terça-feira, 25 de junho de 2013

Desafios do tradutor / Macumba, erotismo e a melodia do português

A beleza do mundo
Sambódromo, Rio de Janeiro, 2013
Foto de Triunfo Arciniegas
Desafios do tradutor 
Macumba, erotismo e a melodia do português



Por Suzana Velasco, de Berlim

Há dez anos, Nicolai von Schweder-Schreiner leu um livro que ninguém queria traduzir. Parecia impossível verter “Cidade de Deus” (Companhia das Letras), de Paulo Lins, para o alemão.



— Também não entendi nada, mas quis fazer — conta o filho de alemães nascido em Lisboa, que fez a tradução para a Blumenbar e com Barbara Mesquita traduziu “Desde que o samba é samba” (Planeta), de Lins, que será lançado em setembro pela Droemer Knaur. — Ele escreve sobre macumba, cafetões, cenas de sexo pesadas. Também funciona em alemão, mas uma certa confusão no jeito de escrever precisa ser arrumada.
Já para Michael Kegler, quando a linguagem é sexualizada, ela tem que ser adaptada, pois “fica grosseira” em alemão. O maior desafio, diz ele, é a oralidade.



— É difícil pegar a melodia do livro. A gente fala diferente. Tive esse receio com o Luiz Ruffato, por causa das gírias, do contexto cultural. Gosto de glossário, mas optamos por não usar em “Eles eram muito cavalos”. Um nordestino em São Paulo também não tem glossário. Deixamos o espanto da pessoa que chega — diz Kegler, alfabetizado em Congonhas do Campo, onde viveu dos 4 aos 10 anos.

Para estimular a intimidade com a língua, a Fundação Biblioteca Nacional lançou este ano um programa de residência para 15 tradutores. A alemã Wanda Jakob morou sete semanas no Leme, no Rio, onde conheceu a autora cuja obra traduzia, Ana Paula Maia. Mas, mesmo sem contato direto, os tradutores costumam contar com a boa vontade dos brasileiros para explicar termos e sentidos.

— O livro da Andréa del Fuego trata de um mundo rural, é muito poético. O do Paulo Scott também é difícil. Mas o contato com os dois foi ótimo — diz Marianne Gareis, que nem sempre teve experiências positivas. — Quando tinha dúvidas, Saramago me dizia que eu entenderia quando chegasse à idade dele.

Além do contato com o autor e o próprio português, o mais importante para Maria Hummitzsch é ler muito em alemão — que, no fim das contas, é a língua em que eles escrevem:

— O tom para mim só sai no final. Quando traduzo a primeira versão penso muito na língua portuguesa. Depois preciso trabalhar como dar sentido àquela história em alemão.




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