sábado, 28 de fevereiro de 2015

Julie Maroh / O azul é uma cor quente


Julie Maroh
O azul é uma cor quente



“Eu te amo… Eu te amo passionalmente… E eu te amo pacificamente… Talvez seja isso o amor eterno, essa mistura de paz e fogo. Você acredita no amor eterno?”




“Durante duas horas nós ficamos sozinhas no mundo, e nada é mais importante para mim do que vê-la de novo. Mergulhar na imensidão azul dos olhos dela. Aninhar-me nos braços dela. Desaparecer nos beijos dela.”








“Só o amor pode salvar o mundo. 
Por que eu teria vergonha de amar?”










sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

Azul é a Cor Mais Quente / Represália contra a poesia

Azul é a cor mais quente

Represália contra a poesia



Irã proíbe a divulgação da obra da tradutora para o persa de ‘Azul é a Cor Mais Quente'

História em quadrinhos conta a história de amor de duas mulheres



Imagens da versão persa de ‘Azul é a Cor Mais Quente’, de Julie Maroh.
Sepideh Jodeyri (Ahwaz, Irã, 1976) é poeta, tradutora e censurada. Depois da revolução verde iraniana de 2009, na qual se envolveu ativamente — o movimento dos cidadãos contra as irregulares eleições presidenciais que deram a vitória a Mahmud Ahmadinejad —, deixou o país num desses êxodos forçados pelo temor que a dissidência lhe custasse caro. Agora, perde sua poesia. Ou melhor, é banida. E não porque as rimas sejam ruins, mas porque Jodeyri traduziu ao persa a história em quadrinhos O Azul é a Cor Mais Quente, uma história de amor entre duas jovens lésbicas que foi publicada em uma dezena de idiomas e adaptada ao cinema, lançado no Brasil como Azul é a Cor Mais Quente, e vencedor da Palma de Ouro, no Festival de Cannes, em 2013.

Em 28 de janeiro, Jodeyri recebeu uma ligação de seu editor em Teerã, dizendo que o evento programado para o dia seguinte para promover seu último livro de poemas, And Etc., havia sido cancelado. Quando lhe perguntou a razão, o editor recomendou que ela navegasse pelos sites da mídia conservadora. “E encontrei artigos radicais escritos contra mim. Eram especialmente críticos pelo fato de que um estabelecimento oficial (um museu) estava recebendo convidados para analisar os poemas de uma autora que tinha um histórico de apoio ao movimento LGBTQ (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais e Queer)”, afirmou Jodeyri por e-mail de Praga, onde mora com sua família.
A mídia conservadora recriminava o novo ministro da Cultura por ter permitido a publicação da obra, e exigia a suspensão do evento. Segundo Jodeyri, “o serviço de inteligência interveio de imediato e cancelou o evento; o diretor do museu foi despedido; o Ministério da Cultura questionou meu editor, e suspendeu a licença do meu livro”. A partir de agora, And Etc. não poderá ser distribuído, e ninguém mais vai se atrever a publicar outros títulos da autora. “Até a mídia reformista do Irã retirou as entrevistas que havia realizado sobre meu novo livro de poemas, e o mesmo ocorreu com as críticas literárias sobre o meu trabalho. Parece que tanto minha caneta quanto meu nome foram proibidos na minha terra”, lamenta.
Ironicamente, a represália contra Jodeyri pune a tradução de uma história em quadrinhos que nem sequer foi distribuída no Irã. A versão persa de Azul é a Cor Mais Quente foi publicada em Paris. “Mas agora sei como os fundamentalistas iranianos são vingativos. Esperaram até o momento do meu editor promover meu último livro de poemas, e então atacaram!”.
A ofensiva contra a tradutora alarmou Julie Maroh (Lens, 1985), a autora da história em quadrinhos, que divulgou o fato em seu site. “Devido à situação e a dimensão que ganhou, não há dúvida de que ela estaria presa se estivesse agora no Irã”, conta por e-mail. “É um fato terrível que faz com que as pessoas vivam com medo, e ninguém deveria aceitar viver assim.”



quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Dez erros na academia: é isso que não deixa emagrecer


Dez erros na academia: 

é isso que não deixa emagrecer

De não ter paciência com os resultados a desdenhar dos pesos. Evite esses hábitos para se desfazer dos quilos a mais


Alterne 'sprints' com ritmos mais pausados. / GETTY
Mesmo decidindo começar o curso com bons hábitos, não vamos à academia, e, mais uma vez, o tempo passou. Não apenas não perdemos os quilos que queríamos como ganhamos alguns a mais. Não há tempo a perder, de hoje não passa: visto a roupa de fitness e vou à sala dos equipamentos. Esteira, bicicleta, abdominais para uma barriga tanquinho, oblíquos para ter de volta a cintura e alguma classe de aeróbica para perder peso rápido: zumba? Spinning?... Por que não as duas? É assim que pensamos ao perceber que a roupa da temporada passada não serve mais. Não suportamos o aumento nas medidas. Esse é o primeiro erro: achar que podemos, de um dia para o outro, praticar esporte por horas a fio. Mas não é o único erro. Aqui vão as dez falhas mais comuns nas academias, as que freiam a evolução física.
1. Pagar adiantado. Cristian García, diretor técnico do centro de eletrofitness e fisioterapia BodyOn, alerta sobre o risco dos “contratos-cadeado” nas academias, que obrigam ao pagamento, comparecendo ou não, mesmo com atestado médico. “Antes de decidir se fica ou não na academia escolhida, é preciso se informar sobre o plano de treinamento que vai ser proposto, saber se vai ter o acompanhamento periódico de um treinador e as datas de avaliação. Temos que escolher um lugar próximo do nosso local de trabalho ou de casa, ou vamos querer largar na primeira oportunidade”, diz.
2. Pensar que veremos resultados surpreendentes em algumas semanas. Esse é um erro que evita o emagrecimento, porque gera frustração. Como afirma Ángel Merchán, diretor da empresa de treinamento pessoal Homewellness, há dois problemas aqui: “O primeiro é que o corpo precisa de tempo para se adaptar aos estímulos do treinamento e produzir melhoras, e o segundo é que com essa mentalidade vamos nos desmotivar rápido, ao não ver os resultados esperados, e vamos querer largar. Os efeitos são observados em três meses (serão significativos) e dependem do condicionamento físico que a pessoa já tinha”.
3. Treinar menos de dois dias por semana. Ou não ter regularidade. Aqui se trata de ter constância na forma de se exercitar. Segundo Beatriz Solís, treinadora de fitness e gerente de uma das academias femininas da rede Curves, a chave está nos bons hábitos e na regularidade. “Em nossos centros recomendamos 30 minutos, três vezes por semana. São necessárias de 10 a 12 semanas para criar o hábito e, a partir daí, mantê-lo: essa é a chave do sucesso”. Cristian García diz: "É preciso programar os dias e as horas para ir treinar, fazendo dessa atividade uma rotina sagrada”. Ángel Merchán acrescenta: “Depende de cada pessoa; o Conselho Norte-americano de Medicina Esportiva (ACSM, na sigla em inglês) recomenda no mínimo três dias por semana de exercício cardiovascular vigoroso e dois dias de força. A partir disso, cada pessoa deve adaptar a quantidade de exercício e sua intensidade ao seu nível e a suas circunstâncias pessoais. Pela minha experiência, com dois dias por semana é possível conseguir resultados, mas o ideal é chegar a 4 ou 5”.
4. Ficar apenas nos abdominais para tentar a barriga tanquinho. Não dá para achatar a barriga fazendo 100 abdominais por dia. “Exercitar uma área determinada não ajuda efetivamente a perder gordura nessa área, é o que demonstram vários estudos. Melhora o tônus e a força. Para afinar o abdômen é preciso perder gordura, e para isso é preciso fazer um treinamento focado no gasto calórico, combinado a uma alimentação adequada, que gere certo déficit calórico, ou seja, gastar mais calorias do que as que são ingeridas”, diz Ángel Merchán.
5. Comer o que o treinador pessoal manda. “Temos que manter sempre uma dieta equilibrada e variada e fazer cinco refeições por dia. Todo mundo sabe quais são os alimentos que não servem (açúcar, gordura ruim, álcool...)”, afirma Beatriz Solís. E se é substancial o peso a perder, o caminho é ir a um especialista, mas nunca deixar que um treinador prescreva a dieta. "No geral (ainda que não todos), nós instrutores esportivos temos noções de nutrição, mas não somos profissionais em algo tão delicado como isso. Pode ser contraproducente”, analisa Cristian García, que prossegue: "Aconselho cuidado com os produtos oferecidos na academia para queimar gordura, eliminar líquidos ou aumentar a massa muscular, que podem comprometer órgãos internos [consulte antes um médico]. Não troque uma refeição por um shake por muito tempo”.
6. Fugir dos pesos: “Isso é para os bombados”. Ángel Merchán explica que nos processos de perda de peso, além do treinamento cardiovascular para queimar calorias e da alimentação adequada, é preciso treinamento de força. Isso ocorre porque a melhora da massa muscular acelera o metabolismo, que se desacelera com a perda de peso e o déficit calórico. Assim, o emagrecimento se torna sustentável. “Fazer somente exercício aeróbico [esteira, correr, caminhar…] não ajuda a aumentar o metabolismo, que é o motor que queima a gordura do corpo. Um treinamento completo de força e aeróbico é o que vai permitir um corpo harmonioso”, diz Beatriz Solís.
7. Supervalorizar a força. “O peso levantado deve estar adaptado a nossa força, de modo a podermos executar o exercício da maneira tecnicamente correta. Contorcer-se no aparelho ou com os pesos só aumenta o risco de lesão, sem trazer melhor resultado”, alerta Ángel Merchán. “Um grupo muscular tem a força que tem. Quando mudamos de posição para levantar mais é porque o músculo em questão não aguenta e busca a ajuda de outros para completar o movimento. Para empinar os glúteos, exercícios como os agachamentos, o peso morto e o hip thrust (levantá-los da posição deitada) são perfeitos”, afirma.
8. Manter a mesma intensidade na bicicleta por 40 minutos.As esteiras e as bicicletas ergométricas podem ser ótimas ferramentas para treinar. O importante é o que é feito com elas. Por exemplo, como descreve Ángel Merchán, o treinamento contínuo (40 minutos na bicicleta no mesmo ritmo) tem menos eficiência para a perda de gordura que mudar de ritmo ou fazer sprints. "Se queremos ‘modelar’, fazemos exercícios de força depois do aquecimento e antes do cárdio, com uma aula coletiva como zumba ou spinning”, afirma. Nisso é preciso considerar com atenção o que diz Cristian García, da BodyOn: “Temos que escolher uma aula coletiva de acordo com nosso rendimento. Muita gente vai para o spinning sem estar fisicamente preparada para isso”.
9. Não se alongar depois do treino. “Conhecendo as lesões de longo prazo provocadas pela falta de alongamento depois do exercício, ninguém pode hesitar nem por um segundo em se alongar. É recomendado fazer alongamento mantendo por 20 segundos a posição de tensão, sem trancos. Atividades como ioga e pilates integram o trabalho de flexibilidade às rotinas e podem ser interessantes como complemento do treinamento cardiovascular e de força", indica Ángel Merchán. “Os alongamentos ajudam a aliviar a tensão muscular, melhoram a mobilidade a longo prazo e permitem à musculatura se regenerar mais rapidamente. Isso aumenta em cerca de 19% os benefícios do treinamento”, afirma Beatriz.
10. Praticar sempre a mesma rotina, e não descansar. Um erro muito comum é manter a mesma rotina de treino por excesso de tempo. Na opinião de Ángel, o corpo se adapta e para de melhorar. "Temos que variar o treino a cada 4 ou 6 semanas, no máximo. Outro erro frequente de pessoas que estão bastante em forma e treinam habitualmente é não descansar. O corpo precisa parar para assimilar o treino. Sem repousar uma ou duas vezes por semana, há o risco de supertreinar, obtendo o oposto do que se quer e piorando a condição física.”



quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Correr a vida inteira rejuvenesce



Correr a vida inteira rejuvenesce

O hábito de correr regularmente aumenta a eficiência energética do corpo entre idosos


NUÑO DOMÍNGUEZ Madri 21 NOV 2014 - 09:31 BRST




R. STOWE
Correr – o que agora se chama running e que em nossas origens paleolíticas era a diferença entre um ser humano vivo e outro morto de fome – nos mantém mais jovens. É o que revela um novo estudo que analisou o consumo de energia do corpo humano durante o exercício como se fosse uma máquina a mais. Seus resultados indicam que pessoas na casa dos 60 e 70 anos, que correram durante décadas regularmente, mantêm uma maior eficiência energética, comparável em alguns casos à de pessoas de 20 anos. No entanto, pessoas dessa mesma idade que caminham frequentemente como forma de exercício não têm um organismo tão eficiente, segundo os autores.
A pesquisa, publicada no site PLoS One, sustenta o que foi dito em muitos estudos sobre medicina e esporte: fazer exercícios aumenta a expectativa de vida, atrasa a chegada da dependência em mais de uma década e pode economizar para os sistemas públicos de saúde dezenas de bilhões de euros com remédios, hospitalizações e tratamentos.
e você correr, o risco de morte diminui oito anos comparado com o de pessoas sedentárias da mesma idade"
“Correr mantém você jovem”, diz Rodger Kram, fisiólogo da Universidade de Colorado e um dos autores do estudo. Seu trabalho analisou a eficiência energética de um grupo de pessoas atípicas, como ele mesmo reconhece. São pessoas entre 64 e 74 anos, que correm pelo menos meia hora três vezes por semana há muitos anos, inclusive décadas. São segundo, Kram, herdeiros do chamado jogging boom, uma moda que começou no final dos anos setenta nos EUA e em outros países e que multiplicou o número de corridas populares, maratonas transmitidas pela TV, anúncios de tênis e todo tipo de acessórios esportivos.
O próprio Kram corre há mais de três décadas e estuda seus efeitos sobre o corpo humano a partir do campo científico da biomecânica. Nesse estudo, comparou a eficiência energética desses corredores veteranos com a de pessoas de idade semelhante que caminham regularmente como exercício. Foi pedido que ambos os grupos caminhassem em diferentes velocidades sobre uma esteira ergométrica enquanto se observava seu nível de oxigênio. Os resultados do estudo, que analisou um total de 30 indivíduos, mostraram que os corredores mantêm uma eficiência energética comparável à de uma pessoa sedentária de 20 anos quando caminha. As pessoas que andam regularmente, por outro lado, registraram um consumo energético maior, comparável ao de pessoas sedentárias de sua idade. Os corredores eram entre 7% e 10% mais eficientes que pessoas da mesma idade que andavam.

MAIS INFORMAÇÕES

  • ‘Sexexercícios’ ou como treinar para ser melhor na cama
  • A velhice faz você se sentir melhor, mas só se viver em um país rico
  • Correr é coisa de covardes
  • Quanto tempo é preciso esperar para tomar banho depois de praticar esporte?
“Foi uma surpresa que os corredores de nosso estudo caminhassem de forma mais eficiente do que pessoas que andam regularmente como exercício”, afirmou Owen Beck, coautor da pesquisa, em um comunicado à imprensa. “A mensagem final do estudo é que correr regularmente parece atrasar o envelhecimento e permite que pessoas idosas se movimentem mais facilmente, o que melhora sua independência e qualidade de vida”, acrescenta.
A facilidade para caminhar é um indicador “fundamental” de doença e morte. “Se você caminhar menos do que 0,5 metro por segundo [1,8 quilômetros por hora] seu risco de morte aumenta três vezes”, diz Mikel Izquierdo, diretor do Departamento de Ciências da Saúde da Universidade Pública de Navarra. Izquierdo acredita que o estudo de Kram é um pouco “oportunista”, pois se aproveita do crescente interesse que existe em tudo o que é relacionado à corrida para promover benefícios que são reais, mas modestos, avalia. O lado positivo do estudo, reconhece, é que “mostra que correr melhora a economia energética, o que por sua vez facilita que as pessoas possam fazer mais exercício, e este é chave”. “Se você for fisicamente ativo, se corre, seu risco de morte diminui oito anos comparado com o de pessoas sedentárias de sua idade e, acima de tudo, diminui em 12 anos a chegada da dependência por incapacidade”, explica.
Os corredores eram entre 7% e 10% mais eficientes que pessoas da mesma idade que caminhavam"
Por isso, além de ajudar a vender tênis, meias e pulseiras inteligentes, a moda atual do running poderia ter efeitos muito positivos caso deixe de ser uma moda e passe a ser algo mais. “Se podemos manter essa massa crítica do runningspinningou qualquer outro esporte da moda, haverá pessoas que não apenas vivem mais, mas que serão independentes por muito mais tempo, e isso representa qualidade de vida, economia em remédios, serviços de saúde, atraso da demência e inclusive do Alzheimer etc.”, destaca Izquierdo.

Os ciclistas perdem eficiência

“O estudo é interessante porque mostra que o exercício atenua muito os efeitos do envelhecimento”, destaca Alejandro Lucía, professor de Fisiologia Humana e do Exercício da Universidade Europeia de Madri. Lucía é especialista em efeitos físicos do exercício em pessoas idosas e pacientes com câncer, para os quais a prática de esportes também demonstrou melhora de seu estado de saúde, diz. “Os médicos têm que aprender a prescrever exercício físico”, destaca.
À medida que se envelhece, a capacidade aeróbica vai diminuindo em todos os tipos de pessoas, inclusive nos corredores. A fadiga característica de pessoas idosas acontece porque a curva descendente de sua capacidade aeróbica e a ascendente de seu consumo de energia se encontram, obrigando-as a parar para recuperar o fôlego, afirma Kram. O que o estudo revela é que o consumo de energia em corredores regulares é mais baixo do que o das pessoas que caminham, e se mantém mesmo com o envelhecimento. Esse menor consumo energético permite realizar com menos problemas tarefas como andar.
Os autores do estudo destacam que caminhar como exercício continua sendo muito benéfico, por exemplo, para evitar doenças cardiovasculares. O problema é que a eficiência energética não está entre esses benefícios. Os pesquisadores não conseguiram descobrir por que os corredores são mais eficientes e por que essa eficiência é mantida com o passar dos anos. De fato, estudos anteriores haviam provado justamente o contrário, nesse caso estudando ciclistas e triatletas veteranos. Kram acredita que a resposta possa estar nas mitocôndrias, organelas celulares encarregadas de proporcionar energia. As pessoas que fazem exercício tendem a possuir mais mitocôndrias em suas células e essa pode ser a explicação do que foi observado, embora seja necessário conduzir mais estudos para investigar as causas, diz Kram.

Avós levantando pesos

Outros exercícios podem ser igualmente ou mais benéficos do que correr. Em um de seus estudos mais recentes, Izquierdo demonstrou que, graças a um treino de força muscular com máquinas semelhantes às de qualquer academia, pessoas na casa dos 90 anos, com mobilidade limitada e deterioração cognitiva, reduziram significativamente seu risco de quedas e melhoraram sua capacidade para se movimentar, levantar sozinhos e outras funções básicas. Esse estudo também revelava que quatro meses de exercícios de força dão a uma pessoa de 70 anos a mesma capacidade funcional de um indivíduo de 45 anos iniciante nesse tipo de treino.






terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Sete truques para emagrecer (ainda mais) com a caminhada



Sete truques para emagrecer 

(ainda mais) com a caminhada

Caminhar é muito bom, mas é preciso observar uma série de regras básicas


O que lhe vem à mente quando você pensa em perder peso? Dieta? Academia? Esforço? Sacrifício? O que quer que seja, certamente estará relacionado a uma alimentação escassa e insossa e sessões de exercício físico monótono e extenuante. Mas o caminho para o emagrecimento não precisa ser uma via crucis de privações e sofrimento. Existem outras formas que exigem menos e que oferecem resultados tão eficazes como os proporcionados pelos exercícios mais pesados. Estamos falando do power walking, ou caminhada a passo rápido, uma atividade simples e agradável que pode ser incluída em seu próximo treino.
Aqui vão sete pontos chave que o ajudarão a entrar em forma caminhando. Porque passear não vale…
1. A mais de 4,8 km/h
Se seu objetivo nas próximas semanas é acabar com os quilos a mais, a velocidade de suas sessões de power walking é essencial para o sucesso. É o que diz Ruth Cohen, personal trainer e especialista emfitness, que afirma: “O ideal é encontrar aquela velocidade que nos permita caminhar com a técnica adequada e com a qual nos sintamos confortáveis”. Mas, de que velocidade estamos falando? Segundo o Colégio Americano de Medicina do Esporte (ACSM), para um adulto saudável o aconselhável é caminhar a uma velocidade que oscile entre os 4,8 km/h e os 6,4 km/h.
2. Meça seus batimentos
Para o doutor Carlos Sánchez Juan, chefe da unidade de Endocrinologia e Nutrição do Hospital Geral Universitário de Valência, mais importante que a velocidade é a intensidade. Ou seja, o ritmo cardíaco. “Um exercício físico adequado é aquele que exige de nosso coração batimentos entre 60% e 80% da frequência cardíaca máxima", explica. Como calcular isso? Simples. Subtraia sua idade da frequência cardíaca máxima (220). Assim, se tiver 40 anos, o resultado será 180, que é o número sobre o qual se deve aplicar a porcentagem mencionada. “Só conseguiremos perder peso se caminharmos com a intensidade máxima”, ressalta o médico. Existem braceletes que monitoram os batimentos.
3. Ande pelo menos 150 minutos por semana
Tanto a personal trainer como o médico afirmam que, para obter os resultados que procuramos, é necessário distribuir pelo menos 150 minutos de atividade ao longo da semana, “sendo o ideal uma sessão diária de meia hora”, explica Cohen. O doutor Sánchez acrescenta: “A duração nunca deve ser inferior a 20 minutos”.
4. Preste atenção à técnica
Se seu objetivo é acabar com os quilos a mais, a velocidade de suas sessões de power walking é essencial
Tão importante quanto o ritmo, a intensidade e a regularidade, é o modo como se caminha. “Quantos mais músculos estiverem envolvidos no movimento, maior será o gasto calórico”, afirma apersonal trainer, que aconselha acompanhar a caminhada com um movimento de braços constante e ritmado (o braço direito balança com a perna esquerda e o esquerdo, com a direita). Agora a pergunta que todos nos fazemos é a seguinte: quantas calorias queimamos com a caminhada? Tendo em conta que o número que procuramos depende de fatores como a intensidade e a velocidade de nossas passadas, podemos nos orientar pelos dados revelados por um estudo do American College of Sports Medicine (Faculdade Americana de Medicina Esportiva), segundo o qual um homem que percorre 1.600 metros queima entre 124 e 88 calorias, enquanto uma mulher queima entre 105 e 74.
De acordo com essa pesquisa, existe uma fórmula para determinar a quantidade de calorias queimadas durante uma caminhada em um ritmo moderado de 5 km/h: 0,029 x (peso corporal em kg) x 2,2 x total de minutos praticados = quantidade aproximada de calorias queimadas.
5. Varie intensidades e exercícios
personal trainer dá outro conselho que o ajudará a reduzir o peso e que diz respeito ao tipo de caminhada. Segundo a especialista, para alcançar resultados eficazes, é importante dividir o tempo da sessão em trechos com diferentes intensidades. “O ideal é consultar um profissional que estude seu caso com base em dados concretos e estruture seu treino em função de patologias e objetivos”, diz ela. Por outro lado, o médico sugere complementar a caminhada com cinco a dez minutos de abdominais.
O ideal é encontrar aquela velocidade que nos permita caminhar com a técnica adequada e com a que nos sintamos cômodos
6. Escolha a roupa e o calçado adequados
Apesar de parecer menos relevante, o certo é que tênis adequados a seu peso, sexo, idade e tipo de pisada também contribuem para alcançar o objetivo: perder peso. “Consulte lojas especializadas que analisam sua pisada e invista o que for necessário em um bom par de tênis. Pense que são seus pneus”, aconselha Cohen, que, embora não dê tanta importância à roupa, adverte de que devemos descartar as peças concebidos para suar. “Com elas, só se perde água, e não gordura, provocando uma desidratação excessiva e prejudicial”, explica.
7. Associe prazer ao exercício: no melhor mais adequado, com música ou companhia
Sua sessão pode ser matinal, vespertina ou noturna. Para Carlos Sánchez, por ser parte de um processo de emagrecimento que, normalmente, se traduz em um esforço extra em nosso dia a dia, o ideal é que cada pessoa escolha o momento do dia que for melhor para si. Sem pressões. “Só existem duas situações que devem ser evitadas: quando fizer muito calor e logo depois de comer”, detalha. Cohen segue na mesma linha e acrescenta que não devemos cair na monotonia, por isso sugere, de vez em quando, trocar o asfalto pela natureza, passear com o cachorro, sair com amigos ou caminhar sozinhos com nossa música preferida.



Stefan Grosjena / Mulheres




Stefan Grosjean
MULHERES

Stefan Grosjean
2Stefan Grosjean
3Stefan Grosjean


4Stefan Grosjean

5Stefan Grosjean

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

domingo, 22 de fevereiro de 2015

Salinger / Quando diabos você vai crescer de uma vez?


J.D. Salinger
Quando diabos você vai crescer de uma vez?

Com Holden Caulfield milhões de pessoas se sentiram menos sozinhas: ‘O Apanhador no Campo de Centeio’ exerce um poder extraordinário

J. D. Salinger, por Sciammarella.
"Se querem mesmo ouvir o que aconteceu, a primeira coisa que vão querer saber é onde nasci, como passei a porcaria da minha infância...” Desde o começo de O Apanhador no Campo de Centeiofica claro que J. D. Salinger pretendia situar sua narrativa na modernidade. O que ele não podia saber é que, já bem entrado o século XXI, esse romance de aprendizagem iria permanecer tão cheio de vigor e atual como quando o publicou em 1951, tanto pela forma como está escrito como pelo que nos apresenta, com exceção do detalhe da ausência de celulares e demais artefatos. Dez anos antes, em uma carta uma amiga, ele dizia que estava escrevendo uma história sobre “um garoto de colégio durante as férias de Natal”.
E, de fato, é isso. Isso e muito mais, certamente porque esse garoto, Holden Caulfield, é um dos personagens mais tocantes da literatura universal, que observa e julga o que o rodeia de uma forma original, ácida, às vezes terna. Com alguns dados autobiográficos (alguns superficiais, outros, mais profundos: o Holden que despreza quase todos não será esse escritor misantropo que deixa de publicar e se asila, aumentando sua lenda?), Salinger escreveu sobre os adolescentes, sua rebeldia, sua luta por encontrar um lugar no mundo, seu medo de crescer e ao mesmo tempo seu desejo de fazê-lo. Porque Caulfield critica os adultos, falsos, hipócritas ou simplesmente imbecis, enquanto aprecia as crianças, espontâneas, inocentes, generosas. E, por isso, o que de verdade ele gostaria é de estar à beira do precipício, no final do campo de centeio, para monitorar as crianças e evitar que elas caiam. Evitar que se tornem adultos. Mas isso é impossível, e daí advém a crise de Holden.
Observador, sensível, exagerado, curioso (aonde irão no inverno os patos do Central Park?), nesses poucos dias que dura a sua aventura - quando, depois de uma briga, decide fugir após ser expulso do colégio e, assim, retardar o retorno à sua casa –, esse garoto de 16 anos que gostaria de aparentar mais para que lhe sirvam as bebidas sem perguntas e para ser levado em conta pelas mulheres, pensa no sexo, se embebeda, fuma, busca os serviços de uma prostituta, desanca a educação acadêmica, se deprime, diz palavrões e abusa dos comentários repetitivos. Isso pode explicar o fato de ainda em 1980 o livro ser o mais proibido nas escolas dos Estados Unidos. Mas o texto é inteligente, original, tem humor, é cheio de vida e sensibilidade, tem um ritmo perfeito, nunca cai nem no sentimentalismo nem na grosseria, de forma que também surpreende que, naquele mesmo ano, fosse o segundo mais recomendado.

Da derrota de Holden surge uma vitória imperecível, a de nos deixar um dos livros mais maravilhosos que pode ser lido quase com qualquer idade
Nessa divisão entre os professores que o proíbem e os que o recomendam, estes últimos têm um argumento difícil de rebater: aqueles estão se tornando o que criticam, em apanhadores no campo de centeio que não querem que seus alunos amadureçam. Carl Luce, um conhecido mais velho com quem Holden toma alguns drinques, o pressiona: "Quando finalmente você vai crescer?". E disso trata este livro, a isso assistimos ao longo de suas páginas, ao abandono definitivo da infância, à complicada passagem de uma idade para outra. Tudo, aqui, está nessa fronteira: Holden, e o próprio romance, publicado para adultos e adaptado para milhões de adolescentes e jovens. A cada ano são vendidos 250.000 exemplares. A crítica também o considera, quase que por unanimidade, como uma das maiores obras do século passado. É um desses felizes e raros casos nos quais crítica e público caminham de mãos dados ao longo de décadas.
Holden se rebela contra a educação, contra a autoridade, contra os mais velhos, contra o inevitável processo de amadurecimento, cumprindo muitas das características dos romances de iniciação. Sua rebelião está condenada à derrota, mas dela surge uma vitória imperecível, a de nos deixar um dos livros mais maravilhosos que pode ser lido com quase com qualquer idade. Esse rapaz que pede e confessa: "Toma mais uma. Por favor. Tenho uma depressão horrível. Me sinto muito sozinho, de verdade", conseguiu que milhões de pessoas se sintam menos sozinhas em algum momento de suas vidas. Esse é o poder extraordinário dos livros extraordinário. Até o final, Holden nos dá um conselho: "Não contem nunca nada a ninguém. No momento em que alguém conta qualquer coisa, começa a perder todo mundo". E acontecerá ao leitor algo semelhante ao que acontece com o narrador: quando fecha o livro, começa a perder Caulfield. Resta apenas recomendá-lo aos jovens e aos já não tão jovens, como se tivesse sido publicado ontem.
Apanhador no Campo de Centeio. J. D. Salinger.



Salinger / Cartas inéditas revelam vida privada de Salinger
Lillian Ross / Hemingway e Salinger são os maiores
Salinger / Todos os buracos negros


A doce vida de Federico Fellini / Uma grande incursão felliniana dentro de si



A doce vida de Federico Fellini

Uma grande incursão felliniana dentro de si

22 FEVEREIRO 2015,
MIRIAN NOGUEIRA TAVARES

La Dolce Vita é um rito de passagem na obra do diretor. O excesso passa a ser sua marca, o que fez muitos considerá-lo barroco. Utilizando a linguagem fragmentária tão cara a este apreciador de banda desenhada, ele constrói o filme marco de toda uma geração. Após trinta anos ainda é possível ficar atordoado com La Dolce Vita de Fellini. Um helicóptero levando Cristo de braços abertos sobrevoa a Roma de Fellini, sagrada e profana, abençoando seus vícios e virtudes. Uma cidade fascinante que transforma a vida de um provinciano de Rimini, perdido entre o amor e o desassossego. Crônica fiel de um tempo onde as pessoas já não encontram sentido para viver? Muito mais. A pergunta e o medo do diretor se infiltram em seus espectadores. Quem somos nós? O que faz sentido? Perguntas retóricas? Talvez. Mas profundamente perturbadoras e tratadas com maestria pelo mestre da dúvida.





O filme é uma grande incursão (excursão?) felliniana dentro de si. Um processo que será explicitado ao máximo em 8 1/2. Marcello - o jornalista que vaga pela Via Veneto e por uma Roma profana e sagrada - é o alter-ego do diretor que realiza assim sua viagem na mãe Roma que o acolheu. “Pois, além da dor de crescer, o homem precisa saber enfrentar a dilaceração das despedidas e caminhar com passo sereno em direção ao vasto mundo”. (Kezich, op. cit.:35). Porém La Dolce Vita é mais que uma viagem “interna” - é o instantâneo de uma sociedade perdida entre a noite e o dia em eternas madrugadas orgiásticas que, aparentemente, não tem redenção.

O crítico Walter da Silveira comparou Fellini a Goya que, “olhando o seu tempo o reteve como um triste retrato para sempre”. La Dolce Vita causou muita polêmica porque ali eram identificados traços de uma geração que possuia um desespero tão contemporâneo quanto o de Marcello. Um triste retrato para sempre, mas um retrato fiel em sua absoluta infidelidade pelo real. Até a Via Veneto teve que ser reconstruída, e, para Fellini, a do filme era a verdadeira Via Veneto.




La Dolce Vita fez com que muitos críticos reavaliassem a obra de Fellini e passassem a olhar com outros olhos seus filmes anteriores. Como diria Borges, “todo escritor cria seus próprios precursores”. Vários são os elementos que identificamos como uma constante no universo do diretor: as noites, os excessos, a presença constante da água - em forma de fonte, rio ou mar. Seus personagens ficaram tão típicos que o próprio Fellini brinca com isso em Intervista - pessoas vão procurá-lo porque se acham fellinianas.

É melhor do riso...

Fellini e Rabelais - o que pode existir em comum entre os dois? A carnavalização do mundo, transformar o real em risível - através do riso ambos reutilizam a cultura popular e trazem-nos um universo onde a separação entre vida e representação é uma linha muito tênue, às vezes, inexistente.

“Na verdade o carnaval ignora toda a distinção entre atores e espectadores”. (Bakhtin, 1987: 6). A ambiguidade é a marca do cinema felliniano, diretor e personagens acabam se misturando construindo juntos uma síntese entre cinema/real, o autor se despe e aparece em seus filmes que, por serem grandes mentiras, paradoxalmente conseguem capturar algo da realidade extra-tela. A grande ambiguidade que permeia os filmes de Fellini é entre o grotesco medieval (o que o aproxima de Rabelais) e o grotesco romântico.

Para Yuri Lotman o grande motor do cinema são as tensões[1]: tensão entre a narrativa verbal e icônica; entre o realismo e a criação de outra realidade. Em Fellini, além destas tensões “comuns”, encontro uma entre estes dois momentos do grotesco - e esta tensão está presente, mesmo apenas como potencial, movendo seus filmes.




Bakhtin consegue, via Rabelais, empreender uma viagem pela cultura popular na Idade Média e no Renascimento. Assim, contextualizarei a obra de Fellini nesta passagem entre a festa medieval e o começo da ironia romântica. A festa medieval que buscava o riso. Fellini sempre quis ser comediante - “Eu gostava muito da função de enviado especial e sentia uma forte atração pelos atores cômicos, a quem considero benfeitores da humanidade. Fazer com que as pessoas riam sempre me pareceu a mais privilegiada das vocações, meio parecida com a dos santos”. (Fellini, 1986: 31).

A (s) Festa (s)

Não existem fábulas não cruentas. Todas as fábulas nascem das profundezas do sangue e da angústia... Somente a superfície é diferente... mas o núcleo, a profundidade da nostalgia é sempre a mesma.

 

Kafka

 

O riso felliniano não é alegre e descompromissado, carnavalesco, como o riso medieval. É forte a carga de fábula em seus filmes, uma fábula cruenta que é suavizada pela imensa ternura que ele tem por seus personagens. “O italiano, que parece um desesperançado à primeira vista, nunca nega a luz no final de seus filmes. Mesmo que seja apenas um facho num estúdio vazio (como em Entrevista)”. (Nogueira in Cañizal, 1993: 151). As festas fellinianas são permeadas pela angústia e pelo riso, a angústia de “câmara” e o riso das praças, dos loucos e funâmbulos.



 

No cinema de Fellini somos introduzidos num mundo estranho, não um outro mundo, mas o nosso mesmo que se nos apresenta de modo diverso. “ Na realidade, o grotesco, inclusive o romântico, oferece a possibilidade de um mundo totalmente diferente, de uma ordem mundial distinta, de uma outra estrutura da vida”. (Bakhtin, 1987: 42). Recriar o mundo e permitir a possibilidade de um retorno ao momento orgiástico inicial, a festa absoluta.

Traçar um paralelo entre as duas formas de grotesco que eivam toda a obra felliniana só nos é possível através da comparação com os momentos destacados por Bakhtin. A festa medieval que burlava as fronteiras entre classes também está presente em La Dolce Vita. Marcello é convidado para uma festa de aristocratas onde em certo momento não é mais possível dizer quem é quem. Todos se misturam numa fantasia sem limites que se desfaz quando o dia amanhece e o sino toca chamando todos para a missa[2] .

Na cena da orgia existe também uma tentativa de apagar as diferenças de classe. Marcello começa a ofender todos os participantes, xingando-os (uma atitude tipicamente medieval). Não existe aqui o gozo da festa e, sim, a descoberta de estarem todos juntos num só desespero: o vazio.

Ao sair da orgia Marcello e seus amigos correm para a praia. Lá eles encontram pescadores tirando do mar um ser estranho, morto e disforme. “O peixe-monstro, longe do acabamento e da perfeição das formas “clássicas”, vem expor seu “inacabamento”, suas protuberâncias, sua morte. Confundindo - se com a areia, ele não nega que seja tão antigo quanto a Terra. O peixe, símbolo cristão por excelência, aparece, deformado, morto. Ele também não traz respostas para as dúvidas e incertezas de Marcello”. (Nogueira, 1993:34). Por causa de cenas com esta Fellini foi acusado de ser incapaz de aderir a uma visão positiva.

O não gozo completo deste filme é uma característica do grotesco romântico, um “grotesco de câmara, uma espécie de carnaval que o indivíduo representa na solidão, com a consciência aguda do seu isolamento”. (Bakhtin, 1987:33). Em La Dolce Vita, fugindo da carnavalização do cotidiano, o diretor vai ao encontro de si mesmo através da ironia e de uma ponte de amargura. Mas nem neste momento ele nega a luz aos seus personagens (e ao mundo). O final aponta para uma provável redenção. Ela está bem ali, mas, nem sempre, é fácil agarrá-la.

La Dolce Vita traz as praças e o riso das ruas, mas cerca Marcello de Noites intermináveis, entre festas e pessoas tão perdidas quanto ele. Todos representam cenas, que são, ao mesmo tempo, parte de suas próprias vidas. Marcello segue representando seu carnaval de “câmara”, o seu isolamento é agudizado pela presença das mulheres que apenas passam por ele. Algumas querem ficar, mas nenhuma, de facto, basta. São personagens em seu teatro de solidão - ele, no final, não consegue ouvir a menina-anjo que o chama na praia. A redenção não consegue mais contaminá-lo.

“Uma qualidade importante do riso na festa popular é que escarnece dos próprios burladores. O povo não se exclui do mundo em evolução. Também ele se sente incompleto; também ele renasce e se renova com a morte”. (Bakhtin, 1987: 10-11). Fellini participa da festa que ele promove na tela. Como poucos cineastas ele se permite desnudar e penetra no mundo que sempre em movimento e ebulição, engole a todos. Os que riem e o objeto do riso. Marcello (o Mastroianni e o da tela) é seu alter-ego, em La Dolce Vita ele não é um personagem passivo, é o narrador que costura toda a trama, que afinal, não poderá, de facto, atingi-lo.

Vários são os elementos do grotesco que podemos encontrar no espírito surrealista. A ambiguidade, a incompletude, o excesso. Um universo em processo, em mudança, num estágio constante de revolução - a revolução, que, segundo Breton, é a única capaz de criar luz. Os elementos presentes na obra de Fellini são facilmente detetados, por exemplo, na obra de Buñuel. Mas não de forma especular - as distorções do aragonês não são semelhantes as do italiano. Existem diferenças, que porém, não invalidam o diálogo.

Os mutilados de Buñuel estão presentes no peixe-monstro que jaz na areia da praia em La Dolce Vita. A blasfêmia é também a marca de um diretor sufocado pelo catolicismo espanhol. As festas em Buñuel são momentos de alteridade e de descoberta do absurdo da vida (vide a Santa Ceia de Viridiana). Temos um longo caminho a percorrer no universo dos dois diretores, mas acreditamos que o espírito surrealista que eiva sua obra é um elo indiscutível, e a presença do grotesco/carnavalização é mais uma prova de que a sensibilidade surrealista não foi traída por nenhum dos dois.

O teatro de câmara de Fellini acontece diante de nós, espectadores ávidos por imagens-signo que preencham o lugar de alguém, talvez do grande outro lacaniano, ou de todas as alteridades que nos parecem indecifráveis.

Guattari afirma que o cinema é o divã do pobre - “Pagamos um lugar no divã para nos fazermos invadir pela presença silenciosa de um outro, se possível alguém distinto, alguém que tenha um estatuto nitidamente superior ao nosso - e pagamos um lugar no cinema para nos fazermos invadir por uma qualquer pessoa, e para nos deixarmos levar numa qualquer aventura, durante encontros que, em princípio, não têm amanhã”. (1984:21). O cinema é o grande outro da contemporaneidade - ocupando um espaço na vida daqueles que se deixam invadir quando consegue instaurar a tensão entre os dois espaços tela/extra-tela. Alguns cineastas agudizam a ambiguidade deste outro que tentamos decifrar. Fellini é um deles.

Referências Bibliográficas

BAKHTIN, M.1987. A Cultura Popular na Idade Média e no Renascimento - o Contexto de François Rabelais. São Paulo, Hucitec.
CAÑIZAL, E. P. (ORG.). 1993. Um Jato na Contramão - Buñuel no México. São Paulo, Perspectiva.
ECO, U. 1989. Sobre os Espelhos. Rio de Janeiro, Nova Fronteira.
FELLINI, F. 1986. Fellini - Entrevista Sobre Cinema. Rio de janeiro, Civilização Brasileira.
GUATTARI, F. et alii.1984. Psicanálise e Cinema. Lisboa, Relógio D’Água.
KEZICH, T.1992. Fellini. Rio de Janeiro, Nova Fronteira.
LOTMAN, Y. M.1979. Estética y Semiótica del Filme. Barcelona, Gustavo Gilli.
LYOTARD, J.-F.1994. Heidegger e os Judeus. Petrópolis, Vozes.
NOGUEIRA, M. 1993. Da Crítica de Cinema. São Paulo, PUC (Dissertação de Mestrado), mimeo.
SILVEIRA, W. 1966. Fronteiras do Cinema. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro.

Notas

[1] Y. Lotman ressalta em diversas passagens de seu livro Estética y Semiótica del Cine (1989: passim), que a tensão é o motor do cinema. Tensão entre a narrativa verbal e icônica, entre o realismo e a criação de outra realidade, entre o plano e extra-plano ... Fellini utiliza o tempo inteiro as tensões que servem como motor de seus filmes , e vão pontuando as passagens entre cenas e/ou sequências. A aurora é uma personificação de tensões, representando sempre uma transição.
[2] Fellini é também o cineasta das noites. Os noturnos fellinianos alimentaram críticas ao seu respeito até hoje. “Notemos ainda uma outra particularidade do grotesco romântico: ele tem predileção pela noite ( As Rondas Noturnas de Bonaventura, os Noturnos de Hoffman), é a obscuridade e não a luz que o caracteriza”. (Bakhtin, 1987:36). La Dolce Vita é um filme noturno. Marcello vive da e para a noite, seu contato com o dia nem sempre é feliz.


WSI