quinta-feira, 18 de abril de 2019

As obras que se perderam no fogo da Notre-Dame (e as que foram salvas graças a uma corrente humana)

Patrick Palem, especialista em restauração, segura a cabeça de uma das estátuas colocadas no telhado da Notre Dame e que foram retiradas para restauração antes do incêndio.  AFP


As obras que se perderam no fogo da Notre-Dame (e as que foram salvas graças a uma corrente humana)

As peças resgatadas, como a Coroa de Espinhos e a Túnica de São Luis, serão levadas ao Louvre. O órgão “parece estar danificado”, segundo o ministro da Cultura


ÁLEX VICENTE
Paris 16 ABR 2019 - 21:19 COT

Em que estado ficou a Notre-Dame depois do incêndio? Apesar da rápida propagação das chamas, muitas obras conseguiram sair intactas da catedral graças à ação de uma “corrente humana”, nas palavras da prefeita de Paris, Anne Hidalgo, composta por bombeiros, agentes de segurança, a equipe da Arquidiocese e técnicos do Ministério da Cultura francês. Se a estrutura do edifício pôde ser salva, sua situação ainda é “precária”, como admitiu na terça-feira o ministro da Cultura, Franck Riester, que lembrou que “três partes da abóbada estão esburacadas” e não descartou a possibilidade de um efeito dominó. “Os bombeiros estão otimistas, mas os arquitetos apelam à cautela”, concorda o reitor da Notre-Dame, Patrick Chauvet, que indicou que a presença de um andaime de 500 toneladas sobre a estrutura ainda poderia fraturar os contrafortes. “Teremos de esperar até sexta-feira para saber se o conjunto está estabilizado”, disse.
Apesar da gravidade dos fatos, a lista de objetos evacuados é considerável. A Coroa de Espinhos, peça-chave do tesouro da Notre-Dame, conseguiu ser salva do fogo. Essa venerada relíquia, conservada na Sainte-Chapelle até a Revolução Francesa, repousa na Notre-Dame desde 1806. No final do século XIX, foi colocada dentro de um tubo circular de ouro e vidro, no qual permanece até hoje. Outras peças de imenso valor, como o fragmento da Cruz do Calvário e um dos pregos que serviram para fixar Cristo, também escaparam das chamas. Além disso, a túnica de São Luis foi resgatada, gibão que o rei Luis IX vestiu em 1239 para receber essa Santa Coroa.
As chamadas beffrois, as duas torres da fachada, também ficaram a salvo, apesar de o fogo ter queimado uma parte do campanário norte. As 16 estátuas de cobre que foram colocadas na parte posterior do edifício durante sua ampliação no século XIX também escaparam das chamas, pois foram retiradas pelas autoridades em 11 de abril para serem restauradas. Além disso, o altar da catedral também estaria a salvo, segundo fotografias divulgadas nas redes sociais. A grande peça de mármore e a cruz que a preside teriam permanecido no lugar. E a monumental Piedade esculpida por Nicolas Coustou no século XVIII se mantém inteira na abside.
As três grandes rosáceas assinadas no século XIII por Pierre de Montreuil e Jean de Chelles também não teriam sofrido “danos catastróficos”, segundo o ministro da Cultura. Mesmo assim, Chauvet revelou que uma delas teria sido deslocada “um centímetro”, de modo que se encontraria em uma posição “inclinada”. Os técnicos tentam selá-la para evitar um desprendimento, segundo o reitor. Além disso, alguns vitrais do século XIX foram vítimas das altíssimas temperaturas, que derreteram o chumbo que sustenta os pedaços de vidro.
Na lista de perdas é preciso incluir a agulha de Viollet-le-Duc, que se levantava a 93 metros do solo, e o campanário situado na parte traseira da nave, assim como a grande estrutura do século XIII, conhecida como Floresta por causa da enorme quantidade de carvalho usada para construí-la. Os responsáveis pela igreja também encontraram o galo que encabeçava essa agulha –“estava um pouco abaulado”, disse Chauvet–, mas as relíquias que continha em seu interior desapareceram. Enquanto isso, o grande órgão, o maior dos três que possui a catedral, pode ter sido “danificado” pelo incêndio, de acordo com Riester, embora tenha se recusado a fazer “um diagnóstico completo” de seu estado. De fato, o reitor da catedral afirmou horas depois que o gigantesco instrumento musical, com um total de 8.000 tubos, estava “intacto”.
O fogo não atingiu as grandes pinturas dos séculos XVI e XVII, conhecidas como Mays, que pendiam das paredes da nave, do coro e das capelas. As pinturas, assinadas por renomados pintores da época, como Charles Le Brun e Jacques Blanchard, foram danificadas pela água e pela fumaça, como disse Riester, que anunciou sua transferência nesta sexta-feira para o Museu do Louvre para iniciar uma restauração imediata. O reitor Chauvet indicou que quatro desses quadros foram evacuados durante o incêndio. Os outros nove permaneceram nas capelas, onde as chamas não conseguiram entrar.

O PADRE QUE RESGATOU A COROA DE ESPINHOS

Toda tragédia tem seus heróis. A imprensa internacional encontrou um na figura do padre Jean-Marc Fournier, capelão dos bombeiros de Paris, que teria insistido em entrar na catedral para recuperar a Coroa de Espinhos e outras relíquias, de acordo com o prefeito do 15º distrito de Paris, Philippe Goujon. Fournier é um veterano de guerra que lutou com o exército francês no Afeganistão e tornou-se conhecido por ajudar as vítimas da sala Bataclan nos ataques terroristas de 2015. De acordo com a Sky News e outros meios de comunicação anglo-saxões, na segunda-feira Fournier ficou na ponta da corrente humana que conseguiu recuperar esse tesouro de valor incalculável. O ministro da Cultura indicou que os objetos resgatados serão conservados no Louvre.
EL PAÍS


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