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sábado, 17 de março de 2018

Stephen Hawking morre aos 76 anos

Stephen Hawking

Stephen Hawking morre aos 76 anos

O reconhecido pesquisador britânico, que popularizou a ciência, faleceu em sua casa em Cambridge


Pablo Guimón
Londres, 14 mar 2018

O físico britânico Stephen Hawking, o cientista que explicou o universo de uma cadeira de rodas e aproximou as estrelas de milhões de pessoas ao redor do mundo, faleceu nesta madrugada em sua casa de Cambridge (Inglaterra), aos 76 anos.
“Estamos profundamente entristecidos com o falecimento do nosso amado pai hoje”, dizem seus três filhos, Lucy, Robert e Tim, em nota publicada na primeira hora da manhã de quarta-feira. “Era um grande cientista e um homem extraordinário cujo trabalho e legado sobreviverão por muitos anos. Sua coragem e persistência, com seu brilho e humor, inspiraram pessoas no mundo inteiro. Certa vez disse: ‘O universo não seria grande coisa se não fosse lar das pessoas que você ama’. Sentiremos sua falta para sempre”.

Aos 22 anos, Stephen Hawking foi diagnosticado com esclerose lateral amiotrófica, ELA, e os médicos lhe deram apenas dois anos de vida. Mas viveu mais 54 anos. A doença o deixou em uma cadeira de rodas e incapaz de falar sem a ajuda de um sintetizador de voz. Reduziu o controle de seu corpo à flexão de um dedo e ao movimento dos olhos. Seu intelecto avassalador, sua intuição, sua força e seu senso de humor, combinados com uma doença destrutiva, transformaram Hawking em símbolo das infinitas possibilidades da mente humana, e de sua insaciável curiosidade.
“Apesar de haver uma nuvem sobre meu futuro, descobri, para minha surpresa, que desfrutava mais do que nunca da vida no presente”, disse Stephen Hawking em uma ocasião. “Meu objetivo é simples. É um completo conhecimento do universo, por que ele é como é e por que existe”.
Amigos e colegas da Universidade de Cambridge prestaram uma homenagem produzindo um vídeo sobre a trajetória de Stephen Hawking – referindo-se a ele como o “professor Hawking”, como era mencionado no mundo da ciência – e um texto em cujo penúltimo parágrafo se resume uma palestra do professor em seu 75º aniversário: “Foi um momento glorioso estar vivo e pesquisar sobre física teórica. Nossa imagem do Universo mudou muito nos últimos 50 anos, e estou feliz de ter feito uma pequena contribuição”.
O professor Stephen Toope, vice-reitor da Universidade de Cambridge, também o homenageou com estas palavras: “O professor Hawking foi um pessoa única que será lembrada com carinho e afeto não só em Cambridge, mas no mundo inteiro. Suas contribuições excepcionais para o conhecimento científico e a popularização da ciência e a matemática deixaram um legado indelével. Sua personagem foi uma inspiração para milhões. Ele fará falta.”
Nascido em 8 de janeiro de 1942 em Oxford (embora sua família morasse em Londres), Stephen William Hawking já se destacava no colégio do St. Albans, cidade para onde seu pai se mudou. Ali os colegas o apelidaram de “Einstein” por seu interesse pela ciência.
Hawking saltou para a fama junto a seu colega Roger Penrose no final da década de 1960. O motivo, sua teoria da singularidade do espaço-tempo. Os dois físicos aplicaram a lógica dos buracos negros ao universo inteiro, assunto que o primeiro detalharia mais tarde para o grande público em Uma Breve História do Tempo, do Big Bang aos buracos negros (1988).
A partir dos 21 anos, a doença condicionou a vida de Hawking. A ELA destruiu pouco a pouco seu corpo, sua capacidade motora, seus músculos. Primeiro deixou-o em uma cadeira de rodas e logo tirou a capacidade de falar. Além de seu brilhantismo e suas qualidades de divulgador, Hawking se transformou em uma estrela mundial por causa da obstinação com que se agarrou ao mundo. Em 1985, uma pneumonia piorou sua saúde, obrigando-o a respirar por um tubo. Nunca mais pôde usar a voz. O físico optou então por um artefato eletrônico, um sintetizador de voz, para driblar o silêncio. A voz robótica do Stephen Hawking se transformou em parte de sua lenda.
Os buracos negros marcaram sua vida. Em janeiro de 2014 apresentou um polêmico artigo defendendo que não existiam. Ao menos que não existiam da forma como eram entendidos até então. Um buraco negro é um lugar de grande densidade e energia. A teoria dizia que a partir de certo ponto, a energia – a luz – não poderia escapar de sua gravidade. Hawking argumentou que poderia sim, que não existia um horizonte de eventos, isto é, um ponto de não retorno, mas um horizonte aparente. Assim, o buraco negro conteria a energia durante algum tempo antes de deixá-la escapar.
Em entrevista concedida ao EL PAÍS em 2015, o físico se referiu à vida extraterrestre, uma de suas últimas obsessões. “Se os extraterrestres nos visitassem, o resultado se pareceria muito ao que aconteceu quando Colombo desembarcou na América: não foi bom para os nativos americanos. Esses extraterrestres avançados poderiam se tornar nômades e tentar conquistar e colonizar todos os planetas a que pudessem chegar. Para meu cérebro matemático, de números puros, pensar em vida extraterrestre é algo totalmente racional. O verdadeiro desafio é descobrir como poderiam ser esses extraterrestres.”
O diretor do Instituto de Astrofísica das Canárias (IAC), Rafael Rebolo, recorda Hawking como uma “mente brilhante presa em uma jaula”, depois de conversar com ele em suas três visitas a suas instalações. Dessa relação surgiu a ideia de nomeá-lo professor honorário do IAC, coisa que o britânico aceitou de bom grado. “Tinha grandes inquietações e sempre tentava formular perguntas sobre nosso trabalho, se encontraríamos planetas similares à Terra”, relembra Rebolo, que não se esquece da primeira pergunta que o famoso astrofísico lhe fez, se os telescópios Cherenkov que estão sendo instalados em La Palma poderiam confirmar a radiação de Hawking, chamada assim em seu nome. O IAC tinha planos de construir um edifício em suas instalações para dar um escritório a seu único professor honorário, e Rebolo insiste na ideia de levantar o edifício e dar-lhe o nome de Stephen Hawking, que dependerá do orçamento da prefeitura de Tenerife, informa Javier Salas de Tenerife.
Sua vida, tanto no âmbito profissional como no pessoal, foi um desafio aos limites. Stephen Hawking viajou por todos os continentes, incluindo a Antártida. Ganhou prêmios, entre eles o Fronteiras do Conhecimento da Fundação BBVA em 2016, mas não o Nobel. Casou-se duas vezes, foi pai de três filhos. Tornou-se uma espécie de ícone pop, que apareceu em séries como Os Simpsons e The Big Bang Theory, da qual se declarava fã. Celebrou seus aniversário de 60 anos subindo em um globo aerostático. Cinco anos depois, experimentou a gravidade zero a bordo de um Boeing 727. Quando lhe perguntaram por que fazia tudo isso, respondeu: “Quero demonstrar que as pessoas não devem se limitar por suas deficiências físicas se o seu espírito não estiver deficiente.”



segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Como é a nova cadeira do físico britânico Stephen Hawking

Stephen Hawking

Como é a nova cadeira 

do físico britânico Stephen Hawking

Um sistema desenvolvido pela Intel permite ao cientista transmitir seus pensamentos mais rápido e realizar tarefas cotidianas em um décimo do tempo

Os pesquisadores de patologias motoras terão livre acesso à plataforma

  • Um remédio para a esclerose múltipla supera os primeiros testes


Depois de três anos de trabalho, engenheiros da Intel criaram a nova cadeira de rodas conectada com a qual Hawking poderá comunicar seu gênio. / INTEL
Se não fosse a tecnologia, as ideias do cientista mais brilhante da atualidade teriam ficado encerradas em sua cabeça. Acometido de uma doença que o deixou praticamente paralisado, o físico Stephen Hawking poderá, a partir de hoje, comunicar seus pensamentos e realizar tarefas cotidianas muito mais rápido graças à nova cadeira que a Intel desenvolveu para ele. O protótipo servirá de base para uma plataforma aberta a todos os que pesquisam meios de melhorar a vida dos portadores de tetraplegias e patologias motoras de origem neurológica.
Hawking estreou sua nova cadeira em um ato celebrado na manhã de terça-feira em Londres. O físico britânico, que sofre de esclerose lateral amiotrófica (ELA) desde os tempos de faculdade, poderá agora transmitir seus pensamentos com maior rapidez e realizar algo tão simples e essencial para ele como navegar na Internet em um décimo do tempo que levava na cadeira anterior.
Tanto o equipamento velho, que Hawking usou nas últimas duas décadas para se movimentar e se comunicar, como o novo são obra de engenheiros da Intel. Mas em questões de tecnologia, o tempo, esse fenômeno que tanto interessou ao genial físico, passa depressa demais e sua cadeira de sempre ficou antiquada e incapaz de aproveitar todos os avanços alcançados nos últimos anos.

A medicina não foi capaz de me curar, por isso dependo da tecnologia para poder me comunicar e viver”, diz Stephen Hawking
Com a nova cadeira, por exemplo, o sensor que atualmente tem na bochecha é detectado por um computador infravermelho montado em seus óculos, o que permite a ele selecionar caracteres em seu computador. A integração da tecnologia de software linguístico da companhia britânica SwiftKey, um aplicativo de texto inteligente, melhorou a capacidade do sistema para aprender com o professor, predizendo seus próximos caracteres e palavras.
Durante dois anos, engenheiros do Swiftkey trabalharam em um modelo de linguagem personalizada para Hawking. Em essência o sistema é similar ao do aplicativo para celulares. Aprende com o que já foi escrito em e-mails, mensagens ou posts em redes sociais para completar as palavras. No caso do físico britânico, a aprendizagem foi feita incluindo textos que o físico não publicou.
Segundo uma nota da Intel, com esse sistema, Hawking precisa escrever menos de 20% do total de caracteres comunicados. Até agora, por exemplo, para realizar uma busca na internet, o professor Hawking precisava seguir processos árduos, como fechar sua janela de comunicação, mover o cursor para abrir o navegador, movê-lo de novo à barra de busca e, por último, escrever os termos da busca. O novo sistema automatiza todos esses passos.
“A medicina não foi capaz de me curar, por isso dependo da tecnologia para poder me comunicar e para viver”, dizia o professor Hawking em Londres já instalado em sua nova cadeira.

Hawking e a responsável pelo projeto da cadeira ACAT. Intel
A plataforma foi batizada pela Intel como ACAT (sigla em inglês de Ferramentas Auxiliares Conscientes do Contexto). O projeto foi desenvolvido em três anos por uma equipe multidisciplinar de pesquisadores da Intel Labs, com a cooperação do próprio Hawking.
“Durante décadas, o professor Hawking se valeu da tecnologia para poder comunicar-se com o mundo. Entretanto, para estabelecer uma analogia, seu antigo sistema era como tentar utilizar aplicativos e sites modernos sem teclado nem mouse”, diz Wen-Hann Wang, vice-presidente da Intel e diretor executivo da Intel Labs. “Juntos, criamos uma experiência de comunicação superior em todos os níveis, que contribui para manter o professor independente em sua vida diária e que pode chegar a aumentar a independência de outros portadores”, acrescentou.
Plataforma aberta a todos
O físico britânico é o primeiro a contar com o ACAT, mas a intenção da Intel é que a plataforma seja aberta em janeiro a todos os pesquisadores e tecnólogos que trabalham no campo da deficiência.
Mais de 3 milhões de pessoas em todo o planeta sofrem de lesões edoenças motoras de origem neurológica. Estas patologias afetam as atividades musculares voluntárias, como as capacidades de falar, andar, deglutir e realizar todo tipo de movimentos corporais.

Os engenheiros trabalharam três anos na nova cadeira de rodas
A partir do ano que vem, o software ACAT estará disponível para que os pesquisadores possam criar soluções personalizadas para interações e comunicação mediante o tato, piscadas, movimentos de sobrancelhas e outros gestos.
Embora a deficiência nem sempre tenha estado na lista de prioridades de muitas empresas de tecnologia, durante a apresentação do novo equipamento, a principal responsável pelo projeto do ACAT na Intel Labs, Lamba Nachman, recordou que “o âmbito das tecnologias para deficientes é, com frequência, um campo de testes para as tecnologias do futuro”.



domingo, 4 de outubro de 2015

Stephen Hawking diz que os buracos negros não existem

Stephen Hawking

Stephen Hawking diz que os buracos negros 

não existem

A informação sobre a matéria e a energia estaria prisioneira apenas de forma temporária, e poderia emergir depois, embora de forma caótica



O físico Stephen Hawking concede entrevista coletiva à imprensa galega no Hotel Porta do Camiño, durante sua visita a Santiago da Compostela. / ANDRES FRAGA
Stephen Hawking e os buracos negros estão indissoluvelmente ligados. Não é que ele os tenha descoberto, nada disso, mas suas pesquisas e importantes contribuições sobre esses exóticos objetos previstos teoricamente e detectados (por seus efeitos) no universo remontam a trabalhos cruciais feitos há mais de quatro décadas. Agora, porém, ele afirma que os buracos negros não existem, pelo menos não como se entendem habitualmente. Nesta semana ele apresentou um artigo, uma pré-publicação que ainda não passou pelo processo normal de revisão científica, mas que imediatamente ganhou notoriedade. Assina-o sozinho, tem quatro páginas (uma de apresentação, duas de argumentos e a última de referências) e recebeu um título estranho:Conservação da Informação e Previsão Meteorológica para os Buracos Negros. Os físicos habitualmente apresentam seus artigos no site arXiv, onde são públicos, antes de submetê-los ao processo de avaliação por pares, algo obrigatório para a sua publicação oficial.
Um buraco negro, em princípio, é algo simples: um lugar em que a matéria e a energia são tão densas que sua gravidade curva o espaço-tempo, a ponto de que nada, nem mesmo a luz, pode escapar. Mas além disso, dadas as suas condições extremas, trata-se de um campo de provas predileto dos físicos teóricos para explorarem suas conjecturas.
O ponto crítico dos buracos negros que Hawking agora ataca é o denominado “horizonte de acontecimentos”, essa fronteira a partir da qual nada pode escapar da atração gravitacional, nem a luz. “Não há saída de um buraco negro na teoria clássica, mas a teoria quântica permite que a energia e a informação escapem dele”, explicou o próprio Hawking à revista Nature, que informa em sua seção de notícias on-line sobre esse último artigo do célebre físico britânico. Para explicar todo o processo, seria necessário obter finalmente a plena integração, sob uma teoria única, da gravidade com as outras duas forças fundamentais da natureza (ou seja, a relatividade geral, que rege o universo macroscópico, e a mecânica quântica, que rege o mundo subatômico), reconhece o cientista. Mas essa fusão há muito tempo desafia os esforços dos físicos, e, por enquanto, “o tratamento correto continua sendo um mistério”, acrescenta Hawking.
Em seu novo artigo, ele propõe que não há um horizonte de acontecimentos em torno do buraco negro, e sim um horizonte aparente, que “aprisiona a matéria e a energia apenas temporariamente, antes de emiti-la de novo, embora de forma caótica”, relata Zeeya Merali na Nature. A ideia de Hawking é que os efeitos quânticos ao redor do buraco negro provocam flutuações muito violentas para que essa fronteira definida possa existir.
O horizonte de acontecimentos, consequência direta da Teoria da Relatividade de Einstein, é a superfície ao redor do buraco negro que não pode ser superada por nada que esteja apanhado dentro dele, nem sequer a luz, razão pela qual nenhuma informação poderia sair de lá. Segundo a teoria clássica, num famoso experimento teórico um astronauta que caísse em um buraco negro atravessaria o horizonte de acontecimentos sem notar nada de especial, e a partir daí ficaria inicialmente esticado como um espaguete (a enorme atração gravitacional é maior nos seus pés do que na cabeça), para então acabar completamente esmagado no núcleo imensamente denso do buraco.
Mas, há alguns anos, o físico Joseph Polchinski alterou esse cenário propondo em troca um muro de fogo: segundo a teoria quântica, o horizonte de acontecimentos é na realidade uma região de energia muito alta, em que o astronauta acabaria torrado. Isso pressupõe um desafio à relatividade, recorda Merali na Nature, já que, segundo a teoria einsteiniana, o horizonte de acontecimentos do buraco negro “deveria passar despercebido” para o astronauta em queda. A alternativa que Hawking propõe, respeitando tanto a relatividade como a teoria quântica, é que os efeitos quânticos ao redor do buraco negro provocam uma violenta flutuação do espaço-tempo, o que impede a existência de uma fronteira bem definida, descartando assim o muro de fogo.
O horizonte aparente, que a luz não consegue superar para emergir do buraco negro, prossegue Merali, e o horizonte de acontecimentos seriam idênticos em um buraco negro que não variasse. Mas, se o buraco negro vai tragando mais material, o horizonte de acontecimentos cresce e se torna maior do que o aparente. Além disso, com a famosa radiação Hawking, proposta há quatro décadas, o buraco negro pode encolher, e o horizonte de acontecimentos seria menor que o aparente. Essa variação permitiria, na teoria, que a luz escape do buraco.
O físico britânico sugere que a fronteira real é o horizonte aparente, e que “a ausência de um horizonte de acontecimentos significa que não há buracos negros […] no sentido de regimes dos quais a luz não pode jamais escapar”, embora ele não especifique como esse horizonte de acontecimentos pode desaparecer.
“A ideia de um horizonte aparente não é completamente nova”, observa Jacob Aron na New Scientist. Ele e Roger Penrose, recorda, já utilizaram a relatividade geral para demonstrar que os dois horizontes eram idênticos. Agora, “nesse último artigo seu, [Hawking] está propondo que a mecânica quântica pode revelar que eles são diferentes”. Mas essa não é a maior novidade do seu último trabalho, considera Aron, e sim “a tentativa de utilizar essas ideias para resolver a paradoxo do muro de fogo: ao eliminar o horizonte de acontecimentos, mata-se também esse muro de fogo”. E isso significa que desaparece também a consequência óbvia do mesmo, a saber, que a informação não pode emergir de maneira alguma do sumidouro negro, porque o muro de fogo a destrói.
Assim, Hawking dá uma oportunidade para que a informação escape da matéria aprisionada no buraco negro. Mas com limitações: “A estrutura de um buraco negro imediatamente por baixo do horizonte é caótica, o que dificulta a compreensão da informação que possa sair dele, em outras palavras, a informação se perde, no sentido de que seria quase impossível interpretá-la, mas não está destruída”, afirma Aron. É como a previsão meteorológica – daí o título do artigo do físico britânico –, porque “não se pode predizer o tempo senão com alguns poucos dias de antecedência”.
Don Page, especialista em buracos negros da Universidade de Alberta, no Canadá, observa na Nature que o caos da informação no buraco negro é tal que tentar interpretá-la após sua saída seria pior do que tentar reconstruir um livro queimado a partir de suas cinzas.
O breve artigo do Hawking não inclui cálculos, salienta Aron, “o que torna difícil tirar conclusões sólidas”. A nova ideia será estudada e discutida, e inclusive pode ser que o físico britânico faça alguma nova aposta com seus colegas, como já fez no passado – e às vezes perdeu –a respeito de questões profundas da física teórica. O que está claro é que nem a gravíssima incapacidade física da qual sofre nem seus 72 anos recém-completados comprometem a mente desse grande cientista.

‘Minha breve história´

Com uma clara alusão ao seu famoso livro de física Uma Breve História do Tempo: do Big Bang aos Buracos Negros (1988), Stephen Hawking escreveu recentemente sua autobiografia com o título de Minha Breve História (Editora Intrínseca). O livro reúne suas recordações da infância na Londres do pós-guerra, seus estudos, seu trabalho e sua evolução intelectual, tudo isso salpicado de fotografias inéditas ou pouco conhecidas desse homem que não se rende nunca.
Ele acaba de completar 72 anos e continua trabalhando em sua adorada física teórica. Ocupou, até 2009, a cátedra Lucasiana de Matemática na Universidade de Cambridge (Reino Unido) e já escreveu ao longo de sua vida numerosos livros de divulgação, além de importantes trabalhos científicos.
Com 21 anos, Hawking foi diagnosticado com uma grave doença degenerativa, a esclerose lateral amiotrófica, que lhe provocou uma paralisia muscular progressiva. Apesar de a expectativa de vida de quem tem essa enfermidade ser geralmente de poucos anos, o cientista britânico sobreviveu, mesmo sofrendo problemas de saúde devastadores, como a traqueotomia que salvou sua vida em 1985, mas o deixou sem fala. A perspectiva de morrer cedo, recorda Hawking agora em seu livro, o impulsionou para o desafio intelectual.
“Hawking escreve de uma maneira comovedora”, escreveu o Financial Times sobre a autobiografia, salpicada de curiosidades de sua vida. “Nessa obra podemos escutar como sua voz é irradiada diretamente do buraco negro de sua doença, sem a amplificação e o detalhamento que acrescentavam os coautores com os quais escreveu seus últimos livros.”





sábado, 3 de outubro de 2015

Stephen Hawking /“Raça humana terá que sair da Terra se quiser sobreviver”

Stephen Hawking

STEPHEN HAWKING | ASTROFÍSICO 

Stephen Hawking: “Raça humana terá que sair da Terra se quiser sobreviver”

Físico britânico reflete sobre a origem do universo em entrevista exclusiva ao EL PAÍS

Merry Christmas”. A emblemática voz metálica do cientista mais famoso do planeta soa em meio à orla marítima da praia de Camisón, em Tenerife, na Espanha, provocando as gargalhadas dos turistas que se aglomeram ao seu redor, sussurrando entre si: “É Stephen Hawking”, a medida que passa por eles. “É uma brincadeira que costuma fazer para que as pessoas riam”, explica uma das responsáveis da equipe que o segue por todas as partes. Hawking (Oxford, 1942) se encontra na ilha espanhola para apresentar a terceira edição do festival científico Starmus, realizado a cada dois anos e que em sua edição de 2016 reunirá uma dúzia de prêmios Nobel, entre outras figuras reconhecidas da ciência, da divulgação e exploração especial.

As leis da ciência bastam para explicar a origem do Universo. Não é preciso invocar Deus
O físico, recentemente retratado no filme sobre sua vida A Teoria de Tudo, que deu o Oscar de melhor ator a Eddie Redmayne, escreve graças a um sensor na bochecha, onde está um dos poucos músculos que ainda consegue mover por conta da doença neurodegenerativa que sofre. Apesar de contar com vários programas tecnológicos que o ajudam a agilizar o processo de escrita, algumas vezes, dizem seus acompanhantes, pode levar duas horas para responder a uma simples pergunta. Mas ele tem um botão especial para fazer gracinhas com um só clique.

MAIS INFORMAÇÕES

Na rua, uma mulher de maiô grita “obrigado por seu senso de humor, Stephen!”, prova do carisma do cientista, que penetrou fundo no imaginário coletivo global muito além dos fãs de ciência. Sete pessoas acompanham o físico nessa viagem, entre assistentes, médicos e gente de sua confiança, sempre atentos a sua frágil saúde de ferro, que o manteve vivo até os 73 anos “contra todos os prognósticos”. É como explica nessa entrevista exclusiva ao EL PAÍS, que teve a ocasião de passar um dia com ele e o organizador do Starmus, o físico Garik Israelian. Hawking fala sobre a necessidade de conquistar o espaço para sobreviver como espécie, do perigo do desenvolvimento da inteligência artificial e sobre o que os jovens cientistas no mundo todo devem esperar do futuro.
Pergunta. O senhor tem uma agenda vertiginosa de viagens, conferências, entrevistas, festivais... quase como uma estrela do rock. Por que vive dessa forma?
Resposta. Sinto que tenho o dever de informar as pessoas sobre a ciência.
P. Gostaria de fazer alguma coisa na vida que ainda não o fez?
R. Viajar ao espaço com a Virgin Galactic.

Se os extraterrestres nos visitarem, o resultado será muito parecido com o que aconteceu quando Colombo desembarcou na América: não foi uma coisa boa para os nativos americanos
P. Um de seus últimos livros fala sobre a teoria de tudo, que uniria a relatividade e a física quântica. Sobre o que será o próximo?
R. Pode ser que meu novo livro seja sobre minha sobrevivência, contra todos os prognósticos.
P. Em muitos países, como na Espanha, o orçamento para a ciência é limitado, e muitos cientistas jovens precisaram emigrar para encontrar trabalho. O que o senhor diria a um jovem de países como o nosso e que pretende ser cientista?
R. Que vá para os Estados Unidos. Lá valorizam a ciência porque ela produz tecnologia.
P. Recentemente o senhor criou uma iniciativa muito ambiciosa para buscar vida inteligente em nossa galáxia. Há alguns anos, entretanto, disse que seria melhor não estabelecer contato com civilizações extraterrestres, porque poderiam nos exterminar. Mudou de opinião?
R. Se os extraterrestres nos visitarem, o resultado será muito parecido com o que aconteceu quando Colombo desembarcou na América: não foi uma coisa boa para os nativos americanos. Esses extraterrestres avançados poderiam virar nômades, e tentar conquistar e colonizar todos os planetas aos quais conseguissem chegar. Para meu cérebro matemático, de números puros, pensar em vida extraterrestre é algo muito racional. O verdadeiro desafio é descobrir como esses extraterrestres podem ser.

De fato, de certo modo minha incapacidade foi uma ajuda. Não preciso dar aulas e participar de comitês chatos
P. Pouco tempo atrás o senhor disse que a informação pode sobreviver a um buraco negro. O que isso significa para uma pessoa comum?
R. Cair em um buraco negro é como se lançar das cataratas do Niágara em uma canoa: se você remar suficientemente rápido, pode escapar. Os buracos negros são a máquina de reciclagem definitiva: o que sai é a mesma coisa que entra, mas processada.
P. No ano de 2015 a teoria da relatividade geral completa cem anos. O que o senhor diria a Albert Einstein se pudesse falar com ele, e o que espera da ciência nos próximos cem anos?
R. Einstein escreveu um artigo em 1939 no qual afirmava que a matéria não poderia comprimir-se além de um certo ponto, descartando a possibilidade da existência de buracos negros.
P. Por que acredita que devemos temer a inteligência artificial? É inevitável que os humanos criem robôs capazes de matar?
R. Os computadores superarão os humanos graças à inteligência artificial em algum momento nos próximos cem anos. Quando isso acontecer, precisaremos nos certificar de que os objetivos dos computadores sejam os mesmos que os nossos.

Acho que todo mundo pode, e deve, ter uma ideia geral de como funciona o universo e de nosso lugar nele
P. Qual acredita que será nosso destino como espécie?
R. Creio que a sobrevivência da raça humana dependerá de sua capacidade para encontrar novos lares em outros lugares do universo, pois o risco de que um desastre destrua a Terra é cada vez maior. Desta forma, gostaria de despertar o interesse do público pelos voos espaciais. Aprendi a não olhar muito à frente, a me concentrar no presente. Ainda quero fazer muitas outras coisas.
P. O Governo espanhol aprovou grandes cortes na ciência nos últimos anos. O que o senhor diria ao Governo?
R. Os espanhóis têm muito interesse na ciência e na cosmologia. Foram grandes leitores do meu livro Uma Breve História do Tempo. É importante que todos tenham bons conhecimentos de ciência e tecnologia. A ciência e a tecnologia estão mudando drasticamente nosso mundo, e é fundamental assegurar que essas mudanças ocorram na direção correta. Em uma sociedade democrática, isso significa que todos precisamos ter conhecimentos elementares sobre ciência, de modo que possamos tomar nossas próprias decisões com conhecimento de causa e não as deixar nas mãos de especialistas. É preciso simplificar, com certeza. A maioria das pessoas não tem tempo para dominar os detalhes puramente matemáticos da física teórica. Mas acredito que todo mundo pode, e deve, ter uma ideia geral de como funciona o universo e de nosso lugar nele. É isso que tento transmitir em meus livros e minhas conferências.

Os computadores superarão os humanos graças à inteligência artificial em algum momento nos próximos cem anos
P. Acredita que é possível ser um bom cientista e acreditar em Deus?
R. Utilizo a palavra “Deus” em um sentido impessoal, da mesma forma que Einstein, para me referir às leis da natureza.
P. O senhor disse que não precisamos de Deus para explicar o Universo tal como ele é. Pensa que algum dia os seres humanos abandonarão a religião e Deus?
R. As leis da ciência bastam para explicar a origem do Universo. Não é preciso invocar Deus.
P. Muitas pessoas precisam de cadeiras de rodas por conta de doenças como a esclerose lateral amiotrófica e muitas outras. Frequentemente enfrentam numerosas dificuldades para levar uma vida normal. Por exemplo, não podem viajar de avião em suas próprias cadeiras [Hawking costuma viajar de barco]. Uma vez que o senhor mesmo experimentou essas dificuldades, tem alguma mensagem para elas sobre a vida e como vivê-la?
R. Apesar de ter a desgraça de sofrer uma doença neuronal motora, tive muita sorte em praticamente todo o resto. Tive a sorte de trabalhar em física teórica, um dos poucos campos nos quais minha incapacidade não era um obstáculo sério, e de ser premiado com a popularidade de meus livros. Meu conselho para outras pessoas com incapacidades seria que se concentrassem em coisas que sua deficiência não as impeçam de fazê-las bem feitas, e que não se lamentem por aquelas nas quais o problema interfere.
Tudo está na mente. Preciso admitir que, quando não sigo o assunto de uma conversa, costumo divagar em reflexões sobre física e buracos negros. De fato, de certo modo minha incapacidade foi uma ajuda. Não preciso dar aulas e participar de comitês chatos, e me deu mais tempo para pensar e pesquisar.

Aprendi a não olhar muito à frente, a me concentrar no presente
P. Muitos cientistas de renome mundial, entre eles 12 prêmios Nobel, participarão do Starmus 3 para reverenciá-lo. Será um acontecimento histórico. Existe algo especial que o senhor queira ver no Starmus 3?
R. O Starmus 3 não se trata somente de buracos negros, campo no qual realizei um trabalho importante, mas abarca também a música e a arte. O Starmus 3 é o lugar onde a ciência séria se encontra com um público mais amplo; onde o pensamento intelectual, as nuances e a complexidade são reverenciados; onde se explora a maneira como trabalham os cientistas e onde são forjadas novas ideias.