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sexta-feira, 28 de outubro de 2022

Durante a Guerra Fria, intelectuais latino-americanos encontraram conforto na comunista Praga

 

O escritor brasileiro Jorge Amado e seu filho (quarto da esquerda para a direita) e o jornalista e dramaturgo tcheco Jan Drda (primeiro da esquerda para a direita), em Dobříš, castelo tcheco que serviu de residência para escritores tchecos e internacionais, em 1950. Foto do arquivo de Paloma Amado, usada sob permissão.


Durante a Guerra Fria, intelectuais latino-americanos encontraram conforto na comunista Praga

Antes da Covid-19, a cidade de Praga era visitada todos os anos por milhões de turistas em busca de cervejas baratas e arquiteturas espetaculares. Na década de 1950, por outro lado, a capital da então Tchecoslováquia atraiu uma multidão diferente de viajantes: intelectuais de esquerda de todo o mundo procurando ver como era a vida sob o regime socialista.

Muitos desses viajantes vieram da América Latina e dentre eles estavam gigantes da literatura, como Jorge Amado e Gabriel García Márquez. Há muito esquecida, esta história compartilhada vem sendo aos poucos redescoberta e reavaliada na República Tcheca. 

Com o desenrolar da Guerra Fria, tanto o Ocidente quanto a União Soviética engajaram-se em intensos esforços publicitários a fim de demonstrar a superioridade de seus sistemas políticos e socioeconômicos, de modo geral, visando ao público na Ásia, África, Oriente Médio, e América Latina. E ambos os lados enxergaram na arte uma forma eficaz de transmitir essa mensagem.   

Na União Soviética, a Sociedade para as Relações Culturais da URSS com os Países Estrangeiros, ou VOKS na sigla em russo, tinha como missão convidar intelectuais e escritores de todo o mundo para os países da União Soviética e do Bloco Oriental, sobre o qual eles foram encorajados a escrever.

Tendo ingressado no Bloco Oriental em 1948, após seu partido comunista orquestrar um golpe, a Tchecoslováquia foi um desses destinos. Além de Jorge Amado e Gabriel García Márquez, o país recebeu escritores da Argentina (Raúl González Tuñón), do Brasil (Graciliano Ramos), do Chile (Ricardo Latcham, Pablo Neruda), de Cuba (Nicolás Guillén) e do México (Efraín Huerta, Luis Suárez). Alguns viajaram sozinhos, outros faziam parte de delegações maiores.  

Sendo assim, a partir dos anos 1950, Praga tornou-se um centro cultural da esquerda, reunindo escritores emergentes e estabelecidos nessa ideologia, como o turco Nazım Hikmet e o soviético Ilya Ehrenburg.

Na realidade, Pablo Neruda pode ter herdado seu nome artístico do escritor, poeta e jornalista tcheco do século 19, Jan Neruda (o poeta chileno nasceu Ricardo Eliécer Neftalí Reyes Basoalto). Ele nunca admitiu essa suposição, contudo, fotos dele caminhando pela rua Neruda em Praga, ou posando diante de restaurantes e pubs sob o nome de “Neruda,” oferecem alguma base sólida para a especulação.

Michal Zourek, foto usada sob permissão.

A Global Voices conversou com Michal Zourek, acadêmico tcheco que enfoca os laços entre o Bloco Oriental e a América Latina. Zourek, autor do livro de 2018 “Československo očima latinskoamerických intelektuálů 1947-1959” (“Tchecoslováquia pelo olhar dos intelectuais latino-americanos de 1947 a 1959″, que também foi publicado em espanhol), explica o que motivou esses intelectuais a aceitarem tais convites:

Houve uma série de regimes autoritários na América Latina que, alegando a necessidade de suprimir forças subversivas de esquerda, reprimiram os direitos humanos de forma massiva. Essa é a razão pela qual artistas latino-americanos a favor da ideologia comunista conseguiriam apoio material e moral da Europa Oriental. A respeito dos testemunhos de suas viagens, os textos escritos nos anos de 1940 e 1950 são, em geral, cheios de entusiasmo. É claro que determinados aspectos das sociedades socialistas impressionaram bastante esses eruditos vindos de países em desenvolvimento, sobretudo, a posição da cena cultural no Leste Europeu. Há muitas referências à alta qualidade das peças teatrais, da infraestrutura das escolas e das bibliotecas públicas, e ao alto nível de escolaridade do povo.

Zourek segue explicando sobre como Praga e Moscou eram um porto seguro para que esses intelectuais fizessem contatos e se encontrassem. “Era comum de intelectuais latino-americanos encontrarem-se pela primeira vez na Europa Oriental”, disse. “Em seus países de origem não era possível, porque os governos anticomunistas e autoritários em vigor não permitiriam”.

A Europa Oriental, diz Zourek, desempenhou um papel crucial na literatura latino-americana, é possível que a lendária geração de escritores da década de 1960 não tivesse sido tão influente, se não fosse pelo movimento internacional comunista, inclusive no ocidente. “As obras de autores engajados saíram em impressões de grande formato (em tcheco, polonês ou russo), bem maiores do que as de suas línguas maternas, e tudo isso aconteceu por trás da Cortina de Ferro”, disse.

Busto de Pablo Neruda no centro de Praga. Foto de Kenyh da Wikipedia, usada sob a licença CC BY-SA  3.0.

Uma terra farta?

Ao visitarem Praga ou outros lugares da Tchecoslováquia, os intelectuais de esquerda, homens em sua maioria, eram tratados como VIPs: hospedavam-se em hotéis luxuosos, tinham as despesas pagas e acesso a guias bilíngues, recebiam honorários pela escrita, e eventualmente, tinham as obras traduzidas para o tcheco ou eslovaco.

Aqueles que receberam residência para escrever permaneceriam por longos períodos, de maneira notável no castelo de Dobříš, o reduto da união dos escritores tchecoslovacos dos anos de 1940 aos anos de 1990. Alguns permaneceram ainda por mais tempo, devido ao asilo político que obtiveram. 

Conforme explica Zourek:

Suas despesas de viagem eram pagas, e durante o programa de viagem, que foi elaborado de forma cuidadosa, receberam a proposta de observar apenas os aspectos mais ideais da vida local. Em troca, os hóspedes estrangeiros espalhariam impressões positivas via relatos de viagem, artigos e conferências. Esse fenômeno de ‘turismo político’ era o componente chave da propaganda soviética, uma estratégia bem planejada que teve início logo após a Revolução Russa de 1917. Um importante papel foi designado aos intelectuais os quais a União Soviética queria ao seu lado, a fim de usá-los mais tarde em sua luta ideológica com o Ocidente.

Jorge Amado (à esquerda) e Nicolás Guillén (à direita) em uma estação de trem da URSS, a caminho da China, janeiro de 1952. Foto do arquivo de Paloma Amado, usada sob permissão.

Uma exceção interessante nesta visão e descrição idealizada é o colombiano laureado com o Nobel da Literatura, Gabriel García Márques que visitou a Alemanha Oriental, a Tchecoslováquia, a Polônia, a Hungria e a União Soviética em 1955 e 1957. Viajou parcialmente por conta própria e, quando convidado de forma oficial, encontrou maneiras de escapar do programa oficial para averiguar por conta própria. Em seu livro, “De viaje por Europa del Este” (“Em viagem pela Europa de Leste”), suas descrições da Europa Oriental são muito mais diversificadas.

No primeiro capítulo, García Márquez descreve a Alemanha Oriental em termos nada lisonjeiros, como nesta cena em que o escritor entre em um restaurante para tomar café: “O que as pessoas tomam no café da manhã seria o equivalente a uma refeição completa no restante da Europa (Ocidental), e bem mais barato. Contudo, esses indivíduos aparentam estar destruídos e amargurados, comendo enormes porções de carne e ovos fritos sem nenhuma alegria”.

Em outro capítulo sobre Moscou, escreve sobre o tópico tabu do culto à personalidade de Stalin, citando seu guia russo que diz: “Se Stalin ainda estivesse vivo (estava morto desde 1953), teríamos um Terceiro Mundo. Stalin foi a figura mais sangrenta, mais rancorosa e mais egocêntrica da história russa”.

Gabriel García Márquez (primeiro da esquerda para a direita) na Praça Vermelha, em Moscou, em agosto de 1957. Foto do arquivo de Michal Zourek, usada sob permissão.

Para os tchecos, uma herança redescoberta

O comunismo terminou no outono de 1989 na Tchecoslováquia, e nos estados sucessores da Eslováquia e da República Tcheca, o passado socialista é, com frequência, considerado um período obscuro de violações dos direitos humanos, de restrições de viagens e de obediência forçada a Moscou.

Essa visão influencia a abordagem dos historiadores tchecos e eslovacos sobre os intelectuais de esquerda que visitaram o país durante aquele período. Segundo Zourek, que estudou na República Tcheca e Argentina, destaca:

Durante o tempo em que estudei na universidade, ouvi algumas menções a respeito da estadia de Pablo Neruda e Jorge Amado na Tchecoslováquia, mas não fazia ideia de que tratava-se de um grande fenômeno, de que ambas as regiões mantinham contato mesmo antes da Revolução Cubana, em 1959. É provável que isso tenha acontecido devido ao desprezo, pelo qual hoje esses autores são lembrados na República Tcheca e na Eslováquia: muitos os consideram idealistas ou idiotas inúteis que, ao visitarem o país, apoiaram regimes que incentivaram violências e perseguições. A questão é, sem dúvida, muito mais complexa do que isso.

Embora esses autores sejam celebrados há muito tempo em seus países de origem na América Latina, apenas agora seu legado ressurge no discurso histórico da República Tcheca. Os registros de viagens de García Márquez foi traduzido para o tcheco pela primeira vez em 2018 (“Devadesát dnů za železnou oponou“), enquanto os outros permanecem, em grande parte, desconhecidos.

Zourek compartilha sua experiência pessoal, a fim de explicar por que o processo de reavaliação é tão desafiador:

Visitei o Chile logo após o ensino médio, as universidades eram repletas de bandeiras soviéticas e retratos de Lenin, as livrarias vendiam as obras de Marx e Engels. Pensei que a ideologia estivesse morta, e não conseguia entender como alguém poderia admirar uma ideologia criminosa que impôs limites à liberdade de expressão, que impediu pessoas de entrarem nas universidades e realizarem seus sonhos. Essa posição antagônica de ambas as regiões acerca do comunismo deve-se, sobretudo, a experiências históricas bastante distintas. Por esse motivo, eu penso que, ao avaliar o comunismo, devemos nos distanciar da nossa experiência e história familiar, que muitas vezes nos impedem de enxergar esse fenômeno transnacional em toda a sua diversidade. Infelizmente, essa dissociação ainda não está ocorrendo para muitos historiadores tchecos. Não acho surpreendente que pessoas inseridas no mundo em desenvolvimento tenham mais interesse nas políticas da Tchecoslováquia comunista do que seus pares na República Tcheca. Houve alguma mudança nos últimos anos, e penso que isso se deve à gradual reavaliação do período comunista pela sociedade tcheca. Acredito que nos próximos anos veremos uma série de trabalhos mostrando como a Tchecoslováquia comunista realizou empreendimentos notáveis no mundo em desenvolvimento, os quais foram, em sua maior parte, abandonados após 1989, por exemplo na área da cultura.

GLOBAL VOICES


domingo, 3 de janeiro de 2021

Assim foi feito ‘Cem anos de solidão’

 

Gabriel García Márquez
Foto de Colita


Assim foi feito ‘Cem anos de solidão’

Álvaro Santana-Acuña, da Universidade do Texas, em Austin, onde está guardado o legado de García Márquez, publica em inglês uma reveladora biografia do romance



Juan Cruz
Tenerife, 1 Jan 2021


Álvaro Santana-Acuña nasceu em La Laguna (Tenerife) há 43 anos. Essa é provavelmente a cidade mais chuvosa das Ilhas Canárias, mas foi em Harvard, em 2007, onde associou o dilúvio a Cem Anos de Solidão, o principal romance de Gabriel García Márquez, em que chove até borboletas. Caía um dilúvio em Harvard quando ele teve que se reunir com a orientadora de sua tese e lhe veio à cabeça o imenso aguaceiro sobre Macondo, de modo que, quando a professora fez uma sugestão (Por que não trabalha em um projeto sobre como Cem Anos de Solidão se transformou em um clássico?”) não conseguiu lhe dizer que essa ideia já lhe havia ocorrido vendo chover em Harvard.

Ele recorda esse momento em uma atmosfera bem macondiana, o parque García Sanabria em Santa Cruz de Tenerife. Entrou em contato com a literatura do Nobel enquanto estudava com o professor Daniel Duque no Instituto Cabrera Pinto de La Laguna. Duque o pôs a trabalhar em Ninguém Escreve ao Coronel, e foi em uma dessas aulas que ouviu pela primeira vez o nome de Aracataca, onde se sucedem a chuva, as borboletas, as grandes árvores, as pedras pré-históricas, a fábrica de gelo e outros milagres que compõem o mundo de Macondo e de Cem Anos de Solidão. A partir daí leu esse livro cuja existência foi sua obsessão como aluno de Harvard e, agora, como professor e pesquisador em Austin (Texas), onde está guardado o imenso arquivo de Gabriel García Márquez.

Uma consequência desta obsessão com o que aconteceu em Macondo é Ascenso a la Gloria, Biografía de ‘Cien Años de Soledad’ (Ascensão à Glória, biografia de Cem Anos de Solidão) que acaba de ser lançado em inglês (Columbia University Press) e cuja versão em espanhol ele está preparando. “Fiquei fascinado com a fluência do livro, e, na minha adolescência, com as descrições da vida sexual dos personagens, dos cheiros... Na minha terra é fácil ter essa sensação de que você está naquilo que se conta em Cem Anos de Solidão.”

Álvaro Santana, escritor, no parque García Sanabria de Santa Cruz de Tenerife.

Leitores sensibilizados pelo livro

Será que todo leitor desse romance vê no livro algo que lhe diz respeito? “Esse é o grande segredo do romance e a grande dificuldade do que em literatura significa escrever. Na entrevista que concedeu a Luis Harss [autor de Los Nuestros, o primeiro estudo sobre o que acabaria sendo chamado de boom] García Márquez, que ainda não o tinha escrito, já conta que se sente capaz de escrever um romance que integrasse o sensível, o herói, as batalhas, o amor, o drama, a comédia, a tragédia, a alegria. São os elementos necessários para conseguir algo que chegue a muitos leitores... Como diz Natalia Ginzburg, nos anos 60 o romance burguês estava em crise e García Márquez inovou a partir do regresso ao passado. Como comenta Domingo Pérez Minik, Gabo propõe uma obra revolucionária porque devolve o romance à sua essência mais básica, que é narrar.”

“Ele sofre quando escreve o romance. Passou necessidade. Já havia fechado contrato com Carmen Balcells e sabia que o boom estava em andamento. Tento decifrar em meu livro o que aconteceu no verão de 1965 para que Gabo se sentasse para escrever o romance. Carmen Balcells viaja de Barcelona para a Cidade do México e se reúne com todos os editores e escritores para fechar contratos com eles. [José Manuel] Caballero Bonald lhe havia contado em 1962 que aquele jovem escritor andava por aí… É visível. Seus livros estão vendendo e ele está convencido de que aquele que o mantém sem dormir será uma porrada. E diz a Plinio Apuleyo: ‘Este é o nosso momento’. Santana-Acuña relata os estados de espírito de Gabo, sua obsessão por não perder tempo, e em junho de 1966 ele fez uma leitura no México. O jornal que noticia essa leitura na UNAM o anuncia como Gabriel García. Ele queria que “aqueles que não me conhecem digam se gostam ou não... E foi então que se convenceu de que o romance era bom”. “Fabuloso”, disse o editor da Sudamericana, Paco Porrúa. E teve início um enorme boca a boca.

Sem um dado fora de lugar, como um entomologista espetando borboletas, Santana-Acuña conta a história de sucesso do clássico do século XX. “É um livro raivosamente humano. Gabo não escreveu apenas um bom romance. Ele publicou muitos bons romances. E você tem como escolher”. Em nenhum, aliás, choveu tanto, e foi isso que ele sentiu quando decidiu fazer seu trabalho sobre a ascensão de Cem Anos de Solidão à glória enquanto chovia em Harvard como outrora chovera em Macondo. E como tantas vezes chove em La Laguna.



quinta-feira, 20 de agosto de 2020

García Márquez / “Pablo Escobar não podia distinguir entre o bem e o mal”

Gabriel García Márquez e Mercedes Barcha


García Márquez:
“Pablo Escobar não podia distinguir entre o bem e o mal”

O escritor leu para um grupo de jornalistas o rascunho de 'Notícia de um Sequestro'



ROSA MORA
Madrid, 25 jul 2019
ARQUIVO | 7 DE SETEMBRO DE 1995

“Antes de entrar no automóvel olhou por cima do ombro para ter certeza de que ninguém a seguia”. São as primeiras linhas do primeiro capítulo do novo livro de Gabriel García Márquez. Ele as leu para 12 privilegiados jovens jornalistas e poucas pessoas mais em Miraflores de la Sierra (Madri). Ali, quase em segredo, o escritor colombiano realizou um curso —“uma oficina”, corrigiu ele— de jornalismo, organizada por sua Fundación para el Nuevo Periodismo e pela Escola de Jornalismo do EL PAÍS – Universidade Autônoma de Madri. E esse livro, que não é um romance, sobre o narcotráfico na Colômbia é uma longa reportagem. Tudo que conta nele é informação cem por cento investigada e verificada durante três anos.


“Há apenas um mês esse livro tinha 700 páginas, agora tem 400”, disse. Provavelmente, terminará com 380 ou 450, depende do que eliminar ou acrescentar. A cópia que ontem mostrou é a 11ª versão que ele elabora e existirão muitas outras antes de publicar. “Eu digo para mim mesmo que sairá no Natal, sabendo que será um pouco depois”. Ainda não tem título definitivo. Pode ser Notícia de um Sequestro ou Os Longos Dias do Sequestro ou até Reportagem. De qualquer forma, será um dos livros mais esperados de 1996 e, sem dúvida, será uma aula de jornalismo e de literatura. Do livro, de jornalismo e de literatura García Márquez falou ontem com uma paixão contagiosa. Notícia de um Sequestro relata o caso de nove sequestros de jornalistas na Colômbia, ordenados pelo narcotraficante Pablo Escobar. “Sabia que não tinha saída e que a polícia ou seus rivais acabariam matando-o”. Por isso era melhor se entregar e usar esses jornalistas para pressionar o Governo e negociar suas condições de entrega. “César Gaviria [então presidente da Colômbia], com toda a dor de sua alma, não podia legislar para libertar os sequestrados”. Foi então uma negociação muito longa, durou quase um ano.

García Márquez não queria, de jeito nenhum, que Escobar aparecesse como protagonista do livro, por isso o traficante terminou como uma sombra esfumaçada. “Setecentas páginas me convenceram de que Escobar não podia distinguir entre o bem e mal”.

Já fazia tempo que o escritor queria voltar ao jornalismo. “Faz uns anos, o pão foi envenenado em uma cidade. Pensei que essa seria a reportagem perfeita, mas abri a boca e quando cheguei lá estavam todos os jornalistas da Colômbia para contar como Gabo fazia uma reportagem. Desisti”.


Longa investigação



Um tempo depois, ele se encontrou com Maruja Pachón de Villamizán, uma das sequestradas. Aí começou tudo. Fez uma longuíssima entrevista com Maruja e seu marido, Alberto Villamizán, pensando em escrever uma história. Logo se deu conta de que não podia dispensar o contexto. Investigou, entrevistou outros sequestrados sobreviventes, muita gente e foi surgindo a história. Vai entregar o livro a esses sobreviventes para que leiam antes de sua publicação. “Até para que apontem discordâncias se quiserem”.

“Foi fascinante voltar ao jornalismo e, além disso, sem um chefe de redação. Conto a rigorosa verdade, inclusive a parte mais subjetiva do que me contaram”. Esse esforço pela objetividade não oculta o estilo muito pessoal de García Márquez. “Não dá para dissimular. A voz do escritor precisa ser sempre a mesma”. García Márquez explicou ontem que articulou o livro em torno de dois mundos, o interno, o dos sequestrados pelo que tinham informação do que acontece no mundo, e o exterior, o dos familiares e amigos que ignoram tudo sobre os detidos, inclusive se estão vivos ou mortos. Dedica os artigos ímpares aos sequestrados e os pares aos que estão fora. O primeiro, esplêndido, relata o sequestro de Maruja e de Beatriz, sua cunhada.

As páginas que ontem o escritor leu já incluíam novas correções. “Faltam detalhes de interesse, embora não sejam indispensáveis. Por exemplo, falta um pouco de humor, embora eu sei que nos casos de sequestros nunca há humor”. Entre risadas explicou outra de suas manias: “Gosto que em meus livros todos os capítulos tenham o mesmo número de páginas. É um desafio e uma imbecilidade, mas eu gosto”. E com esse, está um pouco preocupado porque um capítulo é mais comprido que os outros, tem 43 páginas. Acha que poderá encontrar uma solução. Outro dos problemas que apresentou é o dos nomes. Primeiro cria o nome e depois o personagem ganha vida, cresce, explicou. E agora não conseguiu fazer isso. É uma reportagem.

“Quero convencer uma geração inteira de que a maneira mais limpa de competir é com a reportagem”, explicou a seu público entusiasmado. Nesse livro, disse, cuidou ao máximo os detalhes e não inventou nada. “Os escritores e os jornalistas ganham em credibilidade se tivermos muito cuidado com os detalhes”. Outro truque para conquistar o leitor é captar sua atenção e não deixar que ela se perca em nenhum momento. Tanto em um romance quanto em uma reportagem “o final de cada linha precisa manter o suspense para obrigá-lo a ler a seguinte”.

NA PELE DO TERROR




Gabriel García Márquez passou três anos submerso em um mundo terrível, o do narcotráfico. Não sentiu medo, disse, porque escreveu sobre uma história já passada, mas omitiu dados que poderiam ser perigosos para algumas pessoas. Enfiou-se na pele do terror e ontem transmitiu com tanta força esse sentimento que os ouvintes ficaram impressionados. Marisa Montoya, irmã do secretário da Presidência da Colômbia, foi sequestrada e assassinada. Entre ela e seus jovens sequestradores estabeleceu-se uma relação especial. Eles a chamavam de avó, ela os obrigava a rezar o terço. “Avó, prepare-se que vamos levá-la para outro lugar”, disseram um dia.

“Ela deve ter pensado que iam libertá-la. Penteou-se, pediu que a maquiassem, se arrumou, até conseguiu um pouco de perfume. Depois colocaram um capuz na cabeça dela, desses com buracos para os olhos e a boca. Colocaram-na no carro. Andaram apenas seiscentos metros, pararam e deram seis tiros nela”. E acrescentou García Márquez, com voz emocionada: “Seu irmão nunca fez nada, não moveu um dedo”. Nem sequer quis saber nada quando o escritor ofereceu-se para mostrar todo o material que tinha reunido.

Não foi o caso da mãe de Diana, outra jornalista sequestrada e que morreu por acidente depois de um cruzamento de tiros quando era transferida de lugar. “A mãe se agarrou ao presidente Gaviria, começou a persegui-lo, chegou a vê-lo quatro vezes. Disse que se sua filha morresse ele seria o responsável”.

Depois do tiroteio, Diana, gravemente ferida, foi transferida a um hospital em Cali.

Sua mãe disse a Gaviria: “Minha filha morreu e você é o responsável”. “Não morreu”, respondeu o presidente. “Morreu”, insistiu ela. “Não. Estou em contato com a polícia de Cali de forma permanente e me disseram”, rebateu. “Morreu”, repetiu. “Como sabe?”. “Porque é minha filha e é o que diz meu coração”. “Nesse momento, Diana tinha morrido”, concluiu García Márquez.

Todo mundo teria continuado escutando-o por horas.



segunda-feira, 17 de agosto de 2020

Morre Mercedes Barcha, a mulher que tornou possível o sucesso de García Márquez



Mercedes Barcha y Gabriel García Márquez


Morre Mercedes Barcha, a mulher que tornou possível o sucesso de García Márquez

A esposa do Nobel de literatura faleceu neste sábado no México, aos 87 anos


Camila Osorio
Cidade do Mexico, 16 ag 2020

Entre os milhares de lendas e imagens literárias que o Nobel Gabriel García Márquez tornou famosas em seus 87 anos de vida, uma das mais conhecidas incluía sua esposa, Mercedes Barcha. Contava que ela penhorou vários eletrodomésticos para poder enviar pelo correio o romance que tornou Gabo universal. Mercedes Barcha morreu neste sábado na Cidade do México, aos 87 anos. Foram casados por 56 anos e tiveram dois filhos, Rodrigo e Gonzalo. O marido se encarregou de tornar o nome dela famoso durante anos porque não teria conseguido se entregar em tempo integral às letras não fosse o trabalho administrativo e o cuidado que ela lhe dedicou.

No dia em que o escritor terminou o manuscrito de Cem Anos de Solidão, na década de 1960, ele e a mulher foram ao correio do México para enviá-lo à editora na Argentina que estava interessada no livro. Um funcionário do local pesou as folhas do texto e disse que a remessa custaria 83 pesos, mas Mercedes --que era a administradora da família-- falou que só tinha 45. Os dois decidiram então enviar apenas metade do manuscrito, a parte que podiam pagar, e ficar com o restante na esperança de poder mandar depois. “Então, fomos para casa e Mercedes pegou as últimas coisas que faltava penhorar”, disse Gabo. Ela empenhou o aquecedor, seu secador de cabelo, a batedeira, e assim Mercedes conseguiu enviar o resto do romance que tornaria seu marido lendário. “Agora, só falta o romance ser ruim”, lhe disse, então, com raiva. Mercedes era a primeira pessoa que lia a obra de Gabo e era a crítica que o escritor mais temia.
“Sua personalidade era única, uma mescla singular de inteligência absoluta, força de caráter, pragmatismo, curiosidade, senso de humor e hermetismo'‘, disse Jaime Abello Banfi, diretor geral da Fundação Gabo, em um comunicado de condolências. “Querida Mercedes, você foi um polo na Terra, jamais te esqueceremos. Sua recordação nos inspirará.”

Embora ela sempre se certificasse de que a vida doméstica estivesse funcionando, Mercedes Barcha também era uma devota da literatura e lia os manuscritos do marido antes de muitos amigos do Nobel. Quando Gabo estava terminando Cem Anos de Solidão, disse a certa altura que a crítica que mais o preocupava era a da companheira. “A expressão em seu rosto me garantiu que o livro estava no caminho certo”, contou Gabo.

Pouco se sabe sobre os esforços de Mercedes para escrever, embora os arquivos de Gabriel García Márquez da Universidade de Austin-Texas contenham um pequeno texto que ela escreveu aos 15 anos para um jornal de estudantes. É um elogio ao enorme rio Magdalena, na Colômbia, que nasce na cordilheira dos Andes e deságua no mar do Caribe, onde ela o chama de “um tesouro” impossível de retratar. “Considero como um átomo o que minha caneta pode escrever sobre essa longa e majestosa corrente”, disse naquele texto de 1947.


“Os pais de Mercedes eram amigos dos pais de García Márquez”, diz Gustavo Tatis, biógrafo de Márquez e autor do livro The Conjurer’s Yellow Flower. Ela tinha 9 anos e ele 12 quando se conheceram, “e García Márquez teve desde muito cedo a clarividência de que esta seria a mulher que o acompanharia durante toda a vida”. Mercedes mais tarde inspirou vários personagens de Gabo em romances como Cem anos de solidão, O outono do patriarca e O amor nos tempos do cólera, que foi dedicado a ela. “Ela era uma espécie de Úrsula Iguarán”, lembra Tatis, “uma grande mulher por trás do gênio de García Márquez”.

Jon Lee Anderson, jornalista da revista The New Yorker e amigo de Mercedes, lembra que era uma pessoa escassa, com poucas palavras, mas que falava eufemisticamente e com sabedoria. “Quando escrevi um perfil sobre Gabo em 1999, entendi que só com a aprovação dela eu conseguiria acessá-lo”, diz Anderson, que, como outros amigos de Mercedes, se lembra dela naquele papel protetor de escritora. “Quando a conheci em Bogotá e conversamos, sem que ela me dissesse, senti que havia me dado a aprovação para que eu pudesse me aproximar dele”. Os amigos de Gabo eram facilmente amigos de Mercedes também, e ela decidia quais deveriam estar mais perto e quais deveriam ser distantes. No artigo de Anderson, quando falava com Gabo sobre sua esposa, o ganhador do prêmio Nobel lhe diz que ele tinha uma teoria: que Fidel Castro, amigo do escritor, na verdade confiava mais em Mercedes do que ele.

“Ela sempre foi uma mulher muito reservada, desempenhou muito bem aquele papel de muro de contenção diante de Gabo”, lembra outro amigo próximo, o escritor nicaraguense Sergio Ramírez. Outra pessoa que conseguiu passar por esse muro foi Zheger Hay, um militante de esquerda na Colômbia que foi exilado no México nos anos 80 e conheceu Mercedes logo após sua chegada. “Ela sempre teve uma vida muito discreta, sem se exibir”, lembra Hay. Mercedes, diz sua amiga, passava os dias cuidando das casas da família em Cartagena ou na Cidade do México e era constantemente informada sobre as últimas notícias políticas, embora tivesse o cuidado de não compartilhar sua opinião publicamente. “Mercedes era uma viciada em televisão para assistir ao noticiário, ela estava muito ciente de tudo”, diz Hay. “Mas tinha um senso de discrição especial, porque sabia muito bem que Gabo era seu marido e por isso tudo que ela dizia também podia virar notícia.”

Embora calorosa com seus amigos, Mercedes decidiu que não queria ser uma figura pública que falava constantemente na mídia sobre seu marido ou sua vida familiar, e é por isso que a maior parte do que se sabe sobre ela foi através das palavras de seu marido. Mas nenhum homem de letras pode se dedicar à literatura sem uma comunidade íntima para sustentá-lo. Com a sua partida, Mercedes lembra que hoje nem Cem Anos de Solidão nem O amor nos tempos do cólera existiriam sem uma mulher como ela.

EL PAÍS




sexta-feira, 10 de julho de 2020

Gabriel García Márquez / O segredo de uma boa velhice

Gabriel García Márquez, el realismo mágico y la literatura ...

Gabriel García Márquez
O SEGREDO DE UMA BOA VELHICE


O segredo de uma boa velhice nada mais é do que um pacto honesto com a solidão.


Gabriel García Márquez
Cem Anos de Solidão

sexta-feira, 4 de outubro de 2019

Festival Gabo / O jornalismo como ferramenta essencial para a sociedade


Soledad Gallego-Díaz, Carmen Aristegui e Pedro Doria abordam, no Festival Gabo, os desafios de informar em um mundo complexo.DAVID ESTRADA LARRAÑETA

FESTIVAL GABO

O jornalismo como ferramenta essencial para a sociedade

Soledad Gallego-Díaz, Carmen Aristegui e Pedro Doria abordam, no Festival Gabo, os desafios de informar em um mundo complexo


SANTIAGO TORRADO / CATALINA OQUENDO
Medellín, 3 oct 2019


O jornalismo, com frentes abertas no mundo todo, é atualmente mais necessário do que nunca para dar sentido a uma informação fragmentada. Em tempos de crise e de grande incerteza nas democracias, narrativas profissionais que informem e integrem as sociedades se tornam indispensáveis. Esse foi o diagnóstico compartilhado nesta quarta-feira pela diretora do EL PAÍS, Soledad Gallego-Díaz, pela jornalista mexicana Carmen Aristegui e pelo brasileiro Pedro Doria, que participaram de uma mesa-redonda em Medellín (Colômbia) dentro das atividades do Festival Gabo.

sábado, 9 de março de 2019

Quando os pais de Gabo perceberam que tinham um filho mentiroso


GABRIEL GARCÍA MÁRQUEZ


Quando os pais de Gabo perceberam que tinham um filho mentiroso



JESÚS RUIZ MANTILLA
Madri 7 MAR 2019 - 13:58 COT

Gustavo Tatis percorre o universo de García Márquez e seus segredos de família, intimamente ligados à obra que a Netflix adaptará para as telas


Quando Gabito era pequeno, doña Luisa e don Gabriel se preocupavam que o menino piscasse tanto. Seu pai chegou a lhe pingar um colírio homeopático, mas de pouco serviu. Anos depois, quando aquele tique parecia desaparecido, sua mãe se atreveu a lhe perguntar: “Ele me disse que fazia assim para ver as coisas melhor”, contou ela. “Para recordar…”, observou Gabriel García Márquez a quem o trouxe ao mundo em Aracataca (Colômbia), durante uma das visitas que lhe fez Gustavo Tatis Guerra, jornalista, escritor, amigo da família e autor do livro La Flor Amarilla del Prestidigitador.
Tatis apresenta sua obra nesta quinta-feira na Casa da América de Madri, junto com Dasso Saldivar, autor do prólogo, e Juan Cruz, um dia depois de a Netflix anunciar que produzirá uma série baseada em Cem Anos de Solidão. Em suas páginas, o autor esmiúça segredos de família e chaves ocultas da obra de Gabo: todo um constante malabarismo entre realidade e invenção a serviço do autor, para criar um dos mundos literários mais ricos da literatura universal. As testemunhas de tudo aquilo, seus pais, costumavam despir o imaginário de García Márquez com um jorro de realidade que colocava a magia em seu devido lugar.




“Tinha uma capacidade de inventar além da realidade que via. Sempre disse que tinha dois cérebros. Ninguém me tira da cabeça que Gabito é bicéfalo.”
GABRIEL ELIGIO MÁRQUEZ, PAI DE GABO

Algo que, por outro lado, engrandece sua genialidade criatividade sobre bases muito firmes. “Era o maior embusteiro do mundo”, confessou donGabriel Eligio García Martínez a Tatis. “Tinha uma capacidade de inventar além da realidade que via. Sempre disse que tinha dois cérebros. Ninguém me tira da cabeça que Gabito é bicéfalo”, confessou-lhe o pai ao autor do ensaio. Também ele uniu seu ofício de telegrafista ao de escritor. “Sempre sentiu certa concorrência do filho por causa disso”, comenta Tatis.
Ao menos o pai do Nobel de Literatura de 1982 pôde comprovar sobre as obras de seu filho a escala de sua transmutação. Esse mecanismo que o levava da realidade à invenção de uma mentira, e que por sua vez refletia uma grande verdade. “Nada do que García Márquez conta em seus romances é falso, tudo foi tirado daquele mundo”, diz Tatis.
Don Gabriel leu seus livros com atenção. Não foi o caso da mãe, que se orgulhava mais de ter em casa uma filha freira que um rebento ganhador do Nobel. Dentro de seu insuperável ceticismo, tentou tirar um único proveito da honraria dada ao filho: que finalmente arrumassem o telefone da sua casa. Seu mantra foi minimizar a importância. Assim, Luisa Márquez repelia as entrevistas, entre outras coisas, porque os repórteres que compareciam à sua casa costumavam saber mais que quem devia responder.
Mas com Tatis tudo foi diferente. Tratavam-no como alguém da família, alguém que ficava por lá ouvindo histórias até a hora do jantar. Uma delas foi do germe de Remédios, a bela, personagem de Cem Anos de Solidão que se elevava ao céu.
Baseia-se, segundo a mãe, em uma criada do mesmo nome que fugiu com seu amante. Quando um dia perguntaram a dona Luisa o que tinha acontecido com ela, respondeu: “Foi embora voando”. E Gabito, presente, associou os termos até transformar a explicação em literatura. Dona Luisa se vangloriava de não ter lido o romance porque já tinha vivido tudo aquilo. Tampouco se interessou por Crônica de Uma Morte Anunciada, mas isso por uma razão diametralmente oposta: “Porque aquela eu sofri”.
As razões de Luisa talvez incomodassem seu filho. Mas, como ele havia descrito Úrsula segundo seus parâmetros, como uma mulher mais que submissa a Deus, com atitude de combate contra ele, deve ter entendido. Com as histórias que pegava no ar, García Márquez começou a construir seus métodos característicos: “A chave está em saber atarraxar as mentiras”, confessou o escritor a Tatis Guerra.
O mesmo havia ocorrido com Melquiades. Era o retrato vivo de seu avô, o coronel Nicolás Márquez, militar entre alquimista e curandeiro, aficionado a desenhar peixes coloridos em sua oficina e a fundar povoados. Melquiades tem duas bases: “Seu avô e Nostradamus”, comenta Tatis. "Contou-me isso em 1992 durante a primeira entrevista que fiz com ele", acrescenta. Conheceram-se antes que desse a volta ao mundo com seu prêmio em Estocolmo. Mas depois chegaram várias outras conversas que completaram aquele primeiro encontro. “Dei o suficiente a você para um livro”, comentou o escritor ao amigo.
Uma obra que Tatis vinha escrevendo desde que o conheceu. Agora sai publicada. Isso é La Flor Amarilla del Prestidigitador. O retrato de um homem que soube tirar partido do seu gênio natural de romancista entre o impulso poético e a precisão do jornalista. Um mentiroso eminente que ao receber a notícia de que ganhara o Nobel não teve vergonha de exclamar: “Merda, eles acreditaram!”.