Gay Talese
O barulho do Twitter ofusca a reportagem do ano
Gay Talese narra a história real de um ‘voyeur’ que reformou um motel para espiar os clientes
Cristina F. Pereda
Washington, 11 abr 2016
O escritor norte-americano Gay Talese descobriu, na semana passada, como é estar no meio de uma tempestade de críticas nas redes sociais. Primeiro, declarou durante uma conferência em Boston que não se lembrava de nenhuma escritora que o tivesse influenciado na juventude, no início de sua carreira. Depois, um artigo do The New York Times contava que ele perguntou a uma repórter afroamericana se iria “fazer as unhas” depois da entrevista e “quando e por que” tinha sido contratada pelo jornal.
O alvoroço durou mais de 24 horas e incluiu um comunicado da defensora do leitor do Times por ter publicado uma peça visivelmente favorável ao escritor, a correspondente avalanche de mensagens no Twitter em defesa de escritoras e jornalistas e contra a discriminação, além de iniciativas para recomendar autoras que Talese deveria ler.
Mas nenhuma dessas mensagens fazia referência à última publicação do escritor, uma reportagem ao mesmo tempo aterradora e desconcertante na revista The New Yorker que antecipa seu próximo livro. The Voyeur’s Motel [O Motel do Voyeur] conta a história de Gerald Foos, um homem que contatou Talese para contar que comprou um motel de beira de estrada no Colorado, construiu um teto falso para poder espiar os quartos e catalogou as práticas sexuais dos hóspedes durante décadas. Só duas pessoas sabiam desse ataque à privacidade: a mulher do voyeur e Talese. O escritor chegou a visitar o motel e espiar um casal junto com o proprietário.
A Internet podia ter pegado fogo nos últimos dias debatendo se Talese foi cúmplice de um delito, onde estão os limites éticos do jornalismo ou os valores de um dos jornalistas mais admirados e respeitados dos Estados Unidos. No segundo semestre, o escritor de 84 anos publicará um livro baseado na valiosa informação compartilhada por Foos, o voyeur, que também recebeu pelas diárias. Quando o conteúdo vir à luz, 36 anos depois, talvez já tenha prescrito qualquer dos crimes em que os dois possam ter incorrido.
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