“A Colômbia é o país
mais promissor da América Latina”
Ruchir Sharma, responsável pelo departamento de mercados emergentes do banco de investimento Morgan Stanley, há anos analisa a evolução dos países emergentes
JOAN FAUS Washington 19 FEV 2014 - 16:01 BRT
Ruchir Sharma, responsável pelo departamento de mercados emergentes do banco de investimento Morgan Stanley, analisa há anos a evolução dos países emergentes. Em 2012, ele publicou o livro Breakout Nations, atualizado em abril passado com um novo epílogo. Nesta entrevista concedida por telefone desde Nova York, ele analisa os desafios que a América Latina enfrenta.
Pergunta. Qual a sua opinião sobre a volatilidade econômica que alguns países emergentes viveram nas últimas semanas?
Resposta. A última década foi realmente uma década excepcional para os países emergentes, fruto de uma combinação nada usual de preços de matérias primas em alta pela demanda da China, muita liquidez e um custo de capital de risco muito baixo. Os países emergentes tiveram uma década muito pobre nos anos 80 e 90, portanto havia espaço para a recuperação. E logo veio o boom da última década, mas muitos não compreenderam esse boom e pensaram que permaneceria por um longo período de tempo. Em países como o Brasil todo o foco se afastou das reformas e se centrou mais em como gastar o dinheiro. As prioridades mudaram e o que vemos agora é que o boom das matérias-primas está chegando a uma espécie de fim.
P. E como essa volatilidade afeta a América Latina, por exemplo, a instabilidade do peso argentino?
R. Não acho que estejamos às portas de outra crise nos países emergentes, o que vemos é que há mais diferenciação. Na América Latina, a última década foi realmente do Brasil, mas agora o Brasil não está acertando e há muito otimismo sobre o México em Wall Street. A Venezuela é um país esquecido. É muito difícil dizer que a Argentina seja um grande problema porque é demasiado pequena para ter peso no mundo emergente.
P. O senhor vê um enfoque muito diferente nas receitas econômicas do México e do Brasil?
R. O foco em termos da ortodoxia econômica é bem diferente. O Peru, a Colômbia e o México têm bancos centrais muito independentes, um bom sistema de pensões, assim como o Chile. Acreditam mais no livre comércio, acabam de assinar um acordo nesse sentido com a Aliança do Pacífico. Esses países têm mais tecnocratas e menos interferência política nos assuntos centrais das decisões de política econômica. A disciplina fiscal também foi melhor. No caso do Brasil, houve uma deterioração na inflação e no déficit orçamentário; e há muito mais interferência do governo no setor privado. De um ponto de vista simplista, no lado esquerdo do continente estamos vendo as boas decisões de política econômica, enquanto no direito, as más.
P. Qual país latino-americano o senhor acha que tem melhores perspectivas de futuro?
R. Para mim a Colômbia é o que tem um futuro mais brilhante. É o mais promissor na América Latina porque no México o processo também parece brilhante, mas as expectativas são muito altas e o México terá que cumpri-las. Já na Colômbia as expectativas não são tão elevadas. As perspectivas parecem melhores do lado esquerdo, o que eu chamo da nova costa do ouro da América Latina, que são essencialmente o México, o Peru e a Colômbia.
P. O que acha que o Brasil deveria ter feito para evitar que sua economia perdesse velocidade?
R. O problema é que o gasto público é muito elevado em termos de percentual do PIB. Muito desse gasto não é em infraestrutura, mas em ter uma burocracia demasiado grande ou um estado de bem estar expansivo. Todo país deve ter gasto governamental, mas no caso do Brasil o percentual é o mais elevado entre todos os emergentes do mundo. E tudo isso contribui para que tenha impostos elevados, o que torna difícil fazer negócios.
P. O senhor acha que alguns desses países ganharão peso como atores políticos internacionais?
R. Terão que se concentrar muito mais em seus esforços econômicos internos. O Chile, o Peru, o México e a Colômbia parecem mais próximos entre si, por exemplo, com a assinatura dos acordos de livre comércio; já o Brasil, a Argentina e a Venezuela estão cada vez mais isolados na região.
P. Com o desenvolvimento econômico as classes médias foram se ampliado nesses países. O senhor teme que isso possa gerar protestos como os que vimos no Brasil em 2013?
R. Pode acontecer, mas não acho que seja uma questão de classes médias e sim fruto de uma insatisfação com os líderes políticos que estão no poder há um longo tempo. Em países como o Chile ou o México houve mudanças de governo. Os países mais vulneráveis acho que são os que têm um partido político que está no governo há muito tempo e não há perspectiva de mudança.
P. O senhor alertou sobre a enorme dificuldade dos países em desenvolvimento convergirem com os avançados...
R. No caso da América Latina foi preciso o típico: preços de matérias primas elevados para um crescimento rápido. Mas as matérias primas costumam subir durante uma década e nas duas seguintes tendem a cair. A América Latina tem que impulsionar mais sua base manufatureira e reduzir sua dependência das matérias primas, mas por ora não vemos muito disso.
P. Acredita que a retirada dos estímulos da Reserva Federal dos EUA afetará negativamente os países latino-americanos?
R. Eu me surpreenderia se fosse um grande problema para os emergentes. O grande risco é o crescimento da China se desacelerar, esse país comprar menos matérias primas e os preços caírem. Esse é um risco muito maior para a América Latina.
P. E um crescimento menor da China afetaria toda a região da mesma e maneira?
R. O Brasil é um candidato de risco, mas na verdade são todos porque a maioria das exportações de quase todos os países, com exceção do México, é de matérias primas. A Colômbia está numa situação um pouco melhor porque depende mais do petróleo e o consumo chinês de petróleo não é tão elevado.
América Latina
Brasil
Os problemas do Brasil são profundos. Não vejo nenhuma mudança de rumo cedo no Brasil, há muitos assuntos por resolver, a moeda tem que se desvalorizar. Seu setor de manufatura e a produção industrial seguirão com problemas, não vejo um futuro muito brilhante para Brasil nos próximos anos em termos econômicos.
México
Tem feito reformas econômicas mas agora temos que ver que as expectativas se convertam em resultados concretos. Há muita expectativa com o novo presidente [Enrique Peña Nieto] e as reformas, mas por hora o crescimento econômico foi decepcionante. O que a gente está olhando agora é que neste ano se consiga o crescimento econômico, há uma boa oportunidade de que assim seja mas estou preocupado pelo crescente otimismo no México.
Colômbia
A situação política é muito estável, parece que há uma vontade de reeleger o [o presidente Juan Manuel] Santos e ele está muito centrado em conseguir o acordo de paz com a FARC. Tem um plano muito ambicioso de construção de infraestruturas. As possibilidades de que Colômbia seja uma nação de sucesso são bastante elevadas.
Peru
Também aparece bem mas a situação política é um pouco mais instável. Teve um alívio com [o presidente Ollanta] Humala mas persiste a incerteza de se poderia fazer algo mais populista e abandonar a ortodoxia econômica. Não acho que o faça mas o risco persiste. Além disso, Peru é bem mais vulnerável aos preços das matérias-primas que a Colômbia, que é mais dependente em petróleo.
Chile
A perspectiva do Chile não é tão boa, não porque esteja indo mau, mas porque parece que alcançou um nível de rendimentos per capita relativamente alto e é difícil saber qual será o seguinte impulso a seu crescimento. A economia chilena ainda depende largamente das matérias-primas, não têm outros setores que estejam tão bem. A investigação, o desenvolvimento e a inovação são fatores que impulsionam o crescimento e Chile não está fazendo muito nessas frentes. Apesar de o Chile ter sido um ótimo modelo para América Latina nas últimas duas décadas, não acho que esteja fazendo muito mais agora para o fazer melhor.
Nenhum comentário:
Postar um comentário