Robin Williams
Um coração ferido
Robin Williams já não era visto em seu bairro, inclusive amigos perceberam indícios de depressão
O que não sabiam era da última notícia que o sacudiu: tinha mal de Parkinson
ROSA JIMÉNEZ CANO San Francisco 15 AGO 2014 - 19:01 BRT
Discrição extrema na vida real de uma figura que preenchia todo o palco e a tela. No mercado de frutas e verduras – orgânicas, é claro – de Tiburon (São Francisco), diziam que não o viam há certo tempo. A mesma resposta em frente, na farmácia. Tampouco se lembravam de alguma visita recente aos dois restaurantes mais próximos do número 95 da Saint Thomas Way, onde Robin Williams morava. Impossível consultar os bares, pois eles não existem. A tranquilidade é absoluta neste canto do cais com vista para a silhueta da cidade, só Alcatraz, com sua prisão abandonada, se interpõe. O ator quase não saía de casa, onde foi encontrado morto na segunda-feira. Os familiares, implicados em sua recuperação, e os vizinhos mantinham um pacto de silêncio para evitar que se propagasse a notícia da profunda depressão que atingia o astro norte-americano. Rick Overton, ator de comédia e amigo da família desde os anos 70, confessava ao jornal Los Angeles Times uma leve suspeita: ele quase não retornava os telefonemas e suas mensagens de texto eram cada vez mais breves.
Praticamente, as únicas saídas de Williams eram noturnas, em universos paralelos e intensos. Era um assíduo do World of Warcraft, um popular jogoon line de estratégia no qual a imaginação é um ponto a favor para os mais acostumados. Também no agressivo Call of Duty, no qual, a partir do olhar de um franco atirador, se colocava no papel das tropas que não hesitou em entreter em várias campanhas militares. Não é casualidade que sua filha se chame Zelda, nome de uma aventura gráfica que, quando ela nasceu, não era mais do que ilusão pixelizada em 8-bits.
Em 2011, o ator confessou ao jornal britânico The Telegraph que esse era um de seus vícios. “Especialmente se você joga on line, contra outros, vicia completamente e você se sente em outro mundo”. Talvez essa tenha sido a droga mais inocente das que consumia. Em 2005 soou o alarme, depois de ter perdido força nas bilheterias e também o amigo Christopher Reeve: começou a beber mais do que o recomendável. A única coisa que o acalmava era passar um tempo junto aos fogões da cozinha.
Villa Sorriso era seu refúgio de sonho, o país do nunca de um Peter Pan de carne e osso. Seria seu primeiro sacrifício. Em 2012, colocou à venda essa fazenda localizada nos vinhedos de Napa por 35 milhões de dólares (cerca de 79 milhões de reais). Um ano depois, baixou para 29 milhões de dólares, mas a propriedade nunca mudou de dono. Williams, que em 2008 se divorciou da segunda mulher, Masha Garces, se sentia incapaz de pagar a pensão. Em 1988, já havia terminado seu primeiro casamento, com Valerie Velardi.
No fim da rodagem de Quem é morto sempre aparece (2005), recorreu a especialistas. Em 2006, reconheceu seus problemas com o álcool. Não escondeu que participava de reuniões dos Alcoólicos Anônimos. Seu flerte com as drogas nos anos 70 e 80 era público, mas tampouco estranho em uma cidade como São Francisco, muito frouxa na hora de combater o consumo e a venda nas ruas. Há pouco mais de um mês, no fim de junho, viajou para Minnesota, onde esteve em um rancho especializado em reforçar a conduta daqueles que se livraram das drogas. TMZ, o portal da internet especializado em fofocas de Hollywood, caçou-o nos arredores do centro, e sua inusitada magreza desatou os rumores.
O último golpe para o ator chegou em maio, quando a série The Crazy Onesfoi retirada do ar sem possibilidade de continuidade. A audiência não assistia. Isso implicou em um buraco a mais em suas maltratadas finanças. A contragosto, acossado pelas dívidas, Williams aceitou rodar a continuação de Uma babá quase perfeita, um papel feito sob medida que lhe ajudaria a aliviar a conta corrente. O filme original, que estreou com sucesso em 1993, deixou 728 milhões de dólares nas bilheterias.
Imerso no papel que tantas risadas provocou no público, recebeu uma notícia com um roteiro bem conhecido: sofria do mal de Parkinson, uma doença neurodegenerativa que, com o tempo, leva à perda de controle sobre o próprio corpo. No caso dele, a doença estava em fase inicial. Não tinha intenção de torná-la pública. Foi sua viúva, Susan Schneider, que anunciou por meio de um comunicado difundido na quinta-feira, no qual também quis calar rumores. Seu marido estava sóbrio no momento do desenlace fatal.
Foi em um amálgama de problemas acumulados durante anos, misturados com vícios e depressões, que Robin Williams pôs fim de forma contundente e dramática no dia 11 de agosto. Não houve lugar para a comédia no papel vital do esplêndido ator cômico. Ao seu impressionante legado é preciso acrescentar três filmes que ainda não estrearam: Uma noite no museu 3,‘Merry Friggin’ Christmas e Absolutely anything.
Condolências em tempo real
Os assessores de imprensa já não enviam releases com os pêsames de seus artistas. Embora se assuma que são eles que administram seus perfis nas redes sociais, o ciberespaço se tornou o lugar preferido para mostrar a dor. Ele os aproxima do cidadão comum sem intermediários, como se fossem mais um. Esse foi o formato preferido para despedir-se de muitas personalidades. A morte de Michael Jackson foi o primeiro marco nessa modalidade que já se tornou norma. Steve Carrell ficou com os louros, mais de 64.000 retuítes por 10 escassas palavras para falar de Robin Williams: “Fez o mundo um pouquinho melhor. RIP”. O mesmo meio foi utilizado por Michael J. Fox para expressar sua comoção ao saber que os dois sofriam da mesma doença. O astronauta Buzz Aldrin optou pelo Facebook. O mesmo fez Jennifer López, com uma foto de ambos.
Do outro lado da balança estão os haters, aqueles que enviam mensagens negativas e fora de lugar nos piores momentos. Também tiveram sua cota de destaque nesta ágora de escassas leis. Tanto que Zelda Williams, a filha do ator, se viu forçada a fechar seu perfil nas redes sociais: “Sinto muito. Isso me ultrapassa. Disponho-me a apagar isso dos meus aparelhos por um longo tempo, talvez para sempre. O tempo dirá. Adeus”. Del Harvey, vice-presidente do Twitter, tentou deter a desafortunada avalanche com o fechamento de algumas contas e o compromisso de melhorar no futuro.
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