Hollywood se vinga de sua jornalista mais temida
Dois filmes retratam Hedda Hopper, a cronista de fofocas que podia acabar com a carreira de um ator
Irene Crespo
Nova York
24 JAN 2016 - 18:08 COT
Helen Mirren (como Hedda Hopper) e Bryan Cranston (como Dalton Trumbo) em Trumbo. cordon press
Inspirada na atriz de cinema Ethel Barrymore, a estilosa Hedda Hopper comprou seu primeiro chapéu com um dos salários que recebeu quando começou a ajudar o pai no açougue da família. A atenção que atraiu com aquele chapéu “de ráfia verde e gerânios vermelhos” na missa de domingo de Altoona, na Pensilvânia, a fez se dar conta de duas coisas: adorava ser o centro das atenções e, por isso, “jamais voltaria a andar com a cabeça descoberta”.
Helen Mirren (como Hedda Hopper) e Bryan Cranston (como Dalton Trumbo) em Trumbo. cordon press
"Sua aparência era muito importante para ela e os chapéus eram parte do personagem que criou para si”, diz Helen Mirren, uma das duas atrizes que revive Hedda Hopper este ano, no filme Trumbo: Lista Negra – que participa do Oscar 2016 através da indicação do protagonista Bryan Cranston ao prêmio de melhor ator. Tilda Swinton o fará no filme Ave, César!, dos irmãos Coen. Ambos exageraram suas características e sua paixão pelos penteados para buscar o lado irônico de uma das mulheres mais temidas da era dourada do cinema.
Nas décadas de quarenta e cinquenta, sua coluna de fofocas em Los Angeles Times, Hedda Hopper’s Hollywood, chegou a ser lida por mais de 30 milhões de pessoas. Nelas era capaz de acabar com a carreira de um ator ou dar-lhe a glória, mas parecia ter mais prazer com a primeira possibilidade. Em 1944, só seis anos depois de começar como cronista social, Hopper já dizia que suas memórias deveriam ter como título “Malice in Wonderland”, um jogo de palavras com Alice no País das Maravilhas, que significa “Maldade no País das Maravilhas”
Nascida Elda Furry em 1885 (embora depois jurasse que tinha sido em 1890), fugiu para Nova York para se tornar atriz quando tinha apenas 22 anos. Nos palcos da Broadway, como corista, conheceu o marido, DeWolf Hopper, de quem tomou o sobrenome e por quem mudou o nome para Hedda, para se diferenciar de suas quatro mulheres anteriores – Ella, Ida, Edna e Nella. Cansada de suas infidelidades e alcoolismo, e perseguindo o sonho de ser o centro das atenções de verdade, foi para Hollywood com o filho, onde se destacou a princípio por sua aparência. Como queria. Em Virtues Wives (1918) gastou todo o salário em um vestuário tão espetacular que, como coadjuvante, eclipsou a protagonista. Assim conseguiu seu contrato na MGM e um número sem-fim de personagens como “esposa rica ou mulher aristocrática”, e quase sempre como a má. Por isso, farta desse enquadramento, aos 52 anos decidiu reinventar-se e tirar proveito de seu conhecimento de três décadas no coração de Hollywood, seu gosto para vestir-se, seu olhar e língua viperina.
Sua inimizade com a outra colunista social da época, Louella Parsons, já firme nos jornais de Hearst, foi outro motivo que a levou a se tornar alguém tão famosa como Katharine Hepburn na época. Mas, ao contrário de Parsons, Hopper usou suas crônicas para marcar sua agenda política. Nelas apontou todos os que saíssem de sua estrita moral: homossexuais, infiéis... Teve um papel muito ativo durante a Caça às Bruxas e listou todos os comunistas que conhecia, como Dalton Trumbo, o roteirista cuja vida ela quase arruinou e cuja história é contada em Trumbo. “Era uma patriota”, diz Helen Mirren. “Mas também uma mulher muito poderosa em um momento no qual as mulheres não tinham permissão para ser assim.”
Hopper não voltou a casar-se porque via o casamento como um empecilho para a carreira profissional de uma mulher. Hoje é considerada uma protofeminista e, no entanto, seu nome foi sendo esquecido na história de Hollywood pelo medo que dava só em mencioná-lo e por seu papel durante o macarthismo. “Não acredito que alguém tenha mais poder do que o que Hedda teve”, diz Mirren. Sua influência começa a refluir nos anos sessenta quando o sistema de Hollywood mudou, tal como previu O Crepúsculo dos Deuses, filme em que fez uma participação especial interpretando a si mesma. Mas Hedda Hopper resistiu e escreveu quase até sua morte em 1966, daquela mansão de Beverly Hills à qual ela mesma chamava de “a casa construída pelo medo”.
EL PAÍS
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