mestre em Comunicação pela UFRJ e em Teoria e Prática de Tradução Literária pela Universidade de Essex, na Inglaterra, participou da antologia 26 poetas hoje (1976), organizada por Heloisa Buarque de Hollanda. Foi poeta, jornalista, tradutora e crítica literária. Tornou-se um dos mais importantes representantes da poesia marginal que florescia na década de 1970, justamente pela singularidade que a distanciava das “leis do grupo”.


segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

O voo eterno de Ana Cristina César

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O voo eterno de Ana Cristina César


Belíssima, intensa, sensual e elegante, Ana Cristina Cesar foi dona de um talento que, desde muito cedo, a enveredou para o universo das letras, e agora, trinta anos depois de sua morte, retorna às prateleiras das livrarias com uma edição caprichada reunindo seus trabalhos mais significativos, tanto na prosa quanto na poesia, em Poética, editada pela Companhia das Letras.
Os leitores mais jovens certamente não devem conhecê-la, mas com o lançamento desta antologia poderão se debruçar sobre os mais dicotômicos labirintos linguísticos e sensoriais da poética da autora nascida no Rio de Janeiro, em 2 de junho de 1952, e que morreu prematuramente em 29 de outubro de 1983, suicidando-se com trinta e um anos de idade, ao se atirar do sétimo andar na janela do apartamento de seus pais, na rua Tonelero, no bairro de Copacabana.
Assista à matéria em vídeo sobre o lançamento de “Poética” no Rio de Janeiro.
A vulnerabilidade, a beleza e o talento somados à sua trágica morte são ingredientes que atenuam cada vez mais o interesse pela obra da eternamente jovem poetisa, que foi um dos principais nomes da geração mimeógrafo e da poesia marginal na década de 70.
Começou a escrever poemas ainda muito cedo, quando menina, como podemos conferir na imagem abaixo, que pode ser encontrada no acervo do Instituto Moreira Salles, em São Paulo.
Poema datilografado de Ana Cristina Cesar, em agosto de 1958. (Arquivo Instituto Moreira Salles)
Poema datilografado de Ana Cristina Cesar, em agosto de 1958. (Arquivo Instituto Moreira Salles)
No fim dos anos 60, quando viajou para a Inglaterra, onde passou uma estadia em Londres, Ana C. aproximou-se ainda mais da literatura e adquiriu intimidade com a língua inglesa, trazendo em sua volta para o Rio obras de autoras como: Katherine Mansfield, Emily Dickinson e Sylvia Plath (outra grande jovem poetisa norte-americana que se suicidou aos trinta anos, em 1963).
Matriculou-se no curso de Letras, na PUC-RIO, e logo depois fez Mestrado em Comunicação, na UFRJ; retornando à Inglaterra onde estudou Tradução Literária, na Universidade de Essex, tornando-se também Mestre.
Começou a traduzir livros de autores estrangeiros como também a publicar suas próprias produções, neste caso, em revistas e jornais alternativos, na década de 70. Além de ter sido uma grande pesquisadora na área da literatura.
Mocidade Independente
Pela primeira vez infringi a regra de ouro e voei pra cima semmedir as consequências. Por que recusamos ser proféticas?  Eque dialeto é esse para a pequena audiência de serão?  Voei pracima: é agora, coração, no carro em fogo pelos ares, sem umagraça atravessando o estado de São Paulo, de madrugada, porvocê, e furiosa: é agora, nesta contramão.

Noite de Natal
Estou bonita que é um desperdício.Não sinto nadaNão sinto nada, mamãeEsqueciMenti de diaAntigamente eu sabia escreverHoje beijo os pacientes na entrada e na saídacom desvelo técnico.Freud e eu brigamos muito.Irene no céu desmente: deixou detrepar aos 45 anosEntretanto sou moçaestreando um bico fino que anda feio,pisa mais que deve,me leva indesejável pra perto dasbotas pretaspudera.

Olho muito tempo o corpo de um poema
Olho muito tempo o corpo de um poemaaté perder de vista o que não seja corpoe sentir separado dentre os dentesum filete de sanguenas gengivas.
ana cristina - 3Dividida entre a prosa poética e a poesia, a produção literária de Ana C. apresenta uma mescla de ficção com autobiografia, influenciada tanto pela cultura pop, pela colagem quanto pela concisão e por uma estética de viés mais cult.
Sob o apogeu da ditadura militar no Brasil, numa época de contravenção cultural fomentada, sobretudo, pelos jovens e diretamente influenciada pela geração beat e, posterior, a cultura hippie, nos Estados Unidos, Ana Cristina se destacou como uma grande figura feminina dentro da literatura brasileira do século 20, ao abordar temas como a liberdade sexual, a independência e a representatividade intelectual da mulher na sociedade.
“Ao fechar o livro que contava sua própria história, em 29 de outubro de 1983, Ana C. provocou uma comoção geral. Um acontecimento dessa ordem não afeta somente o que você escreve, mas a vida inteira; ainda mais quando com alguém de sua intimidade”, palavras do poeta Armando Freitas Filho, seu melhor amigo durante dez anos, e com quem se confidenciou ao telefone quarenta minutos antes de sua morte.
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Ana C. havia lhe confessado estar se sentindo emparedada e que gostaria que o médico a receitasse algo que a fizesse chorar. A poetisa também comentou durante a conversa com Armando sobre o seu completo desânimo de viver. O amigo tentou reanimá-la e achou que o tratamento médico e a presença do enfermeiro ao seu lado lhe ajudariam a superar o atual estado de depressão em que se encontrava, sem pressentir que aquele seria o último dia em que ambos se falariam.
poetica_ana_cristina_cesar_capaCom a reunião de seus escritos pela Companhia das Letras reacende-se o eterno brilho, a beleza e a jovialidade da bela carioca registrados em suas fotografias e que se refletem diretamente no sublime arsenal de sua autêntica poesia.
Poética é mais que um livro ou uma antologia comemorativa de uma notória artista de geração. É um resgate da essência de uma menina-mulher que jamais poderá ser esquecida de nossa literatura brasileira. E não poderiam ter dado título melhor para resumir o espírito sensível e precocemente criativo de Ana Cristina Cesar, que aos seis anos de idade, mesmo que ainda não completamente alfabetizada, ditava poemas para a sua mãe: poética.
PoéticaAna Cristina Cesar
Editora Companhia das Letras
504 págs.
Assista ao Booktrailer do livro com o poema Samba-cançãoabaixo:




domingo, 24 de janeiro de 2016

Ana Cristina César, ‘poeta marginal’ dos anos 70



Ana Cristina César, ‘poeta marginal’ dos anos 70, será homenageada na Flip

A poetisa carioca é a segunda mulher a ser celebrada na maior festa literária do país


Ana Cristina César é a homenageada da Flip em 2016
Ana Cristina César. / ACERVO IMS
Uma mulher, poetisa e expoente da literatura marginal brasileira nos anos 70, será a homenageada da próxima Festa Literária de Paraty. Ela é Ana Cristina César (1952-1983), carioca que foi ícone literário de sua geração e cuja obra – em poesia, tradução e crítica literária – convida a um resgate que ainda está por acontecer. A escolha da Flip, que após 13 anos de existência põe pela segunda vez uma autora feminina em destaque (a primeira foi em 2005, com Clarice Lispector), endossa os movimentos de mulheres em prol de liberdades individuais e direitos coletivos que ganham, desde outubro, as ruas do país. Por outro lado, põe em foco a Poesia Marginal, movimento do qual fez parte e que eclodiu com a antologia 26 poetas hoje (1975), de Heloísa Buarque de Hollanda.

Ainda que um revival de Ana Cristina César já tenha se esboçado em 2013 com a publicação pela Companhia das Letras da antologia Poética, pode-se esperar muito mais a partir de agora. Elizama Almeida, assistente cultural da curadoria de literatura do Instituto Moreira Salles, que detém o acervo da escritora no Rio de Janeiro, comemora: “Ana C. foi incluída no grupo da Poesia Marginal, mas nunca deixou de se destacar dentro dele, com uma voz própria. Há inclusive uma tradição clássica em sua obra, influenciada por Carlos Drummond de Andrade e Manuel Bandeira", explica a pesquisadora. Entre as influências de fora, aparecem especialmente as inglesas Katherine Mansfield e Sylvia Plath, que ela traduziu ao português.

Paulo Werneck, que é o curador da Flip pelo terceiro ano consecutivo, conta que Ana C. (como os amigos a chamavam), estava na mesa de discussão sobre os homenageados da festa há algum tempo. “Este ano ela se impôs graças à importância de sua obra, mas também pelo fato de a poesia contemporânea funcionar muito bem na Flip”, afirma o curador. Vale lembrar que, na última edição da festa, a jovem poetisa portuguesa Matilde Campilho foi uma das autoras mais celebradas nas mesas literárias e também nas livrarias – seu livro de estreia, Jóquei (editora 34), foi o título mais vendido em Paraty. Dois anos atrás, na edição de 2013, outras duas jovens poetisas, Ana Martins Marques e Bruna Beber, brilharam também – e Rua da padaria(Record), de Beber, foi o título mais vendido daquele ano.

Não sei como poderei pegar no sono. A literatura me perturba. Uma caixa cheia de cartões-postais me perturba. A renúncia me perturba. Até uma caixa d’água, um otorrino gauche, um índice onomástico. Tomo tudo na veia"
Ana C. em carta dirigida ao amigo e poeta Armando Freitas Filho
A poesia da carioca é marcada por um tom confessional, direto e de grande coloquialidade. Seus primeiros livros, Cenas de abril eCorrespondência completa, foram editados de maneira 100% independente e caseira, pela própria autora e por seus colaboradores e amigos mais próximos, o poeta Armando Freitas Filho e Heloisa Buarque de Hollanda. Em 1982, surge seu primeiro livro lançado por uma editora (a Brasiliense): A teus pés. “Esse foi o primeiro livro da série Cantadas literárias, que tem uma importância enorme por ter lançado não só Ana Cristina, mas escritores como Caio Fernando e Marcelo Rubens Paiva”, diz Paulo Werneck. Para Elizama Almeida,A teus pés amplia o espectro da autora, “porque ela sai do fazer experimental e passa, em um ambiente mais formal, a dialogar com um público mais amplo, que a consagrou”.

Escrever é a parte que chateia, fico com dor nas costas e remorso de vampiro. Vou fazer um curso secreto de artes gráficas. Inventar o livro antes do texto. Inventar o texto para caber no livro. O livro é anterior. O prazer é anterior, boboca"
Ana C. em carta dirigida a Heloisa Buarque de Hollanda
A morte precoce de Ana C., que se suicidou aos 31 anos, é um tema que permeia as discussões sobre a escritora. Mas tanto o curador como a pesquisadora preferem afastar essa lupa ao analisar seu legado. “A homenagem da Flip tem o objetivo, junto ao público, de ajudar a apresentar um autor  que ainda não se conheça e também desfazer lugares comuns ao redor dele. No caso da Ana Cristina, esse é um aspecto, mesmo evocando uma força e até certo mistério, que limita sua obra”, opina Werneck. Elizama diz que as portas do IMS estão abertas a pesquisadores e interessados no vasto universo da poetisa. E esclarece: “Os momentos mais difíceis na vida dela foram os dois últimos anos antes do suicídio, segundo relatam amigos, e as cartas que ela deixou. Ana era uma pessoa alegre e inteligente, e seria errado que sua morte servisse de chave de leitura principal de sua obra”, diz a especialista, que recomenda o documentário Bruta Aventura em Versos, de Letícia Simões, aos curiosos.
A 14a edição da Flip acontece entre os dias 29 de junho e 3 de julho de 2016. E, no rastro desta homenagem, a poesia marginal deverá impregnar a programação, assim como – espera-se – a voz literária (normalmente silenciada) das mulheres.


sábado, 23 de janeiro de 2016

Antonio Cicero / Perplexidade




Antonio Cicero
PERPLEXIDADE


Perplexity by Antonio Cicero (Kiss)

Não sei bem onde foi que me perdi;
talvez nem tenha me perdido mesmo,
mas como é estranho pensar que isto aqui
fosse o meu destino desde o começo.


Antonio Cicero

A cidade e os livros
Rio de Janeiro: Record, 2002, p.67 
(ed. portuguesa: Vila Nova do Famalicão, Quasi, 2006, p.45).



sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Mulheres elegem filmes e livros (sobre mulheres) que você precisa conhecer

Mulheres elegem filmes e livros 

(sobre mulheres) 

que você precisa conhecer

Cineastas e escritoras brasileiras compartilham suas histórias preferidas sobre mulheres


    Uma Thurman no filme 'Kill Bill', de Quentin Tarantino.
    A voz feminina está se fazendo ouvir, em alto e bom tom, em diversas cidades brasileiras.
    Enquanto milhares de mulheres se manifestam nas ruas do país em prol de seus direitos e de sua integridade, no cinema e na literatura mundiais suas histórias de resistência vêm sendo contadas através de livros e filmes imperdíveis. Muitos deles merecem e precisam ser ouvidos, especialmente em tempos como os atuais, de conservadorismo retrógrado e daninho.

    quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

    Morre Ettore Scola, clássico do cinema italiano

    Ettore Scola







    Morre Ettore Scola, 

    clássico do cinema italiano

    Fiel retratista da Itália, com ele se despede um cinema militante, que falava com e sobre a rua


    Madri 20 JAN 2016 - 07:55 COT



    Com a morte de Ettore Scola, para o cinema italiano, acabaram os clássicos. E para as pessoas comuns, as que sofreram com Silvio Berlusconi na Itália e qualquer político populista no restante da Europa, as que ainda vivem fazendo malabarismo sobre o vazio da crise econômica, morreu seu cavaleiro andante. Na noite de terça-feira faleceu em Roma, aos 84 anos, Ettore Scola, e com ele se despede um cinema militante, um cinema que falava com e sobre a rua. Da geração de criadores que catapultaram o cinema italiano na segunda metade do século passado restam vivos tão somente os irmãos Taviani, mas o rastro de Scola é mais profundo, humano e surpreendente. Para Ettore Scola importava, e muito, segundo confessava, ser uma boa pessoa, e por isso seus filmes destilavam bondade, algo que nunca preocupou a geração atual de estrelas autorais de seu país: enquanto eles alimentam seu ego, Ettore Scola estimulou o ego do povo. Morreu o vermelho Scola.
    Scola (Trevico-Avellino, 1931) amou a Itália e foi o seu mais fiel retratista, mas seu país natal não lhe correspondeu igualmente nas últimas décadas. “Para fazer um filme você tem de amar a cidade ou o país onde ele transcorre, e eu não sinto amor pela Itália. Não a odeio, mas, sim, me invade a tristeza”, contou a este jornalista em 2009, em uma viagem de carro de Madri a Valladolid, em cujo festival ia receber a Espiga de Ouro de Honra da Semana Internacional de Cinema (Seminci). Muitas de suas críticas se dirigiam a Silvio Berlusconi, então no poder. “Nem os políticos nem os intelectuais fizemos o suficiente para enfrentá-lo, para pará-lo. O pior é que a Itália não melhorará se Berlusconi morre. Sua ideologia já está enraizada.” Em sua luta contra os falsos heróis, o cineasta sempre defendeu a irritação como uma arma muito útil para apoiar suas reivindicações ideológicas. “O interesse privado, o egoísmo, continuam acima do rigor e da solidariedade. De modo que as reivindicações dos sessenta continuam tão vigentes hoje como então”, dizia ao apresentar em 1997 A História de um Jovem Homem Pobre. “O pessimismo é muito mais progressista que o otimismo, encerra mais fé no futuro. O otimismo é coisa de beatos.”
    Sophia Loren / Marcelo Mastronianni
    Um dia muito especial
    A Special Day
    Una giornata particolare

    O diretor nunca se declarou líder de nada e, em troca, marcou espectadores e cineastas, como, na Espanha, Fernando León. “O cinema é uma arte de equipe. Militante é uma palavra de que nunca gostei. No trabalho que faço minhas ideias são transmitidas; não fosse assim, não seria uma obra de autor. Quando filmo películas especificamente políticas, inclusive documentários para o Partido Comunista, nelas estão minhas convicções estéticas. E no cinema que parece mais profissional, como em Rocco Papaleo estão minhas convicções políticas.”
    Passou seus últimos anos lendo os clássicos gregos e latinos, e seu último trabalho teve muito a ver com esse respeito aos seus maiores: no documentárioQue Estranho Chamar-se Federico (2013), Scola repassava a figura, com admiração, de quem considerava seu irmão mais velho, Federico Fellini. Coincidiram trabalhando no final dos anos quarenta e início dos cinquenta na publicação satírica Marc’Aurelio, e as ilustrações de Ettore Scola, elegantes, sintéticas, pareciam em desacordo com aquele barroquismo deformado que impulsionava o imaginário de Fellini. E, no entanto, ali havia duas almas gêmeas, amantes da Itália, unidos em sua repulsa a qualquer ação que significasse atividade física, como o futebol ou nadar (nenhum sabia). O trio era completado pelo roteirista Ruggero Maccari. “Com Fellini você não podia insistir”, contava nesse documentário. “Ainda assim o convenci para interpretar a si mesmo emNós que Nos Amávamos Tanto, mas me impôs uma condição: “Nunca me filmes detrás. Dá para ver minha careca.”
    Scola chegou ao cinema nos anos cinquenta e começou escrevendo roteiros assinados por outros autores, depois de ter-se licenciado em direito. Seu primeiro companheiro de aventuras cinematográficas foi, claro, Maccari. Como diretor estreou em 1964 com Fala-se de Mulheres e no ano seguinte já havia conseguido certa consideração com Por Milhão de Dólares e Os Amores de um Demônio. Sua grande década é a dos setenta: Ciúme à Italiana (rodada em Madri com Manolo Zarzo), Rocco Papaleo, Nós que nos Amávamos Tanto, Feios, Sujos e Malvados, Senhoras e Senhores, Boa Noite e seu filme mais conhecido: Um Dia Muito Especial. “No cinema é preciso tirar algo novo de cada pessoa, como em ‘Um Dia Muito Especial’, onde Sofia Loren encarnava uma mulher mal casada e entediada e Marcello Mastroianni, um jornalista homossexual [ambos eram vizinhos e o filme transcorre durante a visita de Hitler a Roma em 1938]. Interessam-me mais os diferentes do que os iguais, Eu nunca trabalhei uma vez com um ator, mas repetia muito. Porque quanto mais você os conhece, mais extrai deles. Gassman era o mais inteligente.” Mastroianni foi candidato ao Oscar por Um Dia Muito Especial, e o filme, a melhor filme de língua não inglesa, prêmio a que aspiraram trabalhos de Ettore Scola em outras quatro ocasiões.

    Nos oitenta e noventa, estabelecido como cineasta de prestígio, prosseguiu com seu olhar à história e à Itália, com personagens muito humanos e, com frequência, anônimos: O Terraço,Fosca, Paixão de Amor, Casanova e a Revolução, Macheroni, A Família, Splendor, Che ora é? (Que horas são?) Mario, María e Mario, A História de um Jovem Homem Pobre, O Jantar, e já em 2001 Concorrência Desleal. Em 2003 pareceu despedir-se com Genti di Roma, em que o napolitano sublinhava, agradecendo a seus edifícios e seus habitantes, a importância dessa cidade em sua vida e em sua carreira, onde se tornou um personagem secundário comum. Mas faltava a despedida, uma década depois, a seu amigo Federico.
    Com humor e admiração afirmava que a recordação imperecível “é uma fuga que se permite só aos grandes: Dante, Maquiavel, Leopardi, Fellini. Somente eles conseguem fugir da morte, refugiando-se na imortalidade”. Desde a noite de terça-feira, junto a essa plêiade, ri Ettore Scola.


    quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

    Alejandro González Inárritu / “Tenho uma atração pelo intenso”

    Alejandro González Inárritu


    Alejandro González Iñárritu 
    “Tenho uma atração pelo intenso”

    Cineasta mexicano pode ganhar o Oscar pelo segundo ano consecutivo com ‘O Regresso’
    Gregorio Belinchón
    Madri 17 JAN 2016 - 13:59 COT

    Os surfistas diriam que Alejandro González Iñárritu (Cidade do México, 1963) pegou a boa onda. No domingo passado, seu filme O Regresso levou três Globos de Ouro e, na quinta-feira, recebeu 12 indicações ao Oscar, tornando-se o favorito. No Brasil, este prewestern, conforme definição do diretor, baseado em fatos reais, estreia em 4 de fevereiro.

    As dificuldades da filmagem, com luz natural, em paisagens selvagens no Canadá e na Argentina, já dariam material para outro filme. Antes de começar a batalha pela estatueta de Hollywood, Iñárritu está apresentando na Europa a história de Hugh Glass, um caçador que, em 1823, é abandonado e considerado morto por seus companheiros. O cineasta mexicano conversou com o EL PAÍS na sexta-feira à tarde por telefone, de Roma. E alertou: "Estou de ressaca. Tenho um guacamole de coisas na cabeça".
    Pergunta. No Oscar do ano passado, Birdman ganhou quatro prêmios, três para você. Este ano é o favorito.
    Resposta. Faço o que posso para não ser engolido.
    P. Quando Birdman estreou, você me disse que estava cansado de pratos mexicanos apimentados, queria algo doce. Mas com O Regresso, volta ao apimentado.
    R. (Risos). Essa é a minha área. Foi um filme intenso, complicado. Mais do que fazê-lo, é um filme ao qual sobrevivi. Tenho uma atração pelo intenso e complicado, e só posso ser fiel a mim mesmo.
    P. Fez 50 anos e se definiu como "tocado pela melancolia." Já superou isso?
    R. Como comecei a pré-produção de O Regresso, não houve espaço para a melancolia. Meu pai dizia que a depressão é uma doença da burguesia. Os trabalhadores não podem chafurdar na melancolia.




    P. O que encontrou em Leonardo DiCaprio que outros atores não lhe deram?
    R. Um compromisso insistente na busca da perfeição. Compartilhamos uma insatisfação crônica, onde exigimos o máximo. É íntegro como poucos atores. Expliquei a ele com cuidado e meticulosamente como ia rodar este filme, que não é fácil, porque exigia que confiasse em mim. E assim foi, nunca perdeu a confiança em mim. É um cavalheiro. De sua arte, nem preciso falar. Bem, sim, é muito meticuloso e tem um ritmo interior extraordinário, com o qual dançava um tango com El Chivo [Emmanuel Lubezki, diretor de fotografia que acompanha Iñárritu].
    P. Onde encontrou a história de Hugh Glass?
    R. Há sete anos li um tratamento de roteiro. Não havia muito além do ataque do urso que quase o matou e o título. Fui atraído pela simplicidade e pelo primitivo da anedota. Reescrevi o roteiro com base nisso. Há cinco anos, já com DiCaprio, busquei os locais, mas foi atravessado pelo O Lobo de Wall Street e eu passei para o Birdman.
    P. Em todos seus filmes, força a reflexão sobre a transcendência e o que significa viver.
    R. Gostava de explorar a fisicalidade desses horizontes infinitos da paisagem americana e, ao mesmo tempo, ter essa respiração do protagonista em primeiro plano, queria que as pessoas experimentassem o que sente alguém que perdeu tudo. Sentia-me atraído em mostrar o silêncio na natureza e a interação do homem com a natureza. Explorar o que leva um homem a sobreviver.






    FILMOGRAFIA E PRÊMIOS


    Amores Brutos (2000). BAFTA de melhor filme estrangeiro. Uma indicação ao Oscar.
    11 de Setembro (capítulo México) (2002).
    21 Gramas (2003). Duas indicações ao Oscar.
    Babel (2006). Oscar de melhor trilha sonora e outras seis indicações.
    Biutiful (2010). Duas indicações ao Oscar.
    Birdman (Ou A Inesperada Virtude da Ignorância) (2014). Vencedor de quatro Oscar e indicado a outros cinco.
    O Regresso (2015). Vencedor de três Globos de Ouro e 12 indicações ao Oscar.

    P. É um homem que não está vivo, é quase um fantasma com ecos shakespearianos.
    R. É um anjo, um demônio, um espírito flutuante que segue a câmera. Tentei abordar a espiritualidade do personagem. Não sei se consegui. Se algo não me emociona, abandono. Na arte busco a catarse e, quando a alcanço, me liberto. Vivo uma transformação. Se não a encontro, fico solto.
    P. Quando foi a última vez que sentiu essa catarse?
    R. Nossa, não me lembro. Minha ressaca...
    PO Regresso fala de um país em construção, onde todos são imigrantes. É quase impossível não ver uma resposta a Donald Trump.
    R. No núcleo está a germinação dos Estados Unidos, que foi pouco vista no cinema. Havia franceses, canadenses, espanhóis, nós, os mexicanos, tínhamos acabado de declarar a independência de vocês [da Espanha]... E, claro, os nativos americanos. Como artista, só posso ser fiel a mim mesmo e às minhas circunstâncias. E essas são as de um mexicano que mora há 15 anos nos EUA. Sinto-me um outsider com minha pele escura. E o clima atual não é favorável aos mexicanos neste país. Por isso joguei com as raças, refleti sobre o racismo no meu filme. A pureza da raça, como diz Trump, é uma masturbação doente e inexistente: a natureza é uma orgia de misturas. Todos temos sangue de todos.
    P. Há uma espiritualidade em Glass que está em falta atualmente.
    R. Mais que espiritualidade, a compaixão. Hoje em dia alguém compassivo é classificado como fraco, ridículo.
    P. Você teria entrevistado El Chapo? Faria um filme sobre ele?
    R. Entendo Sean Penn. É ativista há 30 anos. Tem escrito muitos artigos. Tem uma grande curiosidade e é atraído por figuras polêmicas. Tem todo o direito de ir atrás do El Chapo. Escreveu uma crônica fantástica sobre como chegou até ele e, infelizmente, uma entrevista não muito bem sucedida, porque não pôde fazer perguntas. O resultado informativo é pobre; a experiência, muito rica. Julio Scherer disse: "Se o diabo me oferece uma entrevista, vou ao inferno". Eu também; outra coisa é o resultado.
    P. Pensa em fazer algum filme sem mostrar algumas pessoas voando?
    R. (Risos). Pode ser que o momento tenha chegado. Mas, quer saber de uma coisa? Ultimamente tenho sonhado muito que levitando. Acontecia também quando era menino. Embora agora em meus sonhos esteja flutuando com meu pai, que morreu há três anos, e era muito ligado a ele... Sempre com leveza, ele, que era muito gordo. Essas relações que me impactam emocionalmente e que explicam minha percepção da vida chamam a atenção o suficiente para que o sobrenatural marque meus filmes.
    EL PAÍS