sábado, 1 de outubro de 2022

O Caribe responde ao complicado legado da rainha Elizabeth II

Rainha Elizabeth II, durante a celebração dos seus 80 anos na Catedral de St. Paul, em Londres, Inglaterra. Foto por Michael Gwyther-Jones em Flickr, CC BY 2.0.


O Caribe responde ao complicado legado da rainha Elizabeth II



Queen Elizabeth meets the stars




 

Depois de 70 anos, a ponte de Londres caiu: a rainha Elizabeth II, a monarca que ficou mais tempo no trono britânico, faleceu em 8 de setembro em seu amado Castelo Balmoral, na Escócia, não muito depois de seus médicos revelarem que estavam “preocupados” com sua saúde. Ela tinha 96 anos.

A rainha celebrou jubileu de platina no início deste ano. Como parte das celebrações, o duque e a duquesa de Cambridge, o príncipe William e sua esposa Catherine, embarcaram em uma turnê pelo Caribe e foram recebidos com alguma resistência sobre questões remanescentes relacionadas com a colonização. Em Belize, por exemplo, a comunidade maia q'eqchi organizou protestos sobre os direitos da terra indígena, enquanto na Jamaica, as pessoas apelavam por um pedido de desculpas da família real britânica por seu papel no comércio transatlântico de escravos.

A questão das reparações também era uma das principais. Em 2015, o ex-primeiro-ministro britânico David Cameron se recusou a realizar qualquer discussão sobre reparações, aconselhando os jamaicanos a “superar a escravidão”. Em vez disso, ele prometeu construir uma nova prisão na ilha, o que apenas juntou insulto à injúria. No entanto, durante a turnê do jubileu da rainha, o príncipe William parou pouco antes de um pedido de desculpas.

Uma história tão tensa deixou muitos na região tentando alcançar um bom equilíbrio entre reconhecer uma vida dedicada ao dever e ao serviço e lutar com um legado que infligiu sua cota de dor e luta.

Em uma troca de mensagens sobre história, do grupo Museu Virtual de Trinidade e Tobago no Facebook de Angelo Bissessarsingh, os membros lembraram Elizabeth II por seu comportamento com “dignidade e graça”, que fez “muito pelo país e pela Commonwealth”, e cumpriu seus deveres de rainha “até o fim”.

Apenas dois dias antes de morrer, a rainha cumpriu o que seria seu dever constitucional final, formalmente nomeando o 15º primeiro-ministro de seu longo reinado. O trinitário Mark Edghill prestou homenagem no Facebook:

Que ela descanse em paz agora, depois de honrar seu juramento de servir por toda a vida como a Rainha do Reino Unido e da Commonwealth. Comprometida com o dever, tradição e protocolos.
Um símbolo e pilar de força e estabilidade em todo o mundo. Transcendendo décadas de mudanças culturais, desenvolvimento e avanços tecnológicos.
O verdadeiro fim de uma era!

Os governos regionais reconheceram a morte da rainha de diversas maneiras:

Hoje, a presidente de Barbados, Sua Excelência a Honorável Dama Sandra Mason, apresentou condolências, em nome do governo e do povo de Barbados, a Sua Majestade o Rei Carlos III, pelo falecimento da Soberana, Sua Majestade, a rainha.

O Banco Central de Trinidade e Tobago examinou o “profundo legado da rainha através da história da moeda de Trinidade e Tobago”, enquanto na Jamaica — onde a rainha era chefe de estado — um dia nacional de luto foi declarado para 18 de setembro, com a advertência de que nenhum evento comemorativo deveria ocorrer.

Da Guiana, o autor Ruel Johnson disse claramente:

Em 1954, dois anos depois que a rainha Elizabeth II subiu ao trono, um jovem poeta, ele próprio apenas um ano mais novo que a monarca de 27 anos, foi preso por protestar contra o domínio do Império Britânico sobre o pequeno território colonial sul-americano em que nasceu, a Guiana Inglesa. A foto [que acompanha o post de Johnson] mostra aquele poeta, Martin Carter (óculos), sendo detido junto com Cheddi Jagan que na época liderava a luta pela independência.

Esse movimento seria recebido com violência do governo da Coroa, o envio de tropas britânicas para o pequeno lugar que conhecemos hoje como Guiana.

Daquela época, Carter escreveria:
‘Este é o tempo escuro, meu amor,
Ao redor de toda a terra besouros marrons rastejam.
O sol brilhante está escondido no céu.
Flores vermelhas inclinam a cabeça em terrível tristeza.
Este é o tempo escuro, meu amor,
É a temporada de opressão, metal escuro e lágrimas.
É o festival de armas, o carnaval da miséria.
Em todos os lugares os rostos dos homens estão tensos e ansiosos.
Quem vem andando no tempo escuro da noite?
De quem é a bota de aço que desce pela relva elegante?
É o homem da morte, meu amor, o estranho invasor
Observando-a dormir e mirando no seu sonho.’
Conheça a sua história. Você foi alimentado com uma imagem cuidadosamente selecionada de xícaras de chá e bolinhos e reverências e corgis quando o que existe foi construído com sangue e injustiça.

O historiador nascido na Guiana, professor Richard Drayton, que passou grande parte de sua vida em Barbados — o mais recente território caribenho a se tornar uma república — comparou Elizabeth II com o cantor norte-americano Chuck Berry e o revolucionário cubano Fidel Castro, “três vidas que marcaram o mundo do final do século 20 de maneiras muito diferentes”:

Os três eram marcos fronteiriços de uma época em que uma ordem mundial antidemocrática e racista, aquele mundo de império e Jim Crow, de tirar o chapéu e aceitação da desigualdade de status que havia perdurado por séculos foi repentinamente virada de cabeça para baixo.

Eu nasci no que ainda era uma colônia britânica e ao longo dos meus dias de escola primária todos os livros de exercícios cobertos de azul claro tinham o retrato da sua coroação na capa. Todos nós costumávamos desenhar 👓 nela, escurecer o dente estranho para fazer um vazio de tinta na boca real e, às vezes, adicionar um bigode. Esses atos de desfiguração não foram antimonárquicos por impulso, mas certamente foram pequenos atos de rebelião contra os muitos tipos de autoridade dos quais de alguma forma sabíamos que ela era uma âncora.

Isto é o que será suprimido nesta época de emoções massivas obrigatórias, por mais benignas e bem-intencionadas que fosse E2 como uma pessoa de carne e osso, da qual nem você nem eu temos conhecimento concreto, o outro corpo da rainha, o oficial, simbolizava o direito absoluto antidemocrático derivado do status e não de contrato. Ela sobreviveu a Chuck e Fidel, mas ela era uma guardiã do passado, eles embaixadores do futuro.

Observando que “os motores de mídia do estado corporativo tentarão manipular essas emoções em massa, esta nuvem de sentimentalismo industrialmente produzido sobre o passado, para moldar o presente e controlar o futuro”, Drayton advertiu:

Contra esta feitiçaria você precisa empunhar seus encantos apotropaicos: sempre que mencionarem Liz, ou a fundirem com Fidel e Chuck, eles serão os psicopompos dela, escoltando-a para a liberdade. 😂 Liberte-a para usar farda militar, fumar charutos e caminhar para a eternidade.

O ativista LGBTQ+ trinitário, Jason Jones, que mora no Reino Unido, resumiu a avalanche de reações desta forma:


Então… um momento marcante nas nossas vidas. Perda. Ódio. Frustração. Admiração. Fogo. Estamos todos distorcidos em nossas ideias de luto e respeito.

Apesar de tudo, a trinitária-tobagense, Dionne Ligoure, afirmou:


Digam o que quiserem, ela foi DILIGENTE até o fim.

A personalidade regional de rádio, Wayne LeBlanc, observou:


A BBC vai levar agora todas as redes de transmissão para a escola, quando a cobertura do falecimento da RE 11 começar 🖤

A rainha Elizabeth II permanecerá por 24 horas na Catedral de St. Giles, em Edimburgo, onde os cidadãos poderão prestar homenagem. Seu corpo será então levado para Londres, onde ficará até o funeral, que deve ocorrer em cerca de 10 dias na Abadia de Westminster, em Londres.

[Nota do Editor (10 de setembro de 2022, 15h54 AST): uma versão anterior deste artigo referia-se a uma carta escrita por “membros da UNC”. O artigo foi alterado para remover esta referência errônea].

GLOBAL VOICES



Nenhum comentário:

Postar um comentário