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Artur Xexéo
ANNA KARENINA
De todos os filmes que chegaram a nossos cinemas na esteira do último do Oscar, poucos provocam tanto impacto no público quanto “Anna Karenina”, de Joe Wright. Não foi por acaso que ganhou o prêmio de melhor figurino do ano. Não seria injusto se levasse ainda a estatueta de melhor direção de arte, categoria a que também correria. Os figurinos, a direção de arte e a fotografia de “Anna Karenina” são mesmo deslumbrantes. Mas limitar as qualidades do filme a sua excelência técnica seria reduzir o poder de “Anna Karenina” sobre as plateias.
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“Anna Karenina” é uma experiência única. O figurino impecável, a direção de arte aplicada, a fotografia vistosa estão a serviço de uma maneira peculiar de se contar uma história. “Anna Karenina” é teatral. E não esconde esta intenção. O palco, os bastidores, a iluminação são mostrados ao espectador como numa peça de teatro. Mas limitar “Anna Karenina” a sua adesão à linguagem teatral seria reduzir ainda mais a força do filme. “Anna Karenina” é teatral mas não é teatro. O que se vê na tela não poderia ser mostrado no palco de uma sala de espetáculos. O que fica claro é que ele é filmado em estúdio, o diretor não tenta imitar a realidade, mas o teatro está a serviço do cinema. “Anna Karenina” é cinema. E ótimo cinema.
Joe Wright apostou no risco e fez um filme que ainda não tinha sido feito. O surpreendente é que isso aconteceu com um argumento mais do que conhecido. Para que filmar mais uma vez “Anna Karenina”? O IMDB, o site que é a Bíblia dos pesquisadores de cinema, contabiliza mais de 30 adaptações para o cinema do romance de Tolstoi. A primeira é de 1910. Eu, que sou cafona, me lembro de uma novela de TV: “A mulher que amou demais”, com Tonia Carrero, numa TV Rio de muitas décadas atrás. A novela nunca chegou ao fim. Tonia já me deu uma explicação: “Trouxeram um galã do México, que era lindo, mas muito canastra”. O galã em questão era Milton Rodrigues, um ator brasileiro, não muito talentoso, que conseguiu uma sobrevida artística no México. Mas ele não deve receber a culpa. A TV Rio já estava em crise e, era muito comum emissoras em crise tirarem programas do ar sem muita explicação.
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Para não fazer mais um drama de época, como as muitas versões de “Anna Karenina”, Joe Wright apostou no risco. E a inovação vem sempre do risco. Não é um filme fácil. Pode ser considerado artificial demais. O elenco atua coreograficamente. É quase uma dança. É uma maneira de deixar mais explícito o artificialismo da sociedade russa do século XIX. Quanto os personagens deixam expor sua verdade, o filme sai do estúdio. Deixa de ser teatro e finge ser cinema realista. O público pode estranhar. Afinal, o cinema nunca foi assim. E talvez não venha a ser outra vez. Por isso “Anna Karenina” merece atenção. É um filme único.
Junte a tudo isso Keira Knightley, uma Karenina que não fica a dever nada a Greta Garbo e Tonia Carrero. O diretor não foi tão feliz na escolha dos dois atores que dividem a cena com ela, Jude Law _ carismático demais para ser o marido rejeitado _ e Aaron Taylor-Johnson _ com uma aparência de mais velho do que realmente é para interpretar o jovem Conde Vronsky. Mas nada disso perturba a experiência de se aproveitar uma experiência cinematográfica realmente original.