Ryan Gosling e Emma Stone, em 'La La Land' |
As chaves do sucesso esmagador de ‘La La Land’
Musical de Damien Chazelle, recordista no Globo de Ouro, tem pré-estreia nesta quinta no Brasil
GREGORIO BELINCHÓN
Madri, 9 janeiro 2017
Damien Chazelle talvez não tenha descoberto a pólvora, mas conseguiu fogos de artifício espetaculares. A pouco mais de uma semana de completar 32 anos, esse cineasta, filho de um professor francês de teoria e engenharia informática em Princeton e de uma professora de história no The College de Nova Jersey, que quando criança queria ser músico de jazz – especificamente baterista, até descobrir que seu talento não dava para tanto –, dificilmente será contrariado por algum executivo de Hollywood... como aconteceu nos últimos cinco anos. Se para algo serviu a cerimônia de premiação do Globo de Ouro (além de permitir que La La Land – Cantando Estações superasse com seus sete prêmios o recorde de troféus que pertencia a Um Estranho no Ninho, com seis) foi para transformar Chazelle em um cineasta popular, cujo rosto começa a ser identificado pelos espectadores, e para reconhecer sua persistência, forjada nas portas (fechadas) dos estúdios. Entenda algumas das chaves que justificam o sucesso esmagador do musical, que tem pré-estreia nesta quinta-feira nos cinemas do Brasil. O filme estreia oficialmente nas salas brasileiras em 19 de janeiro.
Perseverança. O roteiro de La La Land rodou pelas produtoras durante cinco anos. E, se no final foi filmado com um orçamento de 100 milhões de reais, isso se deve ao sucesso do Whiplash – Em Busca da Perfeição, numa carreira muito planejada, que Chazelle escalou disciplinadamente, um pouco ao estilo que se vê em La La Land (já em cartaz no Brasil), consumindo-se em reuniões sem sentido até que alguém, em algum momento, apostou no seu talento, inclusive para recuperar um gênero tão vilipendiado como o musical (desde Moulin Rouge – Amor em Vermelho, nenhum musical triunfou nas telas sem antes passar pela Broadway, como foi o caso de Mamma Mia!, Chicago e Os Miseráveis).
Começo e final. Em La La Land, Chazelle demonstra conhecer muito bem as chaves do gênero, e as aplica com rigor e entusiasmo. O que provoca uma reação igualmente apaixonada por parte do público. Já de saída, cumpre um mandamento fundamental do musical: uma sequência de abertura que catapulte a plateia para dentro do universo do filme, e uma sequência final que induza o espectador a sair fazendo pequenos passos de dança, e com o coração dividido em partes iguais entre a alegria e a melancolia. Chazelle recorre aos clássicos: seu trabalho evoca Os Guarda-Chuvas do Amor, O Fundo do Coração, os filmes de Stanley Donen, as grandes sequências de Busby Berkeley, Sinfonia de Paris, O Picolino, aquelas danças infinitas de Fred Astaire... Seu início, num homérico plano-sequência filmado numa das dezenas de vias expressas que circundam Los Angeles, emoldura o tempo e o lugar, para em seguida fixar os seus protagonistas. O final – bem Sinfonia de Paris – serve para brincar, para mostrar e esconder, para propor outros mundos e outros sonhos, essência do musical. E para acabar o filme lá em cima, num arrebatamento.
Dupla de protagonistas. Chazelle também contou com a sorte. Assim que lançou Guy and Madeline on a Park Bench (2009) – sua estreia em um longa, com direito a jazz e sapateado, claro, naquele que deveria ser seu trabalho de conclusão de curso na escola de cinema de Harvard, que o cineasta abandonou para concluir esse filme em preto e branco –, ele escreveu La La Land. Ninguém quis financiá-lo, então Chazelle escreveu vários roteiros para terceiros: O Último Exorcismo – Parte 2, Toque de Mestre (que acabou sendo dirigida por Eugenio Mira e protagonizada por Elijah Wood) e Rua Cloverfield, 10. E um libreto de 85 páginas intitulado Whiplash, a batalha entre um exigente professor de jazz e seu aluno de bateria (rememorando seus velhos tempos de estudante). Tampouco conseguiu produzi-lo, mas, como carta de apresentação rodou um curta, também chamado Whiplash, patrocinado por Sundance, no qual já estava J. K. Simmons dando vida ao cruel mentor. O sucesso do curta resultou na produção do longa, que de quebra também lançou o seu protagonista, Miles Teller. Chazelle é fiel àqueles que o acompanharam no seu caminho, e em La La Landapostou em Teller, ator de muito talento, mas de caráter irascível e arrogante: depois de vários choques, saiu do projeto. Por causa disso, acabaram como protagonistas Ryan Gosling e Emma Stone, no terceiro filme que estrelam juntos, após Amor a Toda Prova e Caça aos Gângsteres. Nenhum deles era a primeira opção do cineasta. Para a personagem feminina, Emma Watson chegou a assinar um contrato, que rompeu quando priorizou A Bela e a Fera – filme que Gosling, aliás, rejeitou para rodar com Chazelle. O resultado se beneficiou da química entre Gosling e Stone, uma atriz que se mudou para Los Angeles aos 15 anos e passou várias temporadas de teste em teste até encontrar seu lugar em Hollywood, num paralelismo existencial com sua personagem. Por sinal, antes de La La Land Stone estava na Broadway com Cabaret. E Gosling já foi confirmado no próximo filme de Chazelle, First Man, uma cinebiografia do astronauta Neil Armstrong.
Trilha sonora. Como apaixonado pelo jazz, Chazelle ama e compreende a música. A seu lado sempre esteve Justin Hurwitz, seu colega de alojamento em Harvard e de banda de indie pop (a Chester French), além de ser o compositor de todos os seus filmes. Hurwitz sabe criar canções pegajosas, e adora, assim como Chazelle, o cinema de Jacques Demy. La La Land é tão de Hurwitz como de Chazelle, conforme demonstram temas como Another Day of Sun, Someone in the Crowd e City of Stars. Uma curiosidade: a trilha sonora foi gravada no mesmo estúdio onde foram registradas as canções de Cantando na Chuva e O Mágico de Oz, clássicos da MGM.
Los Angeles, uma cidade para amar. La La Land é de certa forma também um sentimental canto de amor a Los Angeles, uma cidade que nos últimos tempos recebeu outras merecidas homenagens nas telas, como (500) Dias com Ela, outra comédia romântica com muita música e afim em seu espírito e cenários a La La Land. É uma Los Angeles meio fictícia, como era também em Zabriskie Point, de Antonioni, em Cavaleiro de Copas, de Malick, ou mesmo em Rebelde Sem Causa, de Ray. Há outros detalhes ocultos neste musical: Chazelle reservou um pequeno papel para Simmons, outro para sua irmã, a atriz Anna Chazelle, e faz homenagens a O Balão Vermelho, Os Guarda-Chuvas do Amor e a Casablanca. O que seria de um musical sem os acenos a seus antecessores?
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