segunda-feira, 24 de julho de 2017

Eberth Vêncio / Eu quero ser o próximo Papa

Francis Bacon

Eu quero ser o próximo Papa

Por Eberth Vêncio
22/02/2013

O Papa é pop, e o pop não poupa ninguém
Engenheiros do Hawaii

Pasárgada, 22 de fevereiro de 2013.
Carta dirigida aos cardeais da junta médica.
Rogo as Vossas Eminências que coloquem especial tenência nesta mensagem em que manifesto o meu real e inarredável desejo de pleitear o trono de maior mandatário da igreja, a ser desocupado nos próximos dias conforme amplamente noticiado aos quatro cantos do mundo.
Não me cabe julgar, analisar, lucubrar, intuir, criticar, zombetear, comemorar ou desconfiar dos reais motivos que fizeram com que o Papa-Almas Joseph Blater Mengele jogasse a batina e renunciasse ao cargo — um dos mais cobiçados que se tem notícia desde o Reinado de Elvis “The Pelvis” — embora todo cardeal negue, peremptoriamente, que o deseje ocupar.
Eu não. Abdicações franciscanas não me atingem. Eu não posso negar. Não sei mentir sem levar alguma vantagem. De tal forma que, sem falsa modéstia, eu digo e repito que estou no páreo desta sacrossanta peleja para o que der e vier; e é dando que se recebe (parodiando os políticos e as prostitutas desta pátria). E quando a fumacinha da cuia de santo-daime vazar pela chaminé doidona dos subterrâneos do Pelicano, é o meu nome que espero ouvir alardeado pelas trombetas de mil decibéis.
Tomei o cuidado de enviar as Vossas Eminências o mesmo perfil que utilizo no facebook sagrado (quero crer que cardeais também se amarrem em redes sociais), a fim de analisarem com a máxima misericórdia, durante o vosso conclave-de-sol, os requisitos que fazem de mim um dos candidatos mais atrevidos e tarimbados para assumir um cargo tão relevante a este mundo cão no qual latimos.

Sou latino, 47 anos de idade, portanto tenho muito incenso pra queimar em prol do crescimento e domínio da igreja, após a minha eleição. Sexo: masculino (obviamente). Espero que o fato de eu não ser um afro-descendente facilite a vossa escolha. Essa estória de “europeização do Poder” já está me dando nos nervos.
Nasci ao vigésimo dia do mês de setembro, portanto, signo de virgem. Uma vez virgem, é natural que eu também condene o uso da camisinha de força Made in China, o DIU, o coito em pé atrás da capelinha, as pílulas de ontem e as do dia seguinte também, o sexo anual, o orgasmo feminino enquanto instrumento de transformação social, as poluções noturnas nos lençóis de cambraia do internato, a poluição industrial em São Paulo e o Aborto Elétrico, antiga banda do Renato Russo (que Deus o tenha). É claro que eu também abomino o aborto, principalmente dos outros.
Nunca fui santo. Nunca fui padre. Mas decorei a bíblia de cabo a rabo (perdoem-me pelo palavreado vulgar) e as paredes da cela com miçangas de Aparecida do Norte e pôsteres do Padre Marcelo, do Padre Fábio e do Padre Huguinho-Zezinho-e-Luizinho. Enfim, a patota inteira estava lá.
Sexo antes do casamento: sou contra. Sexo depois do casamento: sou a favor, desde que 100% tolerado até que a morte os separe. Sexo depois das refeições: o perigo é a congestão. Portanto, se comerdes muitas hóstias, não dirijais vós imediatamente aos aposentos. Aguardai a santa sesta.
Eu também sou contrário aos questionamentos basais acerca dos bastidores das igrejas, da origem da vida e das reais intenções divinas no tocante à Humanidade; ao avanço da ciência; às pesquisas com utilização das células-tronco; às cédulas de 100 patacas sem a inscrição “O jardineiro é fiel”; e a denominar o próprio pênis como “tronco” (é muita grosseria e mau gosto!). Enfim, se precisarem de mim para queimar um astronauta ou um ateu na fogueira, contem comigo. Fé e gasolina não me faltam.
Tenho uma quedinha por carne de porco durante a quaresma, além praticar a auto-imolação ao menos uma vez por semana: costumo esbofetear a parte interna das coxas com um livro de capa dura do bruxo Paul Rabbit. Mas são defeitos que ainda posso corrigir. Juro remeter os colegas pedófilos mais problemáticos para tratamento com matemáticos da Esbórnia. Aos nove anos sentaram-me no colo de um sacristão novato e eu sei o quanto esses operários da evangelização-a-qualquer-custo sofrem daquele misto de tesão e culpa na Hora do Ângelus.
Considerando que Deus seja mesmo brasileiro, o fato de eu ter nascido em Safira do Norte faz de mim, além de um pobre miserável, mais um conterrâneo do Pai. Nunca antes na história clínica dos surtos psicóticos, um cardeal brasileiro foi eleito o Papa-Almas de Pasárgada. Portanto, penso que a hora seja agora, nem que, para tal intento, sejam recolhidos e trancafiados todos os utensílios banhados em ouro, os castiçais de marfim e a prataria chique do Pelicano. Se eu fui capaz de domar a natureza dos meus testículos até aqui, poderei controlar também a velha cleptomania. Quanto ao Banco do Pelicano, prefiro não ficar com as chaves para não cair em tentação. Certa feita, perdi as chaves do portão do manicômio e fui castigado com eletrochoques e a audição diuturna da Ave Maria na voz da Fafá de Belém. Amém.


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